FEDERAL RESERVE DOS EUA E BANCO CENTRAL DO BRASIL DE MÃOS DADAS
Lá fora, as ações asiáticas caíram nesta terça-feira, arrastadas pelas ações do setor bancário, já que os temores sobre as consequências do colapso do Silicon Valley Bank tomaram conta do mercado, apesar dos esforços do governo dos EUA para estabilizar o sistema financeiro. Os bancos foram o setor mais atingido em toda a região.
O rápido fechamento do Silicon Valley Bank na sexta-feira, seguido pelo Signature Bank dias depois, forçou as autoridades americanas a prometer imediatamente apoio a outros credores e depositantes. Não adiantou. Hoje, os mercados europeus até tentam se recuperar timidamente depois da grande queda de ontem.
Os futuros americanos também sobem nesta manhã, mesmo com os investidores agora preocupados com o fim do SVB e com o desencadear de um colapso mais amplo do setor bancário. No Brasil, reagimos ao humor mais pessimista global, com possibilidade de o evento nos EUA mudar a política monetária brasileira.
A ver…
00:45 — Dá para cair
Por aqui, vemos que a quebra do SVB e do Signature Bank também começaram a mudar as expectativas para os juros locais, para além da política monetária americana. Tudo vai depender dos próximos dias, com a inflação dos EUA hoje e a apresentação do novo arcabouço fiscal ainda nesta semana — hoje, Haddad reúne-se com Alckmin para apresentar proposta. O grande ponto seria o de que uma flexibilização nos EUA daria mais espaço para uma flexibilização no Brasil, ainda que nós tenhamos nossos próprios problemas para lidarmos.
Essa dinâmica possibilitou que o mercado marcasse com maior assertividade a chance de o Comitê de Política Monetária (Copom) reduzir a Selic.
Ainda é difícil que ele já faça o movimento na semana que vem, devendo manter os juros em 13,75% no dia 22 de março, mas o tom pode direcionar para uma queda marginal de 25 pontos em maio, como a curva de juros sugere que cerca de 35% acredita ser o caso.
Até maio, porém, ainda haverá muito ruído e pressão política sobre o BC, como aconteceu entre janeiro e fevereiro. Mais volatilidade poderá entrar no radar.
01:41 — E a inflação?
Os mercados financeiros globais estão esperando pelos dados de inflação de preços ao consumidor de hoje nos EUA, apesar de agora estarem completamente distraídos com as falências dos bancos da semana passada.
Na segunda-feira tivemos um banho de sangue para as ações dos bancos regionais, que são mais dependentes de sua receita líquida de juros em relação às instituições maiores de Wall Street com fontes de receita mais diversificadas. O fundo negociado em bolsa (KRE) do SPDR S&P Regional Banking, para bancos regionais, caiu 10%.
Enquanto isso, os grupos mais sensíveis às taxas de juros terminaram em alta. A causa da disparidade foi um declínio acentuado nos rendimentos dos títulos. Basicamente, a situação do SVB levou o mercado a reavaliar sua previsão coletiva para a próxima decisão de política monetária do Fed, na próxima semana — os investidores veem um Fed menos agressivo como resultado (61% de chances de um aumento de 25 pontos-base, como temos falado que seria mais provável).
O divisor de águas poderá ser verificado hoje, com a divulgação do índice de preços ao consumidor para fevereiro. Espera-se uma alta de 6% na comparação anual, ante 6,4% em janeiro. O núcleo, que exclui os preços voláteis, deve subir 5,5%. Eventuais surpresas terão efeito direto sobre a curva de juros.
02:50 — E os europeus?
No velho continente, os dados do mercado de trabalho do Reino Unido mostraram criação sólida de empregos e taxa de desemprego estável, mas salários médios semanais em desaceleração. Note que, por conta do último item que elenquei, a consequência da atividade no mercado de trabalho pode ser bem mais fraca; afinal, ainda que mostre robustez e características de um mercado “apertado”, o aquecimento não se traduz unilateralmente em crescimento de renda, tirando parte do efeito sobre a inflação.
Pelo menos, ainda na Europa, a inflação espanhola de preços ao consumidor em fevereiro veio abaixo do esperado, ainda que acelerando na margem de 5,9% em janeiro para 6,0%.
Os europeus estão convivendo com a possibilidade de uma nova aceleração de preços, o que seria bem danoso para a atividade, considerando que forçaria o BCE a subir mais os juros, mesmo com a crise dos bancos médios nos EUA perigando ter algumas irmãs na Europa. Algo a se monitorar nas próximas semanas.
03:38 — Encontro de amigos queridos
Ao que tudo indica, o presidente da China, Xi Jinping, planeja fazer uma visita aos russos na próxima semana e se encontrar com o presidente Vladimir Putin. A viagem, que teria sido originada por um convite do presidente russo, ainda não teve dia oficial anunciado, mas gera tensão entre os líderes ocidentais — a viagem teria sido antecipada de abril ou maio. A visita é importante porque será a primeira vez que o líder chinês irá à Rússia desde o início da guerra na Ucrânia.
Com isso, há também a expectativa de que o presidente da China visite outros países europeus na sequência, podendo conversar também com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky — vale lembrar que Lula visitará Xi Jinping na China no final do mês. As tratativas são importantes porque podem abrir mais uma vez o caminho para negociações de paz em uma guerra que já se arrasta há mais de um ano. Entre as propostas atuais de cessar-fogo, temos a chinesa, que deverá ser reaquecida.
04:27 — E como está a guerra?
Bem, depois de mais de um ano de guerra após a invasão da Ucrânia pela Rússia, temos que lidar com duas realidades distintas, porém simultâneas:
i) as forças armadas da Rússia não são fortes o suficiente para conquistar e manter o território ucraniano; mas
ii) são fortes o suficiente para impedir uma vitória completa da Ucrânia.
Em outras palavras, não há final fácil para o impasse no radar, devendo continuar a pressionar os preços da energia e ameaçando novos aumentos nos preços dos alimentos — o acordo para permitir a exportação de grãos pelo Mar Negro expira em 18 de março.
Hoje, a expectativa consensual de uma guerra que dure além de 2023 permitirá que empresas ajustem suas cadeias de abastecimento às novas realidades, façam arranjos alternativos para a diminuição da oferta de petróleo, gás, grãos e outras commodities, e encontrem novos parceiros comerciais.
Sem um desfecho claro, parece que vamos conviver com o conflito assombrando os mercados internacionais por mais tempo, elevando o nível de tensão geopolítica global, cada vez mais impactante sobre os mercados financeiros do mundo todo.