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Lucia Camargo Nunes
AUTOMÓVEIS

BYD Dolphin Mini vai além da polêmica com o preço — o que o carro elétrico chinês tem de bom (e os sinais de alerta)

BYD precisa superar polêmicas envolvendo o Dolphin Mini para alcançar suas metas ambiciosas para o mercado brasileiro

Lucia Camargo Nunes
17 de março de 2024
7:36 - atualizado às 10:33
BYD Dolphin Mini
BYD Dolphin Mini. - Imagem: Divulgação

Sob muita expectativa e sucedida por uma boa dose de decepção, a BYD lançou um de seus modelos mais esperados no Brasil, o Dolphin Mini.

O novo subcompacto elétrico vai ter de fazer muito sucesso e convencer o consumidor de que vale a pena depois do ruído que a própria marca gerou em torno do lançamento.

Antes mesmo de partir para o produto, é importante entender que a BYD não é uma marca novata. Ela já guarda uma conexão mais antiga com o Brasil.

A chinesa está aqui desde 2015 e possui três fábricas em operação (chassis de ônibus, baterias e placas fotovoltaicas), importa caminhões elétricos e adquiriu as antigas instalações da Ford em Camaçari (BA) para a produção de carros. Só na Bahia serão investidos mais de R$ 3 bilhões.

Recentemente, levou seus principais executivos a Brasília (DF) para chancelar os investimentos com o presidente Lula, a primeira-dama e alguns ministros.

De quebra, deixou um modelo Tan, de R$ 530 mil, em comodato no Palácio da Alvorada para testes por um ano.

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Nos planos da montadora está a fabricação dos elétricos Dolphin, Dolphin Mini, Yuan Plus e o híbrido Song Plus.

A montagem de um deles em CKD já deve ocorrer este ano, com peças vindas da China, e a produção efetiva a partir de 2025. Em cinco anos, a marca quer chegar a 70% de índice de nacionalização.

BYD cresce no Brasil e no mundo

Embora não seja novata, a BYD cresce a passos largos – no Brasil e globalmente. Foi a primeira fabricante no mundo a atingir a produção de 5 milhões de eletrificados (elétricos e híbridos) – em agosto de 2023.

Autointitulada greentech, emplacou 17.947 carros no Brasil no ano passado, um crescimento gigantesco, de quase 7.000%, se comparado às 260 unidades vendidas em 2022.

Tudo isso faz a BYD muito otimista em lançar mais carros e projetar a venda de 120 mil unidades em 2024, atingindo, sozinha, 5% de market share – e se igualar a marcas do naipe de Jeep e Renault, e à frente de Nissan e Honda.

Para isso, sabe que terá de crescer em paralelo com o pós-venda. Com centro de distribuição em Cariacica (ES), a BYD garante que possui 98% dos itens de reposição.

“Somos uma marca jovem, com uma rede jovem e problemas de processo”, admite Henrique Antunes, diretor de vendas da BYD.

Em seu site, a BYD indica 46 concessionárias abertas espalhadas pelo território nacional e mais 23 com aberturas sinalizadas “em breve”.

De acordo com Antunes, o modelo de negócios prevê que a rede fique concentrada em 30 grupos – entre os maiores do segmento no país, como Original, Dahruj, DeNigris, Eurobike, Itavema, Parvi e Simpar.

Numa próxima fase, conforme o crescimento, a BYD pode expandir novas parcerias e abrir o leque para diferentes grupos de concessionárias. Para se ter ideia, a Renault, com 25 anos de Brasil, possui 270 lojas.

O marketing duvidoso da BYD

Com Luciano Huck como garoto propaganda, Nathalia Arcuri, especialista em finanças, como coapresentadora, influenciadores, jornalistas e outras carinhas famosas pelo galpão na Vila Leopoldina, em São Paulo, o Dolphin Mini foi revelado com muito marketing e expectativa.

Nathalia reforçou a compra do carro como algo realmente vantajoso em relação a um similar a combustão, equiparando custos com combustível e energia, manutenção e IPVA e aplicando essa diferença.

De acordo com seus cálculos, enquanto um carro flex consome R$ 0,40 de combustível por km rodado, o elétrico da BYD faz R$ 0,10 por km rodado. Rodando a média de 20 mil km por ano, chega a R$ 6 mil de diferença em economia.

Na manutenção, um Dolphin Mini, cita Nathalia, custa R$ 685 por ano versus R$ 1.590 de um similar térmico, diferença de R$ 900 por ano.

Ela colocou na cesta, ainda, o IPVA, que na cidade de São Paulo é de 50% para eletrificados.

Somando essas diferenças a favor do carro elétrico e investindo em aplicações com taxa de juros de 10% ao ano, Nathalia afirma que após 3 anos, o dono de um Dolphin Mini ganharia R$ 38.931 se aplicasse o dinheiro.

O apresentador da Rede Globo, que diz ter visitado as instalações da BYD na China, teceu elogios ao carro e à marca.

