DIGERINDO A SUPER QUARTA: A DISCUSSÃO DE "QUANTO" E "QUANDO", NÃO DE "SE"
A apresentação de Jerome Powell ontem teve uma recepção entusiástica do mercado, com o presidente do Federal Reserve adotando uma abordagem mais suave do que o antecipado, ultrapassando as expectativas prévias baseadas no comunicado do Fed que já ressaltava a solidez da economia americana, mantendo as taxas de juros na faixa de 5,25% a 5,50%.
Prevê-se agora que os EUA experimentem uma diminuição nas taxas de juros ainda este ano, com estimativas apontando para possíveis três reduções, e há quem projete até uma quarta queda — embora eu veja tal perspectiva com ceticismo (vejo apenas três).
A data de início desses cortes, seja em junho ou julho, ainda é uma incógnita, mas há um acordo geral de que serão implementados.
No Brasil, espera-se que a tendência de redução de juros persista, apesar de uma postura mais cautelosa ("hawkish") por parte do Banco Central local.
Hoje, os olhares se voltam para a reunião do Bank of England (BoE), esperando-se a manutenção da taxa de juros em 5,25%.
Ainda existe uma indefinição sobre quando ocorrerá o primeiro corte de juros, com expectativas de que possa acontecer em sequência ou pouco depois da decisão do Banco Central Europeu (BCE), que está de olho em junho para seu primeiro corte, dependendo, obviamente, das decisões do Fed.
Na Suíça, um corte inesperado de 25 pontos-base foi anunciado, reduzindo a taxa de juros de curto prazo de 1,75% para 1,5%, um movimento que, embora tenha surpreendido alguns, era por mim esperado.
No cenário global, o otimismo segue elevado após a reunião de política monetária dos EUA, refletido tanto nos mercados europeus quanto nos futuros americanos, assim como na positividade observada nos mercados asiáticos. A tendência de alta, portanto, parece destinada a continuar.
A ver…
00:58 — A queda do plural
No Brasil, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central promoveu um corte de 50 pontos-base na taxa Selic, ajustando-a para 10,75% ao ano nesta quarta-feira (20), após o fechamento do mercado.
Este ajuste representa o sexto corte consecutivo na taxa básica de juros, seguindo a tendência de flexibilização monetária iniciada em agosto de 2023, sem surpresas. A novidade veio no comunicado depois da decisão, que alterou a formulação do forward guidance (orientação futura), agora prevendo unicamente mais um corte de 50 pontos na reunião de maio, jogando a Selic para 10,25% — conforme expectativas já estabelecidas desde janeiro.
Para junho, o cenário permanece aberto, uma vez que até janeiro o Banco Central havia sinalizado a possibilidade de dois cortes nesta magnitude (50 pontos-base). Isso mudou agora.
A alteração para a menção de apenas "na próxima reunião" ao invés de "nas próximas reuniões" diminui as expectativas de finalizar o semestre com a taxa Selic em 9,75% (corte de junho), embora não elimine completamente essa possibilidade.
O comunicado destaca: “O Comitê considera que o cenário-base não sofreu alterações significativas. Dada a elevada incerteza e a consequente necessidade de maior flexibilidade na política monetária, os membros do Comitê decidiram unanimemente comunicar a previsão de um corte da mesma magnitude na próxima reunião, caso o cenário esperado se confirme.”
Ou seja, o cenário-base segue em grande parte igual.
Adotar uma postura mais cautelosa faz sentido diante de três considerações principais:
i) o diferencial de juros em relação aos Estados Unidos e ao México, com este último começando hoje a cortar a taxa de juros pela primeira vez em meses;
ii) o reconhecimento dos desafios inflacionários observados no início do ano, apesar de não interromperem o processo de desinflação; e
iii) a necessidade de manter uma âncora monetária na ausência de uma âncora fiscal confiável. Contudo, ainda é possível que haja um corte adicional de 50 pontos em junho , seguindo posteriormente para uma Selic terminal de 9%, embora essa perspectiva esteja temporariamente atenuada.
