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Micaela Santos
Micaela Santos
É repórter do Seu Dinheiro. Formada pela Universidade São Judas Tadeu (USJT), já passou pela Época Negócios e Canal Meio.
TELEFONIA

Reestruturação, fim de concessões e credores no comando após crise financeira: qual o futuro da Oi (OIBR3) no mercado de telecomunicações?

De promessa da telefonia fixa brasileira à endividada, a Oi agora busca um novo rumo em meio à segunda recuperação judicial e a transformação do setor no país

Micaela Santos
Micaela Santos
20 de dezembro de 2024
6:15 - atualizado às 12:13
Fachada de loja da Oi (OIBR3), com o logo da empresa em amarelo sobre uma marquise verde
Fachada de loja da Oi - Imagem: Divulgação

Os poucos orelhões espalhados pelas ruas do país lembram o que um dia foi o auge da telefonia nos anos 1990. Nossos olhos, hoje tão acostumados às telas dos celulares, há tempos já não prestam atenção neles que, mesmo cinquentões, seguem firmes – ainda que encontrar um em bom estado – ou alguém usando um – é cena de museu urbano

Antes populares, os orelhões também têm relação intrínseca com a operadora Oi (OIBR3), a antiga Telemar, cuja gestão da telefonia pública fixa em várias regiões do Brasil foi herdada após a privatização do setor de telecomunicações em 1998.

Assim como os orelhões, a história da Oi reflete as transformações de comportamento (e adaptação) de uma sociedade. A companhia tanto já foi a maior concessionária de telefonia móvel do país, quanto protagonizou um dos maiores casos de recuperação judicial da história do Brasil nos últimos anos. 

Embora as transformações no setor de telecomunicações e as mudanças nos hábitos do consumidor tenham afetado a companhia nas últimas décadas, os desafios da Oi vão muito além da mera evolução tecnológica e da obsolescência dos orelhões de rua Brasil afora.

Multas milionárias devido a falhas na prestação de serviços, obrigações regulatórias, sucessivas trocas de liderança e concorrência com empresas como Vivo (VIVT3), Claro e TIM (TIMS3) somaram-se à estratégia de apostar na telefonia fixa que, embora tenha sido uma base significativa para a Oi, viu seu declínio com a popularização dos celulares e da internet.

Como resultado, após quase oito anos do primeiro pedido de recuperação judicial para reestruturar dívidas de R$ 65 bilhões, a Oi enfrenta sua segunda recuperação, agora com mais de R$ 45 bilhões em dívidas e o desafio de se manter de pé, mais do que relevante no mercado.

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Após vender sua carteira de clientes de internet via fibra óptica e se desfazer dos ativos de telefonia móvel, a Oi tem lutado para reduzir sua dívida e apostado em outros negócios como a Oi Soluções, voltada para serviços corporativos de TI e conectividade. Mas será que ela conseguirá reconquistar a confiança dos investidores e se reinventar no mercado?

O Seu Dinheiro conversou com José Felipe Ruppenthal, conselheiro do Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel) e da Telco Advisors, e Eduardo Tude, presidente da Teleco, consultoria especializada em telecomunicações, que deram algumas pistas sobre o futuro da empresa e os rumos que ela pretende seguir daqui para frente. 

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Os fatores que levaram à crise da Oi (OIBR3)

Antes de falar sobre o futuro da Oi, é importante falar sobre o passado e o presente da companhia. A primeira recuperação judicial dela, iniciada em 2016, foi a maior da América Latina. À época, o grupo acumulava uma dívida de aproximadamente R$ 65 bilhões.

Nos anos anteriores, a Oi vinha acumulando dívidas bilionárias após investimentos agressivos em expansão e modernização da infraestrutura. No entanto, a situação piorou ainda mais após a fusão com a Portugal Telecom (PT), em 2014, que já enfrentava problemas financeiros causados por investimentos mal sucedidos. 

Além da política de expansão com a aquisição de outras empresas e assumindo suas dívidas, a empresa enfrentou uma queda da receita na telefonia fixa e acumulou multas significativas impostas pela Anatel que agravaram ainda mais sua crise financeira.

