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Julia Wiltgen
Julia Wiltgen
Jornalista formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) com pós-graduação em Finanças Corporativas e Investment Banking pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Trabalhou com produção de reportagem na TV Globo e foi editora de finanças pessoais de Exame.com, na Editora Abril.
ESG

Vale a pena entrar no IPO da Raízen? O que você precisa saber sobre aquela que pode ser a maior estreia do ano

Período de reserva das ações da produtora de açúcar e álcool e dona dos postos Shell vai até segunda-feira, 2 de agosto; abertura de capital pode movimentar até R$ 10 bilhões

Julia Wiltgen
Julia Wiltgen
29 de julho de 2021
5:30 - atualizado às 17:31
Caminhão da Raízen
Caminhão da Raízen. - Imagem: Divulgação

Está em curso na B3 um dos IPOs brasileiros mais quentes do ano, a oferta pública inicial de ações da Raízen. O período de reserva para quem quiser entrar na oferta começou no último dia 21 e vai até 2 de agosto, próxima segunda-feira.

A joint venture entre Cosan e Shell, voltada para a produção de açúcar e etanol e na distribuição de combustíveis, é uma das maiores empresas do país em faturamento e pode movimentar até R$ 10,5 bilhões na sua abertura de capital, protagonizando talvez o maior IPO da bolsa brasileira de 2021.

Mas não é apenas o tamanho da empresa ou da oferta que chama atenção. A Raízen, assim como sua holding Cosan, é uma empresa extremamente bem vista por investidores e analistas, não só pelo bom desempenho dos seus negócios, como pelo fato de estar absolutamente sintonizada com uma das grandes pautas do presente e do futuro: a sustentabilidade ambiental.

Estamos falando de um negócio que pode vir a atender perfeitamente aos anseios dos investidores que priorizam as questões ESG na sua carteira - sigla em inglês para as boas práticas ambientais (environmental), sociais (social) e de governança (governance).

Mas, como bem sabemos, tudo tem um preço. Será que vale a pena, para a pessoa física, entrar no IPO da Raízen? Se você está avaliando a questão e ainda não bateu o martelo, veja a seguir o que você precisa saber sobre a empresa e a oferta para tomar sua decisão.

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Quem é a Raízen?

A Raízen foi constituída em 2011 como uma joint venture entre a Cosan, holding brasileira com atuação nos setores de energia, açúcar e etanol e logística, e a petroleira anglo-holandesa Shell.

A companhia atua em basicamente duas grandes áreas: produção de açúcar e etanol, tanto para consumo interno em combustíveis, como para uso na indústria e exportação; e distribuição de combustíveis no varejo, por meio dos postos com a bandeira Shell.

A parte de distribuição é uma linha de negócio mais tradicional, em que ocorre a venda também de combustíveis fósseis.

A porção do negócio realmente voltada para a sustentabilidade e que chama atenção no IPO é a parte de açúcar e álcool, onde a Raízen atua desde o plantio da cana até a comercialização, inclusive aproveitando seus próprios resíduos como insumos para outros produtos.

A empresa se diz líder mundial na produção de biocombustíveis, o que inclui etanol de primeira e segunda geração, este último sendo produzido a partir do bagaço da cana de açúcar. Também produz biogás, energia renovável de cogeração do bagaço da cana, entre outros produtos.

A Raízen tem capacidade de moagem de 73 milhões de toneladas de cana, e no exercício social encerrado em 31 de março de 2021, processou 62 milhões de toneladas, produzindo 2,5 bilhões de litros de etanol (maior produção de etanol de cana do mundo) e gerando 2,0 TWh de eletricidade a partir do processo de cogeração da biomassa, o suficiente para abastecer uma cidade como o Rio de Janeiro por um ano.

Segundo o prospecto do IPO, a Raízen é a maior empresa de etanol de cana e o maior produtor de açúcar do mundo, com mais de 11,7 bilhões de litros de álcool comercializados e uma produção de açúcar de 4,3 milhões de toneladas no exercício social encerrado em 31 de março de 2021.

A receita operacional líquida da companhia, no período, totalizou R$ 114,6 bilhões, o que a posiciona entre as cinco maiores empresas do Brasil em faturamento. No mesmo exercício, seu lucro líquido totalizou R$ 1,5 bilhão, e o Ebitda ajustado (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) foi de R$ 6,6 bilhões.

