Conheça os carros que mais se valorizaram e saiba se vale a pena “investir” em um novo ou usado para surfar a alta de preços
Valorização de alguns modelos chega a quase 60% desde 2020. Mas isso não significa que comprar um veículo seja uma forma de investimento; entenda as razões
Os preços dos carros novos e usados dispararam nos últimos dois anos, a ponto de algumas pessoas começarem a considerar ter um veículo na garagem como forma de investimento. Mas será que comprar um automóvel pode fazer você ganhar dinheiro?
Bem, primeiro vamos falar sobre os fatores que levaram à alta dos preços dos carros.
Em relação aos modelos zero-km, desde o início da pandemia, a valorização do dólar já impactou nos modelos feitos no Brasil — boa parte dos componentes vem de fora ou tem preços baseados na moeda norte-americana.
A seguir vieram desafios de logística e de oferta: falta de insumos (borracha, pneus, plásticos, aço e, sobretudo, semicondutores) que paralisou linhas de produção, aumento dos preços de fretes e escassez de contêineres.
A crise de oferta é mundial, mas o Brasil foi duramente afetado.
De acordo com a Anfavea, a associação que reúne as fabricantes de veículos, os aumentos de preços dos componentes no início de 2021 subiram de forma incontrolável:
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- 61% sobre o aço;
- 68% em resinas e elastômeros;
- 16% em pneus;
- 13% em alumínio;
- 105% no frete aéreo;
- 339% no frete marítimo;
- 170% em contêineres e
- 39% no câmbio do dólar.
De um lado, há uma demanda por carros novos por pessoas físicas. São consumidores que preferiam não ter carro, mas com a pandemia decidiram adquirir um veículo pela segurança nas locomoções, entre outras necessidades.
Mas as empresas também demandaram mais carros, incluindo a troca das frotas de empresas e locadoras. Sem carros novos no volume que seria necessário, as esperas foram se alongando. Dependendo do modelo, as filas vão de três a seis meses.
Em 2021, a recuperação esperada foi atropelada pela crise dos semicondutores. Praticamente todas as montadoras tiveram redução de volume em função da escassez dos microchips.
Escalada de aumentos dos carros
Nesse cenário, os preços dispararam. Em 2020, enquanto o IPCA foi de 4,52%, os preços dos carros novos tiveram aumento médio de 16%.
No ano passado, a média foi de 9%, mas se considerar os carros ano 2021/modelo 2022, a inflação chegou a 18,4% – contra 10,06% do IPCA (2021).
Os dados fazem parte do levantamento do Monitor de Variação de Preços da KBB Brasil, empresa especializada em pesquisa de preços de veículos novos e usados.
Além disso, em falta nas lojas, os carros têm a relação oferta/demanda em desequilíbrio, o que praticamente extingue as promoções.
Para se ter ideia na prática dos aumentos de preços de alguns modelos, listamos os valores de seis entre os mais vendidos no mês anterior à pandemia, em fevereiro de 2020 e comparamos com o atual, em janeiro de 2022.
Para não interferir nos valores, escolhemos carros que são praticamente os mesmos, sem grandes alterações neste intervalo de tempo. A diferença de preços chega a 58%!
Modelo zero-km | Preços em fevereiro 2020 | Preços em janeiro de 2022 | Diferença |
Chevrolet Onix 1.0 Turbo AT | R$ 56.990 | R$ 68.390 | 20% |
Chevrolet Onix Plus 1.0 Turbo AT | R$ 60.090 | R$ 84.620 | 40% |
Hyundai HB20 Sense | R$ 46.490 | R$ 73.490 | 58% |
VW Gol 1.0 | R$ 47.020 | R$ 69.790 | 48,4% |
Toyota Corolla GLi 2.0 | R$ 101.990 | R$ 148.290 | 45,3% |
VW T-Cross Comfortline | R$ 99.990 | R$ 147.350 | 47,3% |
Leia também: Vai comprar carro novo? Antecipamos as principais novidades entre os 48 lançamentos que chegam às lojas em 2022
Carros usados se valorizam em efeito dominó
A falta do carro novo nas concessionárias e os frequentes reajustes das fábricas afetam diretamente o mercado de usados.
Enquanto um veículo seminovo (de 0 a 3 anos) perde após o primeiro ano de 15 a 20% de seu valor, em 2021 eles chegaram a se valorizar em média 17%. Em 2020, essa inflação estava menor: os preços dos seminovos haviam oscilado, em média, 0,93%.
Uma das explicações para essa supervalorização dos seminovos vem da escassez de suas fontes: além das locadoras abastecerem o mercado, as concessionárias, ao venderem o novo, revendem ou repassam ao varejo o modelo que entra na troca.