Dias antes, o artista já havia lançado uma promoção em seu programa dominical para a pré-venda: a partir da inscrição, o cliente pagaria, por meio do Mercado Livre, um sinal de R$ 10 mil e garantiria a entrega do carro no primeiro lote, um carregador de 7 kwh (estimado em R$ 7 mil) e mais um desconto extra de R$ 10 mil.

A Renault acreditou

Embaixadores da marca, jornalistas e especialistas de mercado, por meses, emplacaram que o Dolphin Mini chegaria às lojas por menos de R$ 100 mil, gerando uma enorme expectativa. Huck anunciou que 6 mil pessoas haviam se cadastrado na pré-venda do novo modelo.

Até a Renault, que vinha praticando sucessivas reduções de preço do seu elétrico Kwid E-Tech desde a chegada do Dolphin (elétrico da BYD que parte de R$ 150 mil), superestimou a concorrente e baixou semanas antes o preço de seu elétrico para R$ 99.990 (e frustrando quem tem um usado custando mais caro que um novo).

Banho de água fria

Nas contas de alguns espectadores presentes no evento e ouvidos pela reportagem, se o carro era esperado para custar menos que o Renault, ou no máximo R$ 99.800, com o desconto de R$ 10 mil, na pré-venda sairia a R$ 89.800 – ou menos.

Mas a frustração foi generalizada. Ao anunciar o preço de R$ 115.800, Huck remediou com uma duvidosa conta inversa: considerando as promoções (R$ 10 mil + wallbox de R$ 7 mil), o Dolphin Mini na pré-venda, ou até a meia-noite daquele dia, sairia por R$ 98.800.

Procurada uma semana depois, a BYD disse que não tinha contabilizado ainda o volume de unidades na pré-venda, mas especialistas sugeriam que metade dos interessados havia desistido após o anúncio do preço.

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Possíveis consequências para a BYD

Nas páginas do Reclame Aqui as queixas se multiplicam. Sete dias após o lançamento, mais de 100 reclamações podiam ser conferidas no portal por pessoas que reivindicam a devolução do sinal após a desistência da compra – justificada pela decepção do preço.

A estratégia predadora criada no pré-lançamento aliada a uma má utilização de marketing de escassez (“compre com desconto até a meia-noite”) e uma viralização de um preço agressivo que afetou até a concorrência se sobressaíram ao produto.

Os comentários nas redes sociais tiraram o foco de um carro que deveria ser a estrela do lançamento e não de tantas reclamações.

A decepção foi além das redes sociais. O Procon do Maranhão ajuizou uma ação civil pública contra a BYD e o Mercado Livre (responsável pela pré-venda).

O órgão de defesa, contudo, quer que as empresas honrem publicidades que anunciaram o valor de R$ 99.800 – algo que “oficialmente” a BYD nunca fez, mas foi ventilado pelo mercado e por influenciadores sabidamente pagos pela BYD, que especularam que o Dolphin Mini “poderia” ser o elétrico mais acessível do Brasil.

Incluir no preço do carro um desconto pelo wallbox é considerado pelo órgão como venda casada.

O Procon ainda alega que clientes tiveram dificuldades de cancelamento dos contratos e de devolução dos valores pagos, o que configuram em práticas abusivas proibidas pelo Código de Defesa do Consumidor.

Além do cumprimento das ofertas anunciadas e devolução de valores pagos em até 48h, para os clientes que vierem a desistir da compra, o Procon/MA pede na justiça a condenação das duas empresas a dano moral coletivo no valor de R$ 12 milhões.

Mais polêmicas para a BYD

Para colocar mais polêmica no que é considerado um dos maiores lançamentos da BYD no Brasil este ano, a marca ainda enfrenta outros questionamentos.

Os pneus da marca chinesa LingLong têm dimensões 175/55 R16, medida que não é encontrada no Brasil por nenhuma outra marca de pneus.

Não há estepe (apenas um kit de reparo), e caso ele sofra alguma avaria maior, o que não é raro no castigado asfalto irregular das cidades, o proprietário terá de guinchar o carro até uma concessionária e aguardar sua reposição.

Outra reclamação recorrente é sobre a garantia: os 5 anos alardeados pela BYD não valem para todos os componentes do carro, exceto a cobertura de 8 anos para a bateria.

Depois de receber reclamações de clientes sobre problemas na central multimídia de outros modelos, a BYD estendeu de 1 ano ou 30 mil km para 3 anos e 30 mil km a garantia do componente.

Também foi excluída a limitação de 3 meses ou 5 mil km para barulhos no veículo, que passa a ser atrelada ao componente que apresentar ruídos.

Em geral, o consumidor interessado em comprar um BYD (ou qualquer outro carro) precisa ler e estar ciente de todas as coberturas para não reclamar depois.

Vendas iniciais do Dolphin Mini decepcionam

Ainda não há dados oficiais de vendas, mas o Dolphin Mini, de fato, decepcionou.

A BYD certamente terá de fazer muita ginástica para abafar o caso, trabalhar em cima de suas vantagens competitivas e provar que pode lidar com o volume almejado.

Os próximos passos serão fortalecer a rede e seu pós-venda.

A BYD também precisa se posicionar, como fizeram Volvo e BMW, por exemplo, e criar postos gratuitos de recarga.

