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Larissa Vitória
Larissa Vitória
É repórter do Seu Dinheiro. Formada em jornalismo na Universidade de São Paulo (ECA-USP), já passou pelo portal SpaceMoney e pelo departamento de imprensa do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT).
SD ENTREVISTA

“O Banco Central tem poucas opções na mesa”: Luciano Sobral, da Neo, diz que Copom deve acelerar alta da Selic, mas mercado teme que BC perca o controle da inflação

Na visão de Sobral, o Copom deve elevar a Selic em 0,5 ponto percentual hoje, para 11,25% ano

Larissa Vitória
Larissa Vitória
6 de novembro de 2024
7:05 - atualizado às 10:01
Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos
Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos. -

Com a prévia da inflação de outubro indicando que o IPCA deve encostar no limite da meta do Conselho Monetário Nacional (CMN) e os economistas consultados pelo Banco Central prevendo que o teto deve ser estourado neste ano, o Comitê de Política Monetária do BC (Copom) chega para a reunião desta quarta-feira (4) com poucas opções na mesa.

É o que diz o economista-chefe da Neo Investimentos, Luciano Sobral. Na visão de Sobral, o cenário atual força uma aceleração no ritmo do aperto monetário na taxa básica de juros brasileira. Assim, o Copom deve elevar a Selic em 0,5 ponto percentual hoje, para 11,25% ano.

“A perspectiva de inflação piorou, estamos trabalhando com câmbio mais depreciado e, olhando para fiscal, seguimos sem ter uma resolução para a ancoragem das expectativas. Então tem muita coisa que atrapalha o Copom na missão de tentar baixar a inflação e é preciso trabalhar com o juro mais alto mesmo”, diz o economista em entrevista ao Seu Dinheiro.

Vale relembrar que a Selic subiu pela primeira vez em mais de dois anos no mês de setembro. Mas, apesar do longo intervalo entre altas, o aperto ocorreu apenas dois meses após o BC encerrar um ciclo de cortes nos juros.

De lá para cá, o quadro interno e externo não aliviou a situação para o Copom. Pelo contrário, a eleição presidencial em curso nos Estados Unidos — considerada uma das mais acirradas da história do país — e a manutenção das preocupações com o cenário fiscal doméstico seguiram atrapalhando a performance dos ativos de risco e do câmbio.

O dólar subiu 6% em outubro e iniciou novembro no maior nível em mais de quatro anos, fechando o primeiro pregão do mês com a segunda maior cotação desde o início do plano real. “O real mais desvalorizado num país que tem repasse alto vira inflação lá na frente”, afirma Sobral.

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Do lado fiscal, o governo planeja anunciar um novo corte de gastos. Mas, para o economista, as medidas devem ser pouco para a situação atual e chegarão tarde.

“Não vejo disposição do governo de vir com um pacote de medidas que de fato vai ancorar o crescimento das despesas e fazer com que o mercado fique menos pessimista com a trajetória da dívida. Não está no DNA desse governo.”

Confira abaixo os principais destaques da entrevista com Luciano Sobral, que conta até onde acredita que deve ir o novo ciclo de alta da Selic e o que fazer com os seus investimentos nesse cenário.

O que você acha que o Copom vai fazer hoje?

Acredito que ele de fato vai aumentar a Selic em meio ponto percentual. O Copom tem pouca opção na mesa a não ser ajustar o juro para cima pelo conjunto da obra: a perspectiva de inflação piorou, estamos trabalhando com câmbio mais depreciado e, olhando para fiscal, seguimos sem ter uma resolução para a ancoragem das expectativas.

A inflação tem subido tanto no curtíssimo prazo, que a gente mede no mês a mês, quanto no projetado para o ano que vem.

Não sabemos se ano que vem o governo gasta mais ou menos e temos uma desconfiança enorme. Não do arcabouço em si, mas da capacidade dele fazer com que a relação entre a dívida e o PIB fique estável ou em um crescimento mais ameno.

Ano que vem entramos no período de decisão sobre o orçamento que será executado no ano de eleição, então tem muita coisa pendurada que atrapalha o Copom na missão de tentar baixar a inflação.

Qual deve ser a Selic terminal?

Acreditamos que a Selic terminal vai parar em 12,5%, no começo do ano que vem.

Como nós chegamos a esta situação de subir a Selic pouco tempo após terminar um ciclo de queda e com os EUA cortando juros lá fora?

Têm dois fatores, sobretudo de cenário, em que erramos ao longo deste ano. Assim como quase todo mundo, tínhamos na cabeça o cenário em que o BC cortaria bastante os juros e conseguiria ficar com as taxas mais baixas, até em um dígito, por bastante tempo.

No meio do caminho, o que aconteceu? Tivemos uma desvalorização do câmbio que não estava na conta. E não estou nem falando dessa desvalorização mais recente, que tem acompanhado os outros emergentes, mas sim daquele período entre abril e junho em que o Brasil patinou sozinho. Foi a época em que o Lula aumentou o tom contra o Banco Central, em que ficou claro que o próximo presidente do BC seria o Gabriel Galípolo e que o mercado deixou de lado a utilidade do arcabouço fiscal como âncora para a trajetória da dívida.

