Como o marco das Garantias pode reduzir os juros do crédito e ajudar a incrementar o caixa de fundos imobiliários
O projeto de lei busca facilitar o acesso ao crédito, diminuir o risco para os credores e pode trazer vantagem até mesmo para os FIIs
O recesso do Congresso terminou faz quase um mês, mas os parlamentares voltaram ao trabalho com tantas pautas para colocar no plenário que a fila pouco diminuiu nesse período. A mais famosa talvez seja a reforma tributária, mas há uma outra matéria na lista de espera que tem potencial para causar impacto no mercado brasileiro: o Marco Legal das Garantias.
O projeto de lei recebeu o sinal verde dos senadores ainda em julho, antes do início do recesso. Como foi alterado por Weverton Rocha (PDT-MA), relator do texto na Casa, deve voltar para a Câmara dos Deputados antes de seguir para sanção presidencial.
Para o senador, o texto facilitará o acesso ao crédito e tem o potencial de reduzir os juros no país.
Criado para regular as normas para bens utilizados como aval de empréstimos e financiamentos, o Marco das Garantias deve ainda diminuir os riscos para os credores.
Assim, a expectativa é que a medida ajude, por exemplo, a diminuir os juros do crédito para a compra de veículos e pode trazer vantagens até mesmo aos fundos imobiliários, segundo especialistas ouvidos pelo Seu Dinheiro.
Isso porque ele traz mudanças importantes quanto ao uso de imóveis em alienações fiduciárias — modalidade onde há a transferência da propriedade — e outras formas de crédito, como a emissão de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs).
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Como o Marco das Garantias pode mudar o jogo para os fundos imobiliários
A operação, conhecida como securitização, traz dinheiro para o caixa dos FIIs e custeia a compra de ativos por meio de um “empacotamento” de recebíveis futuros. Os aluguéis previstos para um imóvel da carteira do fundo, por exemplo, podem servir como lastro para a estruturação de um CRI.
A estratégia permite captar dinheiro com investidores, mas o ativo fica “preso” à operação enquanto houver saldo devedor, de acordo com a norma atual.
“Normalmente essa dívida atrelada a um CRI é de longo prazo. O ativo costuma se valorizar ao longo do tempo, mas o credor tem que quitar a primeira emissão antes de poder usá-lo em uma nova operação de crédito”, afirma Ricardo Negrão, sócio fundador do NFA Advogados e especialista em direito imobiliário.
O Marco Legal deve mudar isso, pois o texto propõe justamente a possibilidade de utilizar um mesmo imóvel como garantia de mais de um empréstimo em bancos diferentes.
“Antes, o devedor ficava à mercê de negociar com o credor. Agora haverá a possibilidade de utilizá-lo em uma nova operação sem precisar quebrar o primeiro contrato”, resume Negrão.
Ana Carolina Tabith, que também é sócia do NFA e especialista em gestão de processos do Contencioso Cível, aguarda a redação final do PL para interpretar a nova regra, mas indica que, por enquanto, a mudança valerá para o lastro de créditos menores que o valor real do bem — ou seja, o empréstimo será fracionado.
Essa novidade aumentará a demanda por crédito, na visão de Daniel Gava, CEO da Rooftop. Por outro lado, o executivo não acredita que as instituições financeiras aumentarão os índices de concessão de empréstimos apenas com base nisso: “os bancos não vão deixar de avaliar a capacidade de pagamento de cada devedor antes de aprovar um financiamento.”
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Execuções de garantias facilitadas
O projeto do novo Marco das Garantias também busca simplificar o processo para a recuperação de bens dados como garantia.
Atualmente, os credores precisam recorrer à Justiça para tomar posse dos itens listados como garantia de financiamentos em caso de inadimplência do devedor. A única exceção a essa regra são os imóveis.
“Com isso, a alienação fiduciária costuma virar alvo de questionamentos judiciais que fragilizam os credores, como as ações para obter tutela liminar suspensivas de retomadas de automóveis”, diz o CEO da Rooftop.
Com o Marco das Garantias, bens móveis como os veículos também poderão ser cobrados fora dos tribunais, o que, segundo Gava, “facilita a execução das garantias e leva à desjudicialização dos processos”.
De acordo com informações da Agência Senado, a última versão do texto estabelece que títulos executivos previamente protestados poderão ser executados diretamente no cartório. Ou seja, o tabelião de protesto poderá conduzir a execução extrajudicial de dívidas nos casos autorizados em lei.
No caso de veículos, os Departamentos Estaduais de Trânsito (Detrans) serão os responsáveis pelo processo com o auxílio de empresas privadas credenciadas a prestarem os serviços de registro de gravames.
O Senador Weverton Rocha frisou, em entrevista à agência, que a escolha final será do credor: “Quem não quiser ir pela via extrajudicial, vai pela via judicial, que é a instância que dá a palavra final. A extrajudicial vai facilitar a quem dá o crédito e ao tomador desse crédito a fazer uma boa negociação com juros mais baixos”.
Vale destacar que, ainda segundo informações da Agência Senado, será assegurado ao devedor a prerrogativa de acabar com a execução em qualquer altura do processo. Para isso, é preciso pagar ou depositar a importância atualizada da dívida, acrescida de juros, correção monetária, honorários advocatícios, emolumentos e demais despesas.
Nesse caso, a extinção da execução processada nos cartórios será declarada por certidão, sem necessidade de pronunciamento judicial.
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Bem de família segue impenhorável
Se o Marco das Garantias facilitará as execuções extrajudiciais, por outro lado o texto reafirma a impenhorabilidade de um bem de família — ou seja, o único imóvel residencial destinado à moradia de um grupo familiar.
O dispositivo, que está previsto no Código de Processo Civil (CPC), havia sido derrubado durante a tramitação do texto na Câmara, mas foi restaurado pelos senadores.
Assim, o bem de família seguirá impedido de ser objeto de penhora para pagamento de dívidas. Mas há exceções: “Na execução tradicional, muitos devedores alegam que não podem perder imóveis porque são bens de família, mas se dou o bem em alienação fiduciária abro mão dessa proteção”, cita a advogada Ana Carolina Tabith.
Outros casos em que o imóvel único poderá ser executado incluem débitos de pensão alimentícia, de ações trabalhistas ligadas às funções domésticas, de IPTU ou taxas e contribuições de condomínio ou de indenização em ação penal.
Casas ou apartamentos hipotecados, comprados com dinheiro advindo de fontes ilegais ou cujo titular é fiador em contrato de locação também podem ser penhorados.
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