Também vale lembrar que a Oi enfrentou sucessivas trocas de liderança, o que resultou em falta de continuidade em estratégias. Muitos gestores foram criticados por decisões equivocadas e pela incapacidade de priorizar a sustentabilidade financeira da empresa. 

A recuperação judicial da Oi enfrentou grandes desafios ao tentar alinhar os interesses e as visões de diferentes grupos de credores sobre como reestruturar a empresa. O processo envolveu desde bancos nacionais, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), investidores de bonds, fornecedores, o Conselho de Administração, os acionistas controladores, órgãos reguladores, além de investidores estratégicos e financeiros.

Houve ainda a venda de diversos ativos, entre eles os seis mil quilômetros de fibra óptica da companhia em São Paulo, cinco data centers pelo Brasil e um conjunto de 400 torres espalhadas pelo país.

Mas, apesar das tentativas de reestruturação, a tele seguiu com dívida de R$ 44,3 bilhões, o que a levou a pedir proteção judicial novamente, no início de 2023.

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A segunda recuperação judicial e venda de ativos

Em maio deste ano, a justiça do Rio de Janeiro validou a segunda RJ da Oi, que foi aprovada a duras penas pelos credores um mês antes. O plano abrange as subsidiárias Portugal Telecom International Finance BV e também a Oi Brasil Holdings Coöperatief U.A. 

Além da alteração de prazos e formas de pagamento de credores e a captação de até US$ 650 milhões por meio de um empréstimo, a operadora também recebeu o sinal verde do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) para a venda da ClientCo para a companhia de internet V.tal, controlada pelo BTG Pactual, por R$ 5,683 bilhões.

A venda foi aprovada pelos credores da Oi em outubro, após um processo competitivo de leilão realizado pela companhia. Embora a V.tal tenha sido a única empresa a apresentar uma proposta, a Ligga Telecom também estava no páreo na disputa pela unidade de banda larga da Oi, mesmo após ter sua proposta rejeitada na primeira rodada do leilão. No entanto, a V.tal levou a melhor, uma vez que a operação precisaria utilizar sua rede.

Por sua parte, a V.tal planeja transferir a unidade de clientes para uma empresa distinta, mas ainda aguarda a aprovação da Anatel para concretizar a transação.

Mudanças no regime de telefonia

Outra estratégia da Oi rumo à reestruturação é o encerramento do contrato de concessão de serviços de telefonia fixa. Isso significa que a companhia deixará de prestar serviços de telecomunicações de caráter público para se tornar uma operadora de regime privado.

Após a aprovação pela Anatel, a Oi continuará oferecendo telefonia fixa até 2028 em áreas sem alternativa de comunicação. Como contrapartida, a empresa deverá fazer investimentos de R$ 5,8 bilhões, incluindo a instalação de rede Wi-Fi em 4 mil escolas.

Essa alteração permitirá à empresa economizar milhões de reais com a manutenção de uma rede que se tornou obsoleta. Além disso, a Oi poderá vender ativos conhecidos como bens reversíveis, como imóveis e redes de cobre. No total, a Oi possui mais de 7 mil imóveis à venda — prédios, terrenos, edificações — e, com isso, espera agilizar o processo de negociações.

Algumas dessas vendas já foram feitas. Entre elas, a alienação da unidade produtiva isolada (UPI) à credora SBA Torres Brasil por R$ 40 milhões e torres de telecomunicações e ativos imobiliários repassadas à American Tower Brazil por R$ 41 milhões. 

A Oi tem salvação?

Apesar dos problemas enfrentados nos últimos anos, a Oi ainda é uma empresa muito relevante no mercado brasileiro de telecomunicações, na visão dos analistas. 

Dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) divulgados em abril deste ano mostram que a companhia é a terceira maior operadora em números de acessos em Banda Larga Fixa no país, com 4.755.576 milhões de acessos e 9,75% de participação de mercado. 

