Eurasia: existe risco que medidas judiciais para conter novas manifestações agravem polarização
Em entrevista ao Seu Dinheiro, o analista Leonardo Meira Reis, da Eurasia Group, avalia impactos dos atos golpistas do dia 8 de janeiro de 2023
A reação enérgica dos Três Poderes aos atos golpistas realizados por opositores do governo Luiz Inácio Lula da Silva no domingo (8) fortaleceu os pilares da democracia brasileira, na visão de muitos analistas políticos.
No mesmo dia — e ainda em meio às cenas de destruição em Brasília —, o presidente Lula decretou intervenção na segurança do Distrito Federal.
Em paralelo, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes determinou o afastamento do governador Ibaneis Rocha (MDB), atendendo a um pedido do senador Randolfe Rodrigues (Rede) e da Advocacia-Geral da União.
Em questão de horas, foi decretada a prisão em flagrante de centenas de manifestantes e teve início uma investigação mais profunda sobre quem financiou os atos. Há uma busca, inclusive, pelos que podem ter se omitido e facilitado o quebra-quebra.
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E, por mais óbvio que seja que os criminosos tenham de ser punidos, é preciso ter cuidado para que as decisões tenham provas contundentes. Do contrário, as narrativas de perseguição política podem ganhar ainda mais força, alerta Leonardo Meira Reis, analista da Eurasia Group, uma das mais respeitadas consultorias de risco político no mundo.
“Existe um risco, sim, de as medidas judiciais e de segurança que devem ser adotadas para conter novas manifestações agravem ainda mais o ambiente de polarização no país”, disse Reis em entrevista ao Seu Dinheiro.
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O analista também apontou suas visões sobre a reação do mercado financeiro e a diferença entre os investidores estrangeiros e os locais.
Confira os principais pontos:
Ambientes de incerteza costumam deixar os mercados voláteis, mas, nos dias seguintes às manifestações em Brasília, a reação da bolsa e do dólar foi positiva e, em alguma medida, dentro da normalidade. Você tem alguma interpretação sobre isso?
Parte da explicação pode estar no fato de que os atores de mercado entenderam que os riscos de curto-prazo relacionados a novos episódios violentos ou manifestações que pudessem afetar a atividade econômica parecem sob controle.
A forte reação da classe política, as rápidas respostas judiciais ao movimento, determinando a mobilização das forças de segurança para contenção, e a condenação majoritária dos atos pela opinião pública ajudaram a dissipar parte do clima de incertezas gerado pelo episódio. Evidentemente, o mercado vai estar atento à leitura de novos eventos possíveis. Mas essa leitura dominou.
Na nossa cobertura pré-eleitoral, vimos os investidores estrangeiros mais empolgados com Lula do que com Bolsonaro, uma atitude bem diferente da maioria dos investidores locais, que avaliava exatamente o contrário. Você vê os últimos acontecimentos fazendo os estrangeiros mudarem de visão?
Os investidores estrangeiros estão mais focados nas mensagens mais amplas emitidas por Lula desde a sua eleição, que não tendem a mudar no curto-prazo. Pesaram a favor de um sentimento inicialmente positivo os compromissos com recuperação da agenda ambiental, a disposição para retomar ações de cooperação internacional e a capacidade de diálogo do presidente com líderes mundiais de diversos perfis políticos e ideológicos.
Também há uma percepção de que Lula buscará entregar uma agenda de ampliação de investimentos mantendo o equilíbrio fiscal no longo prazo e trabalhará para avançar com uma reforma tributária que reduza a complexidade para se investir no país.
Os primeiros sinais emitidos pelo governo eleito nas negociações do espaço fiscal fora do teto de gastos para ampliar gastos sociais, na montagem da equipe econômica e nas declarações de Lula geraram preocupação entre investidores locais e estrangeiros. A diferença está no tamanho da preocupação. Elas são as mesmas, mas os estrangeiros estão mais dispostos a dar um maior benefício da dúvida e estão olhando para o Brasil bem situado no contexto global de hoje.