Sem carros para renovar suas frotas, as locadoras, que em média mantêm os carros por seis meses circulando, estenderam a idade para até dois anos e secaram a fonte dos lojistas. E as autorizadas, sem oferta de novos, têm dificuldades de repassar os seminovos ao mercado.
Mas são os carros mais usados, de 4 a 10 anos, que tiveram a maior diferença de preços entre 2020 e 2021.
Em média, os valores destes veículos subiram 22,46% entre janeiro e dezembro do ano passado, enquanto que em 2020 o comportamento de preço acumulado desta categoria teve queda de 0,85%, em média.
Carro é investimento?
Esse fenômeno de preços chama a atenção e faz muita gente avaliar se vale a pena comprar um carro hoje como “investimento”, para revendê-lo em um futuro próximo e faturar um bom rendimento sobre essa venda.
Pelo menos no ano passado, quem fez isso provavelmente conseguiu ter um ganho maior do que se tivesse deixado o dinheiro em renda fixa ou na bolsa.
Mas a realidade para quem acredita que o carro pode ser investimento é bem mais complexa.
O carro novo é o mais arriscado em relação às perdas. Assim que as vendas normalizarem e as filas reduzirem, um modelo com poucos meses de uso tende a depreciar mais.
Em tempos “normais”, conforme o modelo, essa depreciação pode variar de 10 a 20% no primeiro ano.
Além do custo de oportunidade, deve-se levar em conta o IPVA (varia conforme o Estado, em São Paulo a maioria paga 4%), a documentação (de R$ 100 a R$ 200) e para os mais cautelosos, o seguro.
Um homem, por exemplo, paga em média R$ 2 mil por ano para um Onix e uma mulher, R$ 1.800.
Na revenda, o proprietário também precisa informar à Receita Federal sobre os valores e qualquer diferença (lucro) entra na mira do Leão do Imposto de Renda. Veja abaixo um exemplo das contas que você deve fazer:
Custos estimados para manter um Onix 1.0 turbo novo:
Preço do carro: R$ 68.390
IPVA + documentação: R$ 3.000 por ano
Seguro: R$ 2.000 por ano
Revisão de primeiro ano: R$ 400}
Cada tanque cheio: R$ 300 a cada 500 km ou um tanque por mês sai a R$ 3.600
-----------------------------------------------
Soma de gastos em um ano: R$ 9.000
Depreciação de -16% (baseado em levantamento da KBB com um ano de uso 21/20): R$ 11.000
Total após 1 ano: R$ 48.390 (-29%)
Seminovo pode ser melhor negócio
A compra de um carro não deve ser encarada como investimento. Até porque, ao que tudo indica, o auge da crise de oferta já passou.
Além disso, repassar um carro requer conhecimento de mercado e, às vezes, a ajuda de um profissional para a revenda, serviço que também será cobrado como comissão ou custo fixo.
Mas se você deseja ter um carro e coloca o fator financeiro no topo das prioridades, comprar um seminovo pode ser melhor negócio do que sair da concessionária com um carro zero.
Entre os seminovos, os de melhor apelo e liquidez atualmente são SUVs e picapes. O problema é que agora eles estão muito caros.
Se você tem um na garagem e usa pouco, está na hora de vender. Se for comprar, precisa ser um excelente negócio para valer a pena.
Lembre-se: carro só é ativo para quem “investe” em um negócio de transporte (aluguel, serviços de frete, etc.) ou para quem opera profissionalmente na intermediação de veículos (compra por um preço abaixo do mercado e revende com lucro).
Leia também: Do Ônix ao Corolla, conheça os carros mais econômicos do mercado para todos os preços
Tendência é de normalização e queda de preços
Avaliando o cerne da crise, a falta de semicondutores tende a estabilizar em meados deste ano, reduzindo a falta de oferta e devolvendo ao consumidor prazos menores para receber um veículo novo. Se esse movimento realmente caminhar, os seminovos voltam a abastecer o mercado e a inflação automotiva, pelo menos entre os usados, cai.
Alguns especialistas do mercado mais otimistas acreditam que enquanto o emplacamento dos novos recuperará o fôlego, as vendas dos usados devem seguir um ritmo mais comedido em 2022.
Para a Anfavea, a expectativa nas vendas de novos é de crescimento de 8,5% enquanto a Fenabrave, que representa as concessionárias, projeta alta de 5,2%.
A sinalização do mercado é que a inflação dos veículos deve, de fato, arrefecer. Ou seja, só compre um carro se for realmente necessário ou aplique seu dinheiro em algo que não vá lhe trazer tantas despesas.
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