Em setembro de 2024, a Oi tinha 5,8 milhões de linhas de telefonia fixa, sendo a terceira maior operadora do segmento e participação de mercado de 25,5%, atrás da Claro e Vivo.

Embora a Banda Larga Fixa no Brasil continue crescendo, a Oi, por outro lado, foi uma das empresas que mais sofreram redução de base em 2024, perdendo 35 mil assinantes. 

A empresa , no entanto, investiu fortemente em infraestrutura de fibra óptica, que passou a ser a principal fonte de faturamento, compensando a queda das receitas com telefonia fixa.

Entretanto, para os próximos passos, a Oi deve se concentrar em recuperar passivos, obter novas linhas de crédito, vender ativos para reduzir a dívida e ajustar suas obrigações regulatórias, segundo a CFO Cristiane Barretto, em artigo recente publicado na Exame. 

“Do ponto de vista da estrutura societária, implantamos uma agressiva simplificação, reduzindo, em três anos, em 54% o número de empresas, passando de 47, em 2021, para 22, em 2024. Uma redução que seria maior caso não incluísse empresas transitórias criadas para os processos de segregação previstos no plano”, afirmou a executiva. 

Em outubro, o conselho da companhia homologou o aumento de capital no montante total de R$ 1,389 bilhão, mediante a emissão de 264.091.364 novas ações ordinárias.

Com a conversão da dívida em participação acionária, a Oi foi diluída em aproximadamente 80% para os acionistas, que agora terão uma participação minoritária. Já os credores financeiros passarão a ter uma parte significativa da empresa.

No novo quadro acionário da operadora de telefonia, a gestora de recursos Pimco passará a deter 36,48% do capital. O SC Lowy terá 12,27% e a Ashmore ficará com 9,53%, conforme anteriormente divulgado pela Oi. Outros acionistas ficarão com 39,71%.

Uma vez entregues as ações aos novos sócios, abre-se a possibilidade para a venda das ações que a tele possui da V.tal, que pode render ao menos R$ 8 bilhões à operadora.  

As mudanças no comando da Oi

No início deste mês, o CEO da Oi, Mateus Bandeira, anunciou, em carta aos funcionários, que deixará o cargo. A notícia foi antecipada pela imprensa e depois confirmada pela empresa, após questionamentos da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). 

Bandeira, que assumiu o cargo em janeiro, sai para que os acionistas escolham o novo Conselho de Administração e uma nova diretoria estatutária, após diluição acionária. Foi ele quem esteve à frente da aprovação do segundo plano de recuperação da Oi e da aprovação da Anatel para mudar o regime de concessão para autorização na telefonia fixa.

“Sairei satisfeito e orgulhoso. Satisfeito com as etapas vencidas, com os compromissos resgatados e com as perspectivas realistas de uma Oi viável e sustentável; sairei orgulhoso das relações que fiz ou consolidei, do que aprendi e de tudo o que pude testemunhar”, diz.

Após a reestruturação que colocou credores como os principais acionistas da companhia, a Oi aprovou, em Assembleia Geral Extraordinária (AGE) na última quinta-feira (12/12), uma nova formação para o conselho de administração. A companhia também confirmou Marcelo José Milliet para o cargo de diretor-presidente (CEO) e de relações com investidores. 

Ele, que liderou recentemente um processo de recuperação da produtora de cobre brasileira Paranapanema (PMAM3), também é especialista em reestruturação empresarial.

O futuro da Oi no mercado de telecomunicações

A Oi, que chegou a faturar R$ 20 bilhões por ano, hoje tornou-se uma empresa enxuta, com projeção de faturamento de R$ 2 bilhões anuais, voltada para a prestação de serviços corporativos de TI. E isso, para José Felipe Ruppenthal, conselheiro do Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel), será o principal foco da empresa de tele no futuro.

Segundo ele, o destino da Oi está cada vez mais direcionado à transformação, assim como o mercado atual de telecomunicações, que está em declínio no modelo tradicional. 

