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Eduardo Campos
Eduardo Campos
Jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo e Master In Business Economics (Ceabe) pela FGV. Cobre mercado financeiro desde 2003, com passagens pelo InvestNews/Gazeta Mercantil e Valor Econômico cobrindo mercados de juros, câmbio e bolsa de valores. Há 6 anos em Brasília, cobre Banco Central e Ministério da Fazenda.
Análise

Copom acena um ajuste na Selic, não um prolongado ciclo de cortes

Banco Central faz uma longa discussão sobre juro estrutural, indica que há espaço para novos cortes, mas ele seria menor do que o mercado estima

Eduardo Campos
Eduardo Campos
6 de agosto de 2019
9:06 - atualizado às 9:56
Copom
Reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central, responsável por definir a Selic - Imagem: Raphael Ribeiro/BCB

A ata do Comitê de Política Monetária (Copom) indica que haveria espaço para corte adicionais da Selic, que foi reduzida de 6,5% para 6% ao ano na semana passada. Mas reforça que essa avaliação “não restringe sua próxima decisão”.

Apesar desse espaço para juro menos, uma primeira leitura do documento sugere que ele não seria tão grande quanto o mercado espera, onde as projeções estão entre 5,25%, na mediana do Focus, ou até abaixo disso, como o 4,75% do Bank of America Merrill Lynch.

Antes de seguir adiante nessa complexa discussão, se o BC cortar até 5,5% ou 5%, pouco muda o cenário de investimentos. Como já escrevemos, acabou a mamata do juro, o tal 1% ao mês vai exigir tomada de risco e sofisticação dos investimentos. Fica a aqui a dica de leitura da matéria da Julia Wiltgen sobre o que fazer com a Selic voltando a cair. Também deixo como sugestão o nosso e-book gratuito sobre perspectivas de investimento no segundo semestre.

Resumindo em poucas palavras, o BC acena um ajuste na Selic e não um ciclo prolongado de cortes. Essa impressão surge quanto consideramos a discussão feita sobre a relação da reforma da Previdência com a taxa neutra de juros (aquela que promove o máximo crescimento com inflação nas metas).

Basicamente, o Copom diz que está lidando com um problema de timing. Em um primeiro momento, a reforma tenderia a elevar a taxa neutra, pois promove um aumento da demanda agregada via investimentos. No entanto, em um segundo momento, esse aumento nos investimentos tenderia a elevar a capacidade de crescimento. No fim, “o Copom entende que a reforma contribui para redução gradual da taxa de juros estrutural da economia”.

Além dessa complexa discussão, o documento divulgado nesta manhã está “vencido” em termos de sinalizações sobre o cenário externo, tendo em vista a acentuada piora que tivemos desde o fim da semana passada, com Estados Unidos e China embarcando em uma guerra cambial.

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Na ata, o BC fala que o “cenário evoluiu de maneira benigna”, considerando os afrouxamentos monetários feitos por outros BCs de economias desenvolvidas. A única ressalva é que: “não obstante essa melhora, os membros do Copom avaliam que os riscos associados a uma desaceleração da economia global permanecem e que incertezas sobre políticas econômicas e de natureza geopolítica – notadamente as disputas comerciais e tensões geopolíticas – podem contribuir para um crescimento global ainda menor”.

Fica a expectativa, agora, com uma atualização dessa percepção do Copom sobre o quadro externo e como isso pode vir a afetar o balanço de riscos e as projeções e expectativas de inflação. Lembrando que o dólar está flertando com os R$ 4 contra os R$ 3,75 utilizados para fazer as projeções de inflação.

Reformas x juro neutro

O Copom volta a afirmar que a conjuntura prescreve política monetária estimulativa, ou seja, com taxas de juros abaixo da taxa estrutural. Para o BC, as atuais taxas de juros reais ex-ante, que oscilam entre 1,6% a 1,7% ao ano, têm efeito estimulativo sobre a economia. Esse juro real é calculado levando em conta o swap de juro de 360 dias descontado da inflação projetada para 12 meses.

O BC explica que a taxa de juros estrutural é um ponto de referência para a condução da política monetária. Quando essa política produz uma taxa de juros real abaixo da taxa estrutural, ela provê estímulos para a atividade econômica e contribui para um aumento da inflação. (Estamos em algum ponto desse quadro).

A taxa estrutural é uma variável não observável e a atividade econômica e a inflação dependem de diversos outros fatores. Assim, diz o BC, estimativas dessa taxa envolvem elevado grau de incerteza e são continuamente reavaliadas. Há uma intensa discussão no mercado e na academia desde meados do ano passado sobre qual seria essa taxa, algo próximo a 4% ou mais para 2,5% ou 2%? Quanto menor o juro real em comparação com essa taxa, mais estimulativa está a política monetária.