Se visa vender seus carros a um público classe média e mais volumoso, a ponto de chegar a 5% de market share, é preciso expandir drasticamente sua a rede de eletropostos e não se favorecer de uma infraestrutura ainda pequena para o segmento.

Como é o novo BYD Dolphin Mini

O BYD Dolphin Mini é um subcompacto de 4 lugares, 100% elétrico. Seu motor rende 75 cv de potência e 13,7 kgfm de torque, equivalente ao desempenho de um modelo 1.0 automático.

A diferença é que seu torque é instantâneo, e apesar de limitado, é mais ágil. Por ser elétrico, não tem troca de marchas, então, numa saída de semáforo ou ultrapassagem é bem mais rápido de ganhar velocidade.

Atinge 130 km/h de velocidade máxima, o que é aceitável. Mas trata-se de um carro limitado a rodar na cidade, pelas suas características.

Entre elas, o porta-malas de apenas 230 litros (um VW Polo tem 300 litros), e a bateria de 38 kwh, alcança 280 km de autonomia (Inmetro). Ou seja, evite usar o carro para viajar, pois na estrada essa autonomia cai drasticamente.

Em tamanho, o Dolphin Mini tem 3,78 m de comprimento (um pouco maior que um Renault Kwid, que tem 3,68 m) e entreeixos de 2,5 m.

Mesmo compacto, a configuração interna impressiona pelo bom espaço no banco de trás, que leva dois adultos com conforto.

A BYD diz que “estuda” adequar o Dolphin Mini para 5 lugares, mas na China ele só é produzido para 4 ocupantes.

O que, pelo que avaliamos, é o ideal. Mesmo que a marca consiga reestruturar e homologar para 5 lugares, ficará apertado.

Testando o Dolphin Mini

A reportagem conheceu o Dolphin Mini em seu lançamento e dirigiu o subcompacto num minipercurso.

Nestas duas voltas, deu para perceber que o carrinho é ágil e tem um bom diâmetro de giro (4,95m), ou capacidade de esterçamento acima do esperado. Isso facilita as manobras nas vias urbanas.

Também não é pesado para um elétrico: são 1.239 kg em ordem de marcha (um Renault Kwid flex, contudo, pesa menos de 800 kg).

Deu para perceber que a suspensão é firme demais, apesar de não ser um carro esportivo. Testes feitos pela revista 4Rodas mostram que o carro pula na traseira, como se estivesse sem amortecedor.

Mais um motivo pelo qual o consumidor não deve abrir mão de fazer um test drive pelas ruas ao negociar um Dolphin Mini na concessionária.

Acabamento do BYD Dolphin Mini é caprichado

Mas ele tem seus pontos positivos. Um dos diferenciais deste BYD é o capricho no acabamento, mesmo com as economias visíveis (apenas um limpador de para-brisa e ausência dele no vidro traseiro).

Assim como o irmão maior Dolphin, o Mini é bem construído, com materiais macios ao toque, sem rebarbas e possui revestimentos de couro de origem não-animal.

Nos conteúdos, traz bons itens de segurança e conforto: seis airbags, assistente de partida em rampa, piloto automático, monitoramento de calibragem de pneus, freio de estacionamento eletrônico, sensores de estacionamento câmera de ré automática, chave presencial, banco do motorista com ajuste elétrico, conjunto ótico de LED, além de multimídia de 10” com tela giratória, cluster de 7” e carregador por indução para smartphone.

A BYD oferece quatro cores com acabamento interno em diferentes tons: branco Apricity (interior rosa e azul escuro), preto Polar Night (interior azul escuro), rosa Peach (interior Rosa) e verde Sprout (interior azul claro).

Como ocorre com a maioria dos elétricos, que possuem 1/3 dos sistemas de um carro térmico, o plano de revisões é alongado e fica mais em conta.

No Dolphin Mini, as revisões são feitas todo ano ou a cada 20 mil km, e seu custo total até 5 anos ou 100 mil km fica em R$ 3.110, metade de um SUV compacto.

O que o BYD Dolphin Mini tem de bacana...

  • Ser um carro elétrico bem equipado por R$ 115.800;
  • Ótimo nível de conforto;
  • Acabamento caprichado;
  • Bom nível de equipamentos;
  • Freios a disco nas 4 rodas;
  • Bom espaço no banco de trás (para 2 passageiros);
  • Ideal para rodar na cidade;
  • Baixo custo de recarga e manutenção;
  • Emissões: menos de 2.300 kg de carbono (o equivalente a um carro a combustão) por ano na atmosfera;
  • Sem ruídos.

... e os sinais de alerta

  • Suspensão firme demais e com acerto irregular na parte de trás;
  • Garantia de até 5 anos apenas para alguns itens;
  • Pneu sem similar no mercado nacional;
  • Limitado a rodar na cidade;
  • Autonomia do computador de bordo superestimada (405 km, metodologia chinesa CLTC). O Inmetro indica 280 km;
  • Porta-malas de 230 litros mal comporta as compras da semana do supermercado; e
  • Apenas 4 lugares.

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