Bolsa abre janela inesperada para ofertas de ações em plena corrida eleitoral
Sinais de recuperação do Ibovespa deixaram o ambiente mais confortável para empresas fazerem ofertas subsequentes na bolsa, apesar da incerteza típica do período pré-eleitoral
Em ano eleitoral, é praticamente regra no mercado financeiro: quanto mais perto da votação, menos chances de alguma empresa se aventurar a captar dinheiro via ofertas de ações na bolsa brasileira. Afinal, ninguém quer se arriscar diante da volatilidade típica do período e fica aquele clima de "quem aproveitou, ótimo. Quem não conseguiu, espera mais".
E, ainda que este ano não tenha acontecido nenhuma oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês), um fato curioso chamou a atenção do mercado nas últimas semanas: as operações de follow-on lançadas por Vamos (VAMO3) e Iguatemi (IGTI11), no que parece ser uma pequena janela de oportunidade incomum nessa época do calendário eleitoral.
Pouco antes, o IRB (IRBR3) também veio a mercado e captou R$ 1,2 bilhão em uma oferta de ações. Nesse caso, porém, trata-se de uma situação bem particular: a empresa de resseguros precisava de qualquer maneira de capital para se reenquadrar nos limites da regulação do setor.
Seja qual for a motivação, o fato é que em 2018, ano da última eleição presidencial, não houve nenhuma emissão de ações na bolsa brasileira nos seis meses que antecederam a votação.
Janela "entreaberta" para ofertas
O que fez, então, as empresas julgarem o atual ambiente propício para captar dinheiro na bolsa em vez de esperar algumas semanas até a definição das eleições? E, mais importante, outras companhias podem aproveitar essa janela “entreaberta” para fazer ofertas de ações?
Embora relevante para o mercado, o cenário eleitoral explica pouco esse movimento, de acordo com os especialistas ouvidos pelo Seu Dinheiro. Ou seja, embora não ajude, a política desta vez pelo menos não atrapalha os planos de quem pretende captar recursos via oferta de ações, já que não há uma expectativa de ruptura, seja quem for o vencedor.
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Nesse meio tempo, outro fator foi ainda mais importante para abrir a janela da bolsa: a alta das ações, que tornou a emissão mais vantajosa para algumas empresas. Basta olhar para o Ibovespa — principal índice da B3 —, que acumula uma valorização de mais de 15% desde as mínimas, em julho.
“As companhias viram uma recuperação no preço das ações e decidiram que o momento era adequado”, disse Roderick Greenlees, global head do banco de investimento no Itaú BBA.
Outro ponto a se destacar é que as empresas que vieram a mercado agora têm histórias muito específicas para contar aos investidores. De qualquer maneira, uma oportunidade inesperada surgiu e o resultado das ofertas que saírem nesse período eleitoral deve servir de termômetro para as operações que surgirem após as eleições.
Iguatemi (IGTI11): oferta de ações para financiar aquisição estratégica
Diante das águas mais calmas do mercado desde meados de julho, a Iguatemi foi uma das companhias que decidiram encarar esse mar. A operadora de shoppings captou R$ 720 milhões em uma oferta de ações para comprar a participação que ainda não detinha no JK Iguatemi.
Neste caso, a Iguatemi aceitou pagar o preço de ver seus acionistas mais diluídos para não aumentar o nível de endividamento diante da necessidade de pagar pela aquisição.
Assim, diante da oportunidade de comprar o JK Iguatemi e sendo uma empresa reconhecida, buscar recursos no mercado fazia todo sentido e indica um movimento que pode ser repetido por outras empresas.
O preço por ação na oferta foi definido em R$ 19,74. O valor representa um desconto de 2,85% em relação ao fechamento de ontem e de 1,3% na comparação com a cotação de quando a companhia anunciou a oferta.
"O movimento já antecipa uma inversão na taxa de juros e inflação mais branda no ano que vem. O investidor já vai estudando os cenários desde já e viabiliza ofertas em alguns setores", diz Teodora Barone, diretora-executiva do UBS BB.
