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Victor Aguiar
Victor Aguiar
Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero e com MBA em Informações Econômico-Financeiras e Mercado de Capitais pelo Instituto Educacional BM&FBovespa. Trabalhou nas principais redações de economia do país, como Bloomberg, Agência Estado/Broadcast e Valor Econômico. Em 2020, foi eleito pela Jornalistas & Cia como um dos 10 profissionais de imprensa mais admirados no segmento de economia, negócios e finanças.
Ibovespa caiu mais de 2% na semana

Dois gigantes estão medindo forças — e trazendo caos à cidade dos mercados

China e Estados Unidos voltaram a colidir na guerra comercial. Mas a batalha entre os titãs deixou um rastro de destruição nos mercados globais: o Ibovespa desabou aos 97 mil pontos, as bolsas americanas recuaram forte e o dólar à vista subiu ao nível de R$ 4,12

Victor Aguiar
Victor Aguiar
23 de agosto de 2019
10:32 - atualizado às 18:20
Monstro versus robô
Duelo de gigantes: China e EUA entraram em colisão e geraram um rastro de destruição aos mercados - Imagem: Shutterstock

A mercadolândia, cidade que abriga os agentes financeiros e serve como sede para o Ibovespa e as diversas bolsas globais, vive momentos de tensão. Já há algum tempo, os moradores vinham sentindo a terra tremer sob seus pés: prédios estalavam, paredes trincavam e pontes chacoalhavam.

O que causava esses tremores, no entanto, não era uma falha tectônica ou um fenômeno geológico. As vibrações, cada vez mais intensas, eram geradas pela aproximação de duas figuras titânicas — e esses gigantes estavam em rota de colisão.

No centro da cidade, muitos tinham a esperança de que os colossos poderiam desviar suas trajetórias e não colidir de frente — ou até mesmo não se encontrarem. Mas essa torcida mostrou-se em vão: nesta sexta-feira (23), Estados Unidos e China voltaram a se chocar no front da guerra comercial. E a troca de pancadas foi feia.

Enquanto desferiam golpes e tentavam nocautear um ao outro, esses dois gigantes acabaram trazendo caos à mercadolândia: construções acabaram em ruínas, carros terminaram esmagados e postes foram arrancados. Entre bolas de fogo e um raios laser, quem sofreu foi a cidade.

A torre do Ibovespa, por exemplo, teve perdas de 2,34% nesta sexta-feira, aos 97.667,49 pontos, acumulando queda de 2,14% desde segunda-feira — vale lembrar que, na semana passada, o principal índice da bolsa brasileira já havia recuado 4%.

No conjunto dos mercados americanos, o estrago também foi sentido: no acumulado da semana, o Dow Jones recuou 1%, o S&P 500 teve baixa de 1,44% e o Nasdaq caiu 3,1% — os três índices registraram baixas de mais de 2% nesta sexta-feira.

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Em linhas gerais, os mercados globais já assumiram uma postura cautelosa ao longo da semana: sem maiores evoluções nas relações entre EUA e China, os agentes financeiros optaram por ficar na defensiva. Afinal, há o temor de que a disputa entre americanos e chineses poderá gerar uma desaceleração intensa da economia global.

Mas, se é verdade que esse cenário não era animador, também é verdade que os mercados se agarravam a uma tábua de salvação: os cortes de juros nas principais economias do mundo. Dadas as incertezas político-econômicas, os agentes financeiros apostavam no afrouxamento monetário como ferramenta para estimular a atividade global.

Só que, ao longo da semana, os tão aguardados sinais de disposição por parte do Federal Reserve (Fed) e do Banco Central Europeu (BCE) não vieram com a intensidade desejada pelos mercados — ambas as instituições fizeram apenas indicações tímidas em direção ao corte de juros.

E, nesta sexta-feira, os gigantes da guerra comercial entraram em embate direto, provocando um rastro de destruição nos mercados. Mas a história do pregão desta sexta-feira pode ser divida em três atos.

Primeiro ato: preocupação

No início do dia, os mercados encontravam-se tensos com um novo desdobramento das tensões no front comercial: a China, afinal, anunciou hoje cedo a imposição de tarifas de 5% a 10% a serem aplicadas sobre US$ 75 bilhões em importações americanas — a medida começará a valer a partir de 1º de setembro.

A medida é uma espécie de revide a uma iniciativa semelhante adotada pelo governo dos EUA: no início desse mês, Washington anunciou a adoção de sobretaxas de 10% sobre US$ 300 bilhões em produtos importados da China.