Espera-se que a decisão do Copom gere volatilidade na curva de juros e um fortalecimento do real, especialmente em um contexto onde o Copom se posiciona de forma mais conservadora ("hawkish") em comparação a um Federal Reserve mais suave ("dovish").
Lá fora, o ETF brasileiro em NY (EWZ) segue subindo no pre-market.
01:59 — Um cara tranquilo
Pela primeira vez desde novembro de 2021, os três índices mais influentes do mercado de ações nos Estados Unidos – o S&P 500, o Nasdaq Composite e o Dow Jones – alcançaram recordes simultâneos de fechamento.
Este marco reflete a reação otimista do mercado na quarta-feira (20) ao anúncio do Federal Reserve de manter sua expectativa de realizar três reduções nas taxas de juros até o final de 2024.
Inicialmente, o tom da comunicação do Fed que acompanhou a decisão de preservar a faixa da taxa de fundos federais entre 5,25% e 5,5% foi interpretado como um sinal de cautela, especialmente diante dos desafios inflacionários evidenciados no início do ano.
Consequentemente, as projeções do Fed para a economia e inflação se fortaleceram, um resultado dentro do esperado.
Contudo, o cenário ganhou uma nova perspectiva durante a coletiva de imprensa de Jerome Powell.
Powell reconheceu a natureza desfavorável dos dados recentes, mas sugeriu uma possível influência sazonal, notando uma melhora em fevereiro, apesar de ainda apresentar índices ligeiramente elevados.
Sua análise dos meses de janeiro e fevereiro indicou que o cenário global pouco mudou, mantendo-se o processo de desinflação.
Esta postura mais suave (dovish), especialmente diante dos dados econômicos e das próprias estimativas do Fed, marcou um momento decisivo.
Além disso, Powell destacou as discussões do FOMC sobre a desaceleração do encolhimento do balanço de ativos do Fed (algo importantíssimo), que vinha sendo reduzido ao ritmo de US$ 95 bilhões mensais desde meados de 2022, totalizando uma diminuição de US$ 1,5 trilhão desde o início do aperto quantitativo (QT).
Com a perspectiva de moderação neste processo, antecipa-se uma maior perspectiva de liquidez na economia.
Essa combinação de fatores foi interpretada como dovish pelo mercado, gerando entusiasmo entre os investidores.
Após a divulgação de dados inflacionários preocupantes em fevereiro, Powell enfatizou que os resultados não alteraram significativamente a direção da política monetária do banco central, mantendo a trajetória de queda gradual da inflação, apesar dos obstáculos no caminho.
Em resumo, o Fed se mostra aberto à redução das taxas de juros, calibrando as expectativas sobre o timing desses cortes.
Assim, mantenho a previsão de três cortes para este ano, iniciando em junho e seguindo em setembro e dezembro, cada um de 25 pontos-base, um desenvolvimento que deveria impulsionar não apenas o mercado americano, mas também o brasileiro (mercados emergentes no geral), condicionado, é claro, à evolução dos indicadores econômicos nos próximos meses.
02:56 — Mais crescimento?
O panorama do crescimento econômico está claramente mudando de nível. Uma lição que os investidores podem extrair da recente reunião do Federal Reserve é a percepção dos dirigentes do banco central de que a taxa potencial de crescimento econômico dos Estados Unidos pode ter se elevado (o mundo pós-pandêmico é realmente diferente).
Há uma expectativa de um avanço mais robusto, sem provocar um aumento significativo na inflação ou a necessidade imediata de reduções nas taxas de juros.
Embora ainda exista um debate acalorado sobre este assunto, novas dinâmicas estruturais sugerem um impulso adicional ao crescimento. Isso inclui o movimento de regionalização industrial, como o nearshoring e o friendshoring, incremento nos gastos governamentais, alterações nos padrões de consumo e investimentos em tecnologia, preparando o terreno para a era da inteligência artificial, sem mencionar os potenciais impactos futuros da IA no universo corporativo.
Esse raciocínio também se aplica ao Brasil.
