FAZ DE CONTA QUE AINDA É CEDO
Lá fora, os mercados asiáticos fecharam em baixa nesta quinta-feira, seguindo as sugestões mistas dos mercados globais do pregão de ontem, já que os investidores permanecem cautelosos e relutam em fazer movimentos significativos antes da divulgação do relatório mensal de empregos dos EUA, na sexta-feira — os dados de emprego podem ter um impacto significativo nas perspectivas para as taxas de juros.
Os mercados europeus e os futuros americanos têm uma manhã difícil hoje, com o reforço da fala de Powell na quarta-feira prejudicando continuamente o humor do internacional.
Apesar de soar como uma atuação vocal, chamou a atenção a fala de que o Fed estaria preparado para acelerar novamente o ritmo de aumentos de juros a depender dos dados. O Brasil, por outro lado, tem acompanhado sua própria dinâmica.
A ver…
00:39 — Um dia de domingo
O mercado local está flertando com um estado de conforto. Não só a ausência de atritos entre Poder Executivo e Banco Central faz a diferença, mas também a expectativa pela apresentação do novo arcabouço fiscal tem criado um movimento positivo do mercado doméstico.
Diante, portanto, de uma agenda mais fraca hoje, os investidores seguem acompanhando as novidades de Brasília, especialmente a reunião entre Simone Tebet e Fernando Haddad, marcada para hoje.
São dois os temas que afetam o mercado brasileiro neste momento: i) o novo arcabouço fiscal; e ii) a Reforma Tributária. Destaque para o primeiro, que deverá ser apresentado ainda neste mês, antes da reunião do BC, justamente para já dar espaço para um tom mais flexível.
Muitos já começam a esperar um corte de juros já em março, algo antes impensável — alguns mais radicais, inclusive, ponderam um corte de 25 pontos já agora em março, muito por conta da possível crise de crédito que se aproxima.
A mais provável, porém, é que o BC já deixe claro neste mês sua intenção de reduzir os juros, apontando para os dados de atividade e os méritos da Fazenda nos últimos meses. Sim, ainda haverá ruídos entre março e maio. Pelo menos já começamos a ter perspectivas para uma queda de juros.
Não custa lembrar que o último ciclo positivo para ativos brasileiros, entre 2016 e 2019, foi impulsionado, entre outras coisas, pela queda estrutural dos juros. Podemos estar nos aproximando de algo parecido.
01:51 — Atuação vocal
Nos EUA, o mercado ainda tem como pano de fundo os testemunhos do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, no Congresso americano. O depoimento ecoou sobre os investidores, que entenderam melhor a chance de o Federal Reserve aumentar as taxas de juros para combater a inflação.
Ficou claro que o banco central ainda não decidiu o tamanho do aumento da taxa de juros em março, dependendo de dados para tomar a decisão. Ainda assim, entendo como sendo o caminho mais razoável mais um aumento de 25 pontos-base, dando continuidade à trajetória recente.
Ao mesmo tempo, o mercado se prepara para os dados de emprego e de inflação, que se vierem muito acima do esperado podem mudar essa leitura. Hoje temos pedidos de auxílio-desemprego, mas os grandes números ficam para sexta-feira, com os dados de payroll, e terça-feira que vem, com a inflação ao consumidor.
Enquanto isso, o yield de dois e de 10 anos fecharam com mais de um ponto percentual de diferença pela primeira vez em 42 anos — houve apenas 7 vezes na história, desde 1940, com uma situação como a atual, sempre tendo resultado em recessão em no máximo 8 meses.
02:49 — As contas de Biden
O presidente Joe Biden está divulgando sua proposta de orçamento fiscal para 2024, destacando suas prioridades e destacando as diferenças entre democratas e republicanos sobre suas abordagens aos gastos. Em seu discurso em fevereiro, Biden disse que seu orçamento anual reduziria o déficit em US$ 2 trilhões em 10 anos e manteria o Medicare solvente por pelo menos mais duas décadas.
Para isso, ele reviveu as propostas para aumentar os impostos corporativos e instituir um imposto mínimo para os americanos muito ricos. Com isso, o orçamento de Biden se concentra em expandir a economia, reduzir custos, proteger a previdência social e reduzir o déficit.
É uma equação difícil de se manter, principalmente quando caminhamos para uma recessão no curto prazo. Os republicanos, por sua vez, querem negociar o aumento do teto da dívida, que só seria aprovado com cortes de gastos já em 2023 e 2024. A depender da gravidade das discussões, o mercado pode sentir.
03:36 — O ambiente asiático
A maioria das ações asiáticas caiu nesta quinta-feira, com dados de inflação chinesa mais fracos do que o esperado, apontando para uma recuperação econômica lenta no país. Não só a inflação ao consumidor cresceu substancialmente menos do que o esperado em fevereiro, mas também a inflação ao produtor piorou bem, principalmente porque os gastos não aumentaram totalmente na reabertura. No caso chinês, diferentemente do Ocidente, inflação fraca é ruim, porque dos chineses esperamos inflação e crescimento econômico.
mais tempo do que o esperado neste ano, o que é um mau presságio para os mercados expostos ao gigante asiático, especialmente os emergentes da região — lembre-se que os dados de quarta-feira também mostraram que a demanda de importação chinesa permaneceu fraca, indicando um nível de atividade global mais arrefecido.
04:12 — Pressentindo uma recessão
Nos EUA, recentemente, tivemos uma leitura abaixo de 50 pontos do medidor de manufatura do Institute for Supply Management. Historicamente, uma queda para baixo de 50 pontos no índice é associada à contração anualizada do produto interno bruto americanos, no caso em questão de 0,3%.
Ao mesmo tempo, o Conference Board disse que seu índice de expectativas do consumidor caiu para 69,7 pontos, sendo que, historicamente, 80 é o nível que sinaliza uma recessão no próximo ano.
Todos esses dados são ruins, mas os dados são confusos, principalmente pelo fato de o mercado de trabalho ainda estar robusto. Tanto é verdade que a estimativa GDPNow do Fed de Atlanta, que leva em consideração inclusive os dados do ISM, mas também o combina com outros dados mais sólidos, estima um crescimento de mais de 2% no primeiro trimestre.
Em outras palavras, apesar de alguns sinais muito negativos e da continuidade do aperto monetário, a recessão ainda não parece tão óbvia.