Por que a Vamos (VAMO3) deseja captar até R$ 1 bilhão
Outra empresa que vive uma realidade própria e também decidiu testar as águas para lançar uma oferta de ações foi a Vamos. No dia 12, a empresa de locação de caminhões e máquinas agrícolas anunciou que pretende captar até R$ 1,050 bilhão em dinheiro novo na bolsa.
Ainda que seja um exemplo de sucesso entre as "sobreviventes" da última safra de IPOs da bolsa, a Vamos já não navega sozinha. Responsável por 85% desse segmento, a ameaça da concorrência parece ter acendido um sinal de alerta que motivou a companhia a buscar dinheiro no mercado.
A ideia da Vamos é captar até R$ 1,050 bilhão para investir na ampliação da frota. A definição do valor por ação será conhecida hoje.
Em entrevista recente ao Seu Dinheiro, Gustavo Moscatelli, CFO do Grupo Vamos, não descartou novas aquisições no mercado e, por consequência, negócios capazes de viabilizar algum tipo de operação.
Para alguns gestores, o risco que a Vamos corria ao postergar sua oferta era o de comprometer seu crescimento. Isso porque alguns fatores como a própria eleição, o desconhecimento do plano econômico que entrará em vigor a partir de 2023 e o cenário externo ainda trazem incertezas.
Ou seja, esperar o melhor momento para fazer uma nova oferta de ações poderia custar caro.
Que ofertas de ações vêm por aí
Claro que, diante da pequena janela de oportunidade vista nas últimas semanas, a curiosidade já fica um pouco mais aguçada. Afinal, será que ainda há outras empresas prestes a realizar outras ofertas?
A resposta curta é sim. Para os especialistas, as chances de IPOs ainda neste ano são quase nulas. Porém, alguns follow ons podem estar perto de acontecer, especialmente após a definição de quem será o próximo presidente e seu plano econômico.
“Pode ser antes da conclusão da eleição, seja no primeiro ou no segundo turno, mas digo com segurança: haverá novos follow-ons antes do fim do ano”, afirmou Felipe Thut, diretor do Bradesco BBI.
O gestor de renda variável da Western Asset, Guto Leite, concorda que há boas chances para outras ofertas subsequentes ainda neste ano. Mas ele pondera a necessidade de um ambiente favorável para isso.
"Há algumas condições necessárias, como um mercado mais calmo no exterior e um futuro presidente eleito aqui no Brasil com uma questão fiscal bem desenhada além das promessas de campanha", diz.
O que todos concordam é que a janela deve se manter “entreaberta”. Isso significa que apenas empresas robustas e com histórico comprovado devem encontrar demanda para captar recursos via ofertas de ações.
Candidatas a fazer follow-on
Prova disso são as candidatas citadas por alguns entrevistados para um possível follow-on ainda neste ano: Equatorial (EQTL3) e Energisa (ENGI11), além de companhias dos setores de saneamento e infraestrutura. Todas com geração de caixa previsível e resilientes em períodos de crise por conta do consumo constante.
No caso das companhias de energia, há uma história bastante específica por trás. Isso comprova que não há demanda e dinheiro sobrando, mas sim necessidades distintas entre aquelas que desejam buscar recursos no mercado.
Tanto a Energisa quanto a Equatorial são apontadas como interessadas na compra da distribuidora de energia que está sendo vendida pela italiana Enel em Goiás (GO), a Celg-D.
Estima-se que o negócio seja fechado por aproximadamente R$ 10 bilhões. Mas ainda há algumas dificuldades para a venda do ativo, como a melhora dos índices operacionais da empresa.
Seja como for, o fato é que quem desejar fazer um desembolso deste tamanho muito provavelmente precisará buscar recursos no mercado de capitais.
Procuradas, a Energisa e a Equatorial preferiram não comentar o assunto.
Quanto aos IPOs, especificamente, esta janela deve permanecer fechada por causa do nível de preço das ações, pouco atraente para quem deseja abrir capital.
"Não acredito em IPOs neste momento, se acontecer algum seria exceção, porque ninguém quer se diluir nos preços que o mercado pede hoje. Para isso mudar, a bolsa precisa melhorar um pouco e subir", opina Leonardo Rufino, gestor da Mantaro Capital.
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