Esse novo episódio trouxe uma primeira onda de destruição à cidade dos mercados, uma vez que as tensões entre americanos e chineses pareciam estar estabilizadas — ou, ao menos, não mostravam novos sinais de deterioração. E, com a escalada da guerra comercial, cresceram os temores de que a economia global poderá sofrer impactos negativos.

Nesse contexto, o Ibovespa abriu o pregão de hoje em baixa de mais de 1% — as bolsas americanas também iniciaram a sessão no campo negativo. Mas, às 11h, o presidente do Fed, Jerome Powell, fez seu aguardado discurso no simpósio de Jackson Hole — e esse quadro de apreensão foi temporariamente revertido.

Segundo ato: alívio

O segundo ato foi de alívio generalizado: Powell assumiu um tom mais moderado em seu discurso, dizendo que o Fed irá "agir de forma apropriada" para sustentar a expansão da economia do país.

Essa sinalização foi entendida como um indício de que, apesar de os dados econômicos ainda não indicarem o enfraquecimento nos EUA, o banco central do país está aberto a continuar cortando os juros caso os riscos no horizonte comecem a ameaçar a atividade doméstica — em julho, o Fed já reduziu as taxas em 0,25 ponto.

Com isso — e tendo a nova cartada da China em mente — os mercados recuperaram a confiança, certos de que o banco central americano continuará cortando os juros. Como resultado, o Ibovespa reduziu as perdas e se aproximou do zero a zero, enquanto as bolsas americanas conseguiram virar para alta.

Parecia que a indicação do Fed seria suficiente para conter os ânimos dos titãs e neutralizar os danos feitos até então aos mercados. Só que esse alívio teve vida curta: pouco tempo depois do discurso, o presidente dos EUA, Donald Trump, foi ao Twitter — e não poupou palavras para falar sobre Powell e a China.

Terceiro ato: pessimismo

No terceiro ato, o pessimismo voltou a ser o sentimento predominante dos mercados, e muito por causa do tom bastante agressivo usado por Trump. Entre outros pontos, o republicano disse que o Fed, novamente, "não fez nada", e questionou, de modo irônico, qual seria o maior inimigo dos EUA: Powell ou Xi Jinping.

Mas não foi apenas isso: Trump ainda disse que irá anunciar em breve as medidas a serem tomadas pelo governo americano em resposta à elevação das tarifas por parte de Pequim. "Nós não precisamos da China e, francamente, estaríamos bem melhor sem eles", escreveu o presidente americano.

Trump ainda disse que as companhias americanas estão "obrigadas" a começarem a procurar uma alternativa à China. "Eu vou anunciar uma resposta às tarifas nesta tarde", escreveu — até o fechamento do pregão, contudo, o presidente americano ainda não havia feito nenhum pronunciamento oficial sobre o tema.

Assim, uma nova onda de choque gerou danos intensos às edificações da mercadolândia: o Ibovespa voltou ao patamar dos 97 mil pontos e as bolsas americanas mergulharam ao campo negativo, em meio à tensão antes do anúncio das contra-medidas a serem anunciadas pelo governo americano.

E o dólar e os juros?

Esse clima de cautela generalizada também mexeu com o mercado de câmbio: o dólar à vista subiu 1,14%, a R$ 4,1246 — é a maior cotação de encerramento para a moeda americana desde 19 de setembro do ano passado, quando fechou a R$ 4,1308.

Nem mesmo a continuidade das vendas de dólares no mercado à vista por parte do Banco Central serviu para conter o novo avanço da moeda americana nesta sexta-feira. O BC vendeu mais US$ 550 milhões hoje, mesma quantia negociada na quinta-feira — na quarta, a venda foi de US$ 200 milhões. As operações vão até o dia 29.

A curva de juros também foi pressionada, acompanhando a alta do dólar. Na ponta curta, os DIs para janeiro de 2021 subiram de 5,37% para 5,44%; na longa, os com vencimento em janeiro de 2023 avançaram de 6,37% para 6,44%, e os para janeiro de 2025 foram de 6,88% para 6,94%.

Quase 100% vermelho

Em meio à cautela global, quase todas as ações que compõem o Ibovespa fecharam em queda nesta sexta-feira —apenas Smiles ON (SMLS3) conseguiu se sustentar no campo positivo, com ganhos de 2,83%.

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