A cada reunião, o Copom avalia se a taxa Selic está em nível adequado, tendo em vista todos os fatores que influenciam a evolução das projeções e expectativas de inflação, do balanço de riscos e da atividade econômica. Isso envolve avaliar se o grau de estímulo monetário está adequado.

Feita essa introdução (sim, o tema é complexo), o BC abre um pouco a discussão sobre a taxa neutra ou estrutural que acontece dentro do colegiado. Algo que não tinha sido feito até então.

Na visão do Copom, a taxa de juros estrutural embute dois componentes: taxa estrutural livre de risco e prêmio de risco.

Reformas e outras mudanças no ambiente econômico podem afetar a taxa estrutural de maneiras distintas, dependendo de seus efeitos sobre esses dois componentes.

O componente livre de risco depende dos determinantes estruturais do consumo e poupança, de um lado, e do investimento, de outro. Por meio desse componente, fatores que aumentam de maneira persistente a disposição de investir pressionam a taxa de juros estrutural da economia para cima.

Entretanto, esses mesmos fatores podem contribuir para redução da taxa estrutural por meio da queda do prêmio de risco se implicarem aumento do potencial de crescimento da economia e, portanto, maior sustentabilidade da política fiscal. (Aqui está formalizado o problema de timing que falamos acima).

Para o BC, a reforma da Previdência reduz o ritmo de crescimento dos gastos do governo, aumentando a poupança pública ao adequar as regras para aposentadoria à estrutura e dinâmica demográficas do país.

Além disso, a reforma também gera incentivos para um aumento da taxa de poupança por parte da população, visando sustentar um certo padrão de consumo após a aposentadoria.

“Por esses canais, a reforma contribui para redução do componente livre de risco da taxa de juros estrutural da economia brasileira”, diz o Copom.

A reforma da Previdência também reduz o componente de prêmio de risco da taxa de juros estrutural, pois melhoram as perspectivas de sustentabilidade fiscal.

Por outro lado, a reforma induz aumento da oferta de trabalho e tende a estimular investimentos privados ao reduzir incertezas sobre aspectos fundamentais da economia brasileira.

Depois dessa longa explicação, o Copom apresenta sua conclusão: “Considerando apenas esses dois últimos canais, a reforma tenderia a elevar a taxa de juros estrutural. Não obstante a complexidade dos canais pelos quais a reforma da Previdência pode influenciar a taxa de juros estrutural da economia brasileira, quando se considera o seu efeito líquido, o Copom entende que a reforma contribui para redução gradual da taxa de juros estrutural da economia.”

Mais reformas

Na ata o BC reconhece o avanço concreto da reforma da Previdência, que foi aprovada em primeiro turno na Câmara dos Deputados. Mas volta a enfatizar que eventual frustração com a agenda de reformas é um risco preponderando no seu balanço.

Também há renovado destaque à importância de outras reformas, além da Previdência, e ajustes na economia para a consolidação de um cenário benigno para a inflação prospectiva.

Atividade e FGTS

Para o BC, os dados recentes de atividade econômica sugerem possibilidade de retomada do processo de recuperação, que tinha sido interrompido nos últimos trimestres.

Para o Copom, o Produto Interno Bruto (PIB) deve ficar estável ou apresentar ligeiro crescimento no segundo trimestre, com alguma aceleração nos trimestres seguintes.

Aceleração que deve ser reforçada pelos estímulos decorrentes da liberação de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e PIS-Pasep.

Entre agosto e março de 2020, a liberação de recursos de contas ativas e inativas do FGTS e do PIS/Pasep deve jogar R$ 42 bilhões na economia, gerando um crescimento adicional de 0,35 ponto percentual do PIB em 12 meses (contas do governo).

Mesmo com essa ajuda do FGTS, o Copom pondera que seu cenário básico, excluindo estímulos temporários, supõe ritmo de crescimento gradual da economia.

Para o BC, a economia segue operando com alto nível de ociosidade dos fatores de produção, refletido nos baixos índices de utilização da capacidade da indústria e, principalmente, na taxa de desemprego.

Condições financeiras

O Copom também apresenta uma interessante discussão sobre as condições financeiras, que tiveram “distensão relevante” nos meses recentes. Essa distensão se verifica tanto no preços dos ativos quanto na dinâmica dos mercados de crédito e de capitais

“O Comitê atribui esse movimento basicamente às expectativas de ajuste no grau de estímulo da política monetária, à evolução benigna das condições financeiras nos mercados globais e às perspectivas de melhoria dos fundamentos da economia brasileira decorrentes do progresso na agenda de reformas e ajustes necessários na economia”

Em suma, o mercado se antecipou ao Copom e reduziu o custo do dinheiro ao longo do tempo.

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