Há muitas comparações entre o que aconteceu em Brasília no domingo com a invasão do Capitólio, ocorrida dois anos atrás. Em que pontos os dois eventos se assemelham e em que pontos se distanciam?
O 8 de janeiro de Brasília certamente nos remete ao 6 de janeiro americano, mas seus contornos foram menos dramáticos. No Brasil, os episódios violentos ocorreram depois de o presidente Lula já ter tomado posse e em um domingo, quando poucos servidores públicos estavam presentes nos prédios que foram invadidos. Houve confrontos entre manifestantes e oficiais de segurança, mas sem mortes. E não foi uma invasão fruto de um presidente ativamente tentando prevenir uma transferência de poder.
Entre as semelhanças, destaque para o benefício de curto-prazo que Lula tende a receber por conta da condenação majoritária dos atos pela opinião pública e, principalmente, da união da classe política para punir os envolvidos e evitar novos episódios. Assim como ocorreu com o presidente americano, Joe Biden, depois da invasão do Capitólio, Lula deve ter um reforço temporário de sua legitimidade enquanto presidente eleito.
Mas, também como ocorreu nos EUA, Lula seguirá enfrentando vulnerabilidades políticas e estará suscetível a novas pressões da opinião pública ao longo do seu mandato, especialmente quando a “lua de mel” com o novo governo acabar e a popularidade do presidente começar a sofrer em decorrência de potenciais dificuldades econômicas. E, muito como Trump permanece a principal liderança na oposição, o mesmo deve acontecer com Bolsonaro.
O que o novo governo pode fazer para acalmar os ânimos dos bolsonaristas? Há um caminho possível de diálogo?
Diferentemente de 2013, quando havia uma enorme pressão em decorrência da qualidade dos serviços públicos, a pauta de agora não tem relação com políticas públicas. São atos de grupos que acreditam que o sistema praticou conluio para favorecer a eleição de Lula e que o Supremo tem extrapolado suas prerrogativas constitucionais e, dessa maneira, estaria violando liberdades individuais. Então, a resposta do governo não será no sentido de oferecer um pacote de medidas, mas sim a responsabilização daqueles que participaram dos atos violentos, seja participação direta nos ataques, via financiamento, ou apoio de outras formas.
As autoridades dos Três Poderes e nos estados estão enviando esforços para dar respostas duras e rápidas, de forma a desestimular novas tentativas na mesma linha. Aqui, é preciso também ter cuidado para fundamentar as decisões em provas contundentes e afastar possíveis narrativas de que se trata de uma perseguição política a opositores do governo. Existe um risco, sim, de as medidas judiciais e de segurança que devem ser adotadas para conter novas manifestações agravarem ainda mais o ambiente de polarização no país.
A Eurasia tem dito que os EUA, após a queda do muro de Berlim, se transformaram em “exportadores de democracia”. Agora, tornaram-se o principal exportador de ferramentas que destroem a democracia. Qual é a visão da Eurasia sobre a saúde da democracia no mundo?
Os governantes de todo o mundo estão enfrentando crescente pressão da opinião pública. Não apenas por conta dos problemas sociais e econômicos ocasionados pela pandemia da Covid-19 e os recentes choques inflacionários globais, mas também porque o nível de confiança nas instituições políticas é o menor em décadas.
É crescente a parcela da população que não acredita na capacidade dos governos de entregar serviços públicos de qualidade nas áreas de saúde, segurança e educação, entre outros. Isso tem reduzido drasticamente o período de lua de mel dos governantes recém-eleitos e mobilizado oposições radicais que se posicionam contra o “sistema”.
No curto prazo, as principais democracias não parecem estar em risco iminente, uma vez que o apoio popular a esse sistema ainda parece ser majoritário, e as classes políticas dos países democráticos parecem não estar dispostas a embarcar em “aventuras” fora desse sistema neste momento.
O risco está mais no longo prazo, na medida em que ter uma parcela relevante da população que não acredita nas regras básicas do jogo tende a aumentar a instabilidade política e, consequentemente, a capacidade de entrega dos governos.
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