O ambiente econômico deve se apresentar favoravelmente este ano, ainda impulsionado pelos efeitos das reformas dos governos Temer e Bolsonaro.
A expectativa para o setor da construção civil é particularmente otimista, beneficiada pela redução dos juros, mantendo um cenário de estabilidade, ainda que de crescimento modesto.
Diferentemente de 2023, espera-se que a expansão do PIB deste ano não seja liderada apenas pelo agronegócio (que ainda está forte), mas também pelo setor de serviços, especialmente com a Selic se aproximando do patamar de um dígito.
Entre as notícias encorajadoras, destaca-se a projeção surpreendentemente positiva para o crescimento do PIB, já estimado entre 2% e 2,5%, e a melhoria nos índices de desemprego (estruturalmente), além de uma condição cambial favorável, reforçada por uma balança comercial positiva (ganho também estrutural), o que contribui para fortalecer o PIB.
Diante desses fatores, a falta de desempenho do mercado de capitais se torna difícil de justificar, sinalizando que a bolsa representa uma oportunidade atrativa de investimento.
03:45 — Problemas logísticos
Os ataques dos rebeldes Houthi contra navios de carga no Mar Vermelho estão redirecionando o comércio marítimo global e criando uma janela de oportunidade para a África, um desenvolvimento que tem passado relativamente despercebido.
Desde o início de dezembro, houve um aumento de 85% no número de embarcações navegando ao redor do Cabo da Boa Esperança, uma rota alternativa que contorna a extremidade sul do continente africano.
No entanto, esses navios enfrentam desafios significativos para encontrar locais adequados para reabastecimento e descanso.
Portos sul-africanos como Cidade do Cabo e Durban, apesar de serem grandes instalações portuárias e teoricamente bem posicionados para se beneficiar deste desvio no comércio, são atormentados por congestionamentos e ineficiências que levam muitos a evitá-los.
Em contraste, portos alternativos menores, como Walvis Bay na Namíbia, Toamasina em Madagáscar e Port Louis nas Maurícias, estão vendo um aumento no tráfego marítimo. Toamasina, por exemplo, viu o número de navios aumentar de 2 em outubro para 35 em janeiro.
Melhorias em capacidade e eficiência demandarão tempo e investimento, mas representam uma oportunidade promissora para o continente africano se capitalizar no longo prazo.
Claro, a ameaça atual ao tráfego marítimo no Canal de Suez pode ser temporária, especialmente se o conflito entre Israel e Hamas se resolver.
No entanto, dada a história de instabilidade na região, é razoável antecipar que novas perturbações possam ocorrer no futuro, reiterando a importância de considerar alternativas sustentáveis e melhorias para os portos africanos.
04:33 — Invasão?
O Exército de Libertação Popular (ELP) da China está ampliando seu poderio militar em um ritmo não observado desde a Segunda Guerra Mundial, com claros indícios de que pretende estar preparado para uma possível ação militar contra Taiwan até 2027.
Essa informação foi compartilhada pelo Almirante John Aquilino durante um depoimento ao Congresso dos Estados Unidos.
As movimentações e expansões recentes do ELP demonstram sua capacidade de aderir ao cronograma estipulado por Xi Jinping para a unificação de Taiwan à China continental, utilizando-se de força, caso recebam tal comando.
Mesmo diante dos obstáculos econômicos enfrentados por Pequim, houve um significativo aumento de 16% em seu orçamento de defesa, alcançando mais de US$ 223 bilhões.
Nos últimos três anos, sob a liderança de Aquilino, o ELP expandiu consideravelmente suas forças, incorporando mais de 400 aeronaves de combate e acima de 20 importantes navios de guerra ao seu arsenal. Além disso, dobrou a quantidade de mísseis balísticos e de cruzeiro desde 2020.
Aquilino também observou que as forças armadas chinesas vêm realizando exercícios que simulam operações contra Taiwan, incluindo o ensaio de um cerco que envolve bloqueio marítimo e aéreo.
Trata-se de uma situação que requer nossa atenção contínua.