Com tudo isso o real desvalorizou e não voltou mais. E o real mais desvalorizado em um país que tem repasse alto vira inflação lá na frente.

O outro fator é a própria atividade econômica. Tínhamos uma ideia no começo do ano de que não seria um ano fraco para crescimento, mas foi mais forte do que todo mundo estava esperando, e concentrado em consumo alimentado por gastos do governo.

Esse tipo de crescimento é particularmente inflacionário porque você está aumentando a demanda sem necessariamente aumentar oferta, e, em resposta a isso, os preços sobem.

Os cortes de gastos que devem ser anunciados em breve podem ajudar a mitigar os riscos?

Acredito que vai ser muito pouco e muito tarde. Não vejo disposição do governo de vir com um pacote de medidas que de fato vá ancorar o crescimento da despesa e fazer com que o mercado fique menos pessimista com a trajetória da dívida. Não está no DNA desse governo, que desde a campanha acredita que tem um mandato de expandir gastos e acha que isso vai gerar crescimento e no fim se pagar.

Tem uma tentativa do Ministério da Fazenda de manter pelo menos o arcabouço, mas ele perdeu a utilidade, pois você pode cumprir todos os requisitos e ainda assim a dívida continua crescendo. Não vou dizer que ele é totalmente desimportante, seria pior obviamente se o governo não tivesse perseguindo nem essa âncora, mas é muito pouco.

O governo e o BC estão dizendo que o mercado está exagerando na reação. Concorda com esse diagnóstico ou os preços em tela refletem uma preocupação real?

Os preços de tela refletem a preocupação de que o Banco Central vai perder o controle sobre o processo de inflação. Isso não quer dizer que a Selic vai subir até 13,5%, esse não é o cenário central e não é o que o esse BC que está entrando provavelmente vai querer fazer. Mas o mercado coloca um prêmio de risco para um quadro em que as coisas pioram muito, o câmbio deprecia mais, a inflação sobe mais e o Copom tem que levar o juro para um patamar mais alto.

Então não acredito que seja um exagero [a reação do mercado] porque esse cenário que acabei de descrever é factível e não é nem improvável.

A piora dos ativos brasileiros pode ser colocada toda na conta interna ou também tem efeitos externos?

Se olharmos outubro, esse foi um mês no qual os ativos brasileiros não foram muito piores do que os ativos lá fora. Foi um mês ruim para o real, mas também foi ruim para praticamente todas as moedas que são ligadas a commodities e de países emergentes. O real desvalorizou, o peso chileno desvalorizou, o peso colombiano desvalorizou, as moedas da Austrália e Nova Zelândia também, todo mundo está apanhando junto contra o dólar.

Ou seja, outubro em particular não teve uma mudança da percepção do mercado com o Brasil, foi mais um movimento global. A piora do país por si só ocorreu mais naquele período que descrevi, entre abril e junho, sobretudo, quando ficou mais claro para o mercado que o governo não estava levando tão a sério a ancoragem monetária e fiscal.

⁠O que esperar para o ambiente macro em 2025?

Depende muito do que vai acontecer nesta semana nos Estados Unidos. Estamos agora em um ponto em que o mercado vai reagir para um lado pro outro. Se o Donald Trump for eleito, ainda há espaço para piorar o mercado, e, dependendo do que ele fizer, muda bastante o cenário pro ano que vem, tanto em termos de crescimento quanto de inflação. Se ele perder a eleição e o governo democrata continuar, tem uma melhor contratada, as coisas ficam mais tranquilas.

Leia também — Donald Trump reivindica vitória com discurso ‘paz e amor’; índices futuros de Wall Street sobem e bitcoin estabelece novo recorde

Dito tudo isso, o que fazer com os investimentos? Quais são as posições da Neo?

Tem uma grande diferença entre o que o investidor pessoa física pode e deve fazer e o que nós precisamos fazer aqui na Neo. Temos nos nossos fundos multimercado um mandato de procurar ideias de investimento que deem um retorno acima do CDI. Dito isso, não é um ambiente em que teremos esse retorno simplesmente comprando dívida do governo. O juro real longo está muito alto e o juro nominal longo está acima de 13%, mas estamos em um ambiente em que a Selic pode ir facilmente para 13% ou mais. Logo, esses títulos de prazo mais longo sequer empatariam com a Selic, o que torna o nosso trabalho aqui mais difícil.

Para um investidor pessoa física, acredito que estamos em um ambiente bom. O juro no Brasil voltou a ficar ridiculamente alto — para carregar título do governo de prazo curtíssimo ou overnight há uma remuneração de 8% acima da inflação, algo que não vemos em lugar nenhum do mundo.

A chance de problema é baixa, então para você que poupa em reais e gasta em reais estamos em um período excelente. Não é bom para quem tem ações ou outros ativos que dependam do juro longo ficar mais baixo, mas quem está no CDI está super confortável.

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