Investimento verde é coisa de gringo, mas isso é bom para nós: saiba quais são as apostas ESG do investidor global no Brasil
Saiba para quais segmentos e tipos de negócios o investidor global olha no Brasil, segundo Marina Cançado, idealizadora de evento que aproximará tubarões internacionais com enfoque ESG do mercado brasileiro
As teses de investimentos centrados em boas práticas ambientais, sociais e de governança corporativa (ESG, na sigla em inglês) ainda não “pegaram” realmente entre os investidores brasileiros, sejam pessoas físicas ou institucionais, mesmo com todas as discussões em torno das mudanças climáticas e da necessidade de uma transição energética.
O que se ouve no mercado local, na verdade, é que os “investimentos verdes” são muito mais relevantes para os grandes investidores internacionais, notadamente os europeus, do que para os brasileiros.
Ao mesmo tempo, com os juros altos nos países desenvolvidos, em especial nos Estados Unidos, o investimento nos países emergentes e mais arriscados, como o Brasil, perde a atratividade para o gringo. Que o diga o fluxo estrangeiro negativo em cerca de R$ 30 bilhões na bolsa brasileira neste ano.
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Mas se, para o investidor global que aloca uma parte do seu capital em emergentes, o Brasil é apenas “mais um na multidão”, quando falamos de investimentos que tomam por base as teses climáticas, o país é um dos destinos que se sobressaem.
“O perfil do Brasil é o inverso do mundo. Nossa matriz energética já é majoritariamente limpa, nossos produtos já têm menos emissão de carbono”, diz Marina Cançado, fundadora da Converge Capital Conference e uma das idealizadoras do evento Brazil Climate Investment Week, em parceria com a Capital for Climate.
“O Brasil é o país com melhor posicionamento no mundo para desenvolver e exportar soluções de descarbonização e gerar crescimento de empresas, economia e renda. Temos uma oportunidade única no mundo”, disse Cançado, em entrevista ao Seu Dinheiro.
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O evento, que acontece nos dias 21, 22 e 23 de maio na capital paulista, visa a aproximar o mercado financeiro local de grandes investidores globais que já estão focando em teses relacionadas a soluções para o clima, a fim de acelerar esses investimentos internacionais no Brasil.
Segundo Cançado, não há como se pensar hoje em investimento de longo prazo, como aqueles que são feitos por fundos voltados para o investimento privado de risco – private equity e venture capital – ou mesmo por fundos de pensão e endowments, sem considerar as mudanças climáticas e como elas vão afetar os negócios e a sociedade.
Para esses investidores, é fundamental entender como as empresas e projetos nos quais eles investem estão relacionados com a jornada de descarbonização no mundo, explica Marina Cançado.
Essas mudanças impactam também o risco das empresas – vide o caso das seguradoras diante de desastres ambientais, como o do Rio Grande do Sul –, o que afeta tanto os investimentos em ações como nos títulos de dívida emitidos por essas companhias.
“As mudanças climáticas já estão impactando empresas e mercados, e o mercado financeiro ainda não está incorporando esses riscos da maneira necessária”, alerta.
Para ela, porém, a relevância do tema na Europa tem muito a ver com o fato de que lá isso já é discutido há quase 20 anos e já há regulações e modelos desenvolvidos para levar as questões ambientais em conta na hora de tomar a decisão de investimento.
Por aqui, por outro lado, o tema só foi ganhar mais evidência de 2020 para cá, em razão da pandemia de covid-19, além de predominar um horizonte de mais curto prazo para os investimentos, diz Cançado.
O que o investidor estrangeiro está olhando no Brasil?
O investidor estrangeiro que já incorporou essa análise de risco à sua decisão de investimentos está de olho em teses verdes no Brasil, diz Cançado, que divide esse perfil de investidor em dois blocos: aquele que deseja recorrer ao investimento direto, como fundos de venture capital e private equity; e aqueles que visam a investir via mercado de capitais, por meio da compra de ações ou títulos de dívida.
Segundo ela, a maior parte opta pela via direta, de olho em empresas nascentes em setores emergentes e em consolidação. “Até que acaba suprindo a falta que temos no Brasil desse tipo de capital de risco”, diz.
Por outro lado, no mercado de capitais, onde se pode investir nas empresas mais consolidadas, existe uma pressão dos investidores internacionais para que as empresas estejam numa jornada de descarbonização. Mas esse movimento ainda é pontual entre as empresas brasileiras listadas.
“Para a gente ter redução de emissões, todos os setores precisam passar por uma profunda transformação. Na Europa já existe até regulação impondo tetos de emissão de gases do efeito estufa. As empresas brasileiras que estão se movendo ou estão percebendo que vão ter vantagem competitiva no seu negócio, ou estão sendo pressionadas por investidores internacionais, ou são listadas lá fora”, explica Marina Cançado.
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Essa realidade inclusive bate com o cenário mais geral, em que a bolsa brasileira vê saída líquida de investimentos internacionais no acumulado do ano, enquanto o investimento estrangeiro direto no país vai de vento em popa, com entrada de mais de US$ 20 bilhões no primeiro trimestre.
Mas quais os setores e segmentos preferidos desse investidor gringo aqui no Brasil? Cançado explica que os fundos de capital de risco buscam negócios principalmente na agenda de transformação do agronegócio, que busque um agro mais sustentável, como biofertilizantes, utilização mais racional de água e tecnologia de rastreamento, pois existe um movimento global de gestoras e empresas para garantir a compra de commodities livres de desmatamento.
Também chama a atenção do investidor global todo o universo de geração de energia a partir de fontes menos poluentes, como biomassa, biogás, hidrogênio verde, combustível sustentável para aviação e minerais críticos para a produção de pás eólicas, painéis solares e baterias de veículos elétricos. “Há muitas empresas voltadas para uma mineração mais sustentável”, afirma Cançado.
O desmatamento é outra preocupação do gringo, que também gosta de soluções baseadas na natureza, como negócios de reflorestamento, agrofloresta e restauração de áreas degradadas. Embora a matriz energética do Brasil seja majoritariamente limpa, explica Cançado, quase 75% das emissões do país estão relacionadas ao desmatamento ligado ao agro.
“O mundo entende que o Brasil precisa alimentar a humanidade, mas de uma forma mais sustentável. É interessante para o resto do planeta que o Brasil combata o desmatamento e também é um movimento de descarbonização, pois florestas capturam carbono de uma forma mais eficiente e barata que as tecnologias de remoção que estão sendo desenvolvidas e ainda não são escaláveis”, diz.
Há oportunidades até mesmo na indústria, como na produção de aço e cimento com menos carbono. “A partir de 2027 passa a vigorar na Europa uma taxa de importação que contabiliza a intensidade de emissões de carbono em cada produto. O Brasil pode sair na frente com isso”, acredita.
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