“Os serviços oferecidos pelas operadoras, como a conectividade, tendem a se tornar commodities. No futuro, depender apenas da venda de conectividade será insuficiente para gerar receitas significativas. Por isso, as operadoras estão buscando novas fontes de receita, diversificando suas ofertas além da internet básica”, afirma Ruppenthal. 

Exemplo disso é a Vivo (VIVT3), que tem tentado ampliar suas receitas com a oferta de serviços financeiros, como empréstimos e seguros, direto no aplicativo da operadora.

No caso da Oi, o conselheiro acredita que a companhia vai priorizar o B2B (business-to-business) como uma empresa “TechCo” — ou seja, voltada para serviços digitais nos quais a conectividade é apenas um meio para entregar soluções avançadas. 

Essa estratégia inclui áreas como cibersegurança, Tecnologia da Informação e outros serviços de valor agregado para empresas. Um mercado que, na visão de José Felipe Ruppenthal tem uma demanda ainda reprimida e grande potencial para crescer no Brasil. 

Na Oi, essa missão ficaria a cargo da Oi Soluções, uma unidade focada em vender soluções de telecomunicações e tecnologia para outras empresas. A unidade oferece serviços de conectividade, comunicação integrada à infraestrutura de TI e cloud computing.

Embora tenha avançado no plano de recuperação judicial, a estratégia da Oi para os próximos anos ainda é incerta para boa parte do mercado, dado o potencial de reestruturação profunda que envolve a venda ou reconfiguração de áreas-chave. 

E, com a nova governança, a Oi terá carta branca para buscar mais  recursos por meio da venda de ativos que, até então, não poderiam ser negociados, incluindo a Oi Soluções. 

“Só poderemos ter uma foto de como será a nova Oi daqui, no mínimo, um semestre”, avalia Ruppenthal. “A empresa já é bem reconhecida no mercado B2B, mas os resultados financeiros da unidade de negócios ainda “não são tão bons”, afirma o analista. 

No terceiro trimestre de 2024, a receita líquida da Oi Soluções totalizou R$ 421 milhões,

uma redução de 26,6% em relação ao mesmo período do ano passado. Já a Oi Fibra faturou R$ 1,1 bilhão, ficando praticamente estável em relação ao ano anterior. 

De acordo com o último relatório, as receitas da Oi Fibra e da Oi Soluções encerraram o 3T24 representando mais de 75% do total da receita da chamada “nova Oi”. No último trimestre, a receita total da companhia foi de R$ 2,1 bilhões, uma queda anual de 14,4%.

Ainda sob a gestão do então CEO Rodrigo Abreu, a tele se posicionou como a “nova Oi”, logo após o fim do da primeira recuperação judicial, em 2022. A nova fase da companhia visava a liderança do mercado de conexões por fibra, com banda larga de “altíssima velocidade”, acompanhada de soluções digitais e de TI para pessoas e empresas. 

Eduardo Tude, presidente da consultoria Teleco, acredita que caberá à companhia apenas a gestão dos ativos que restaram, com foco no recebimento de valores a que tem direito e no cumprimento de seus compromissos financeiros. “Ela não deve voltar a competir no mercado de telecomunicações, exceto em uma pequena fatia do B2B”, afirma o executivo. 

“Embora esteja tomando os passos certos para evitar a falência, a Oi está se encaminhando para deixar de ser uma operadora ativa no mercado de telecomunicações”, diz Tude.

Na última quarta-feira (18), a companhia deu mais um passo em direção ao fim da recuperação judicial. A operadora de telefonia conseguiu enfim o último sinal verde que precisava para oficialmente transferir o controle da unidade de banda larga ClientCo.

A Oi recebeu o aval da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) para vender a empresa de banda larga para a companhia de internet V.tal.

Agora, o mercado espera os próximos passos de uma tele que tem o desafio de reconquistar consumidores e a confiança de investidores após anos de crise e recuperações judiciais. E, assim como os orelhões, que tentam sobreviver ao tempo, a Oi tem a difícil tarefa de não se tornar uma antiguidade obsoleta no mercado de telecomunicações.

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