Embora a Raízen esteja se destacando antes mesmo de sua entrada na bolsa, existem outras cinco ações com potencial de se valorizar e turbinar sua carteira de investimentos. Fazemos uma análise delas no nosso canal no YouTube. Confira:

Por que a Raízen está fazendo IPO

Segundo o prospecto da sua oferta inicial, a Raízen pretende utilizar os recursos captados para três objetivos principais:

  • Construção de novas plantas para expandir a produção de renováveis e a capacidade de comercialização da companhia (80% dos recursos captados);
  • Investimentos em eficiência e produtividade nos parques de Bioenergia da companhia, para o crescimento da produção de açúcar e álcool (5% dos recursos captados);
  • E investimentos em infraestrutura de armazenagem e logística para suportar o crescimento de volume comercializado de renováveis e açúcar (15% dos recursos captados).

Apesar de o negócio de distribuição responder hoje por cerca de 80% da receita da Raízen, o objetivo do IPO é captar recursos para investir principalmente nos negócios de açúcar e combustíveis renováveis.

É isso que chama a atenção dos investidores que priorizam as pautas ESG, notadamente os estrangeiros: não tanto o que já gera resultado para a Raízen hoje, mas o que pode vir a gerar no futuro.

O grande destaque dos planos da companhia é o tal do etanol de segunda geração, produzido a partir do bagaço da cana de açúcar, e não do melaço, como o de primeira geração.

Além de não concorrer com a produção de alimentos, por ser feito a partir de resíduos, esse tipo de combustível consegue ser menos poluente do que o próprio etanol de primeira geração.

Segundo a Raízen, seu etanol de primeira geração produz quase cinco vezes menos emissões de CO2 que a gasolina nos Estados Unidos, enquanto as emissões do etanol de segunda geração são quase sete vezes menores.

O etanol de segunda geração também é mais caro no mercado internacional, apresentando um prêmio de 70% em relação ao de primeira geração. Basicamente, grandes empresas que utilizam o álcool na sua cadeia produtiva estão dispostas a pagar um preço maior pela pegada de carbono menor.

Hoje, a Raízen tem apenas uma planta de produção de etanol de segunda geração, a maior do mundo em escala comercial, segundo a empresa. Mas seu plano é ter 20 plantas dessas em 2031, chegando a 25 no longo prazo, além de licenciar sua tecnologia de produção do etanol de segunda geração para outros países.

A companhia diz ser capaz de aumentar sua produção de etanol em até 50% utilizando a mesma área de cultivo. Com a biomassa que produz hoje, pode atingir uma produção de 2 bilhões de litros, o que, segundo a empresa, “demonstra o expressivo potencial de crescimento desse produto”.

Outro destaque é a produção de biogás, também feita a partir de resíduos da cana. O produto pode ser utilizado para geração de energia elétrica e até para substituir o diesel em veículos pesados.

A Raízen também diz ser possível produzir 50% mais energia elétrica com a mesma área plantada a partir do desenvolvimento do biogás. A ideia da companhia é atingir 39 plantas operacionais até 2031 e até 64 no longo prazo.

O passo a passo do IPO

O IPO da Raízen consistirá em uma oferta 100% primária, em que todos os recursos captados irão para o caixa da empresa, mediante a emissão, inicialmente, de 810.811.000 ações. Pode ainda haver a colocação de um lote adicional de 162.162.200 papéis e um suplementar de 121.621.650 papéis.

A faixa indicativa de preço por ação vai de R$ 7,40 a R$ 9,60, o que significa que a empresa pode captar entre R$ 6 bilhões e R$ 7,8 bilhões apenas com a oferta base. Se colocados todos os lotes extras de ações e considerado o preço no topo da faixa indicativa, o IPO pode movimentar até R$ 10,5 bilhões.

Ou seja, a companhia chegará à bolsa com um valor de mercado entre R$ 73 bilhões e R$ 95 bilhões - R$ 98 bilhões se o preço sair no topo da faixa indicativa e forem colocados todos os lotes extras.

A oferta tem como coordenador-líder o BTG Pactual e como demais coordenadores os bancos Citigroup, Bank of America, Credit Suisse, Bradesco BBI, J.P. Morgan, Santander, XP Investimentos, HSBC, Safra e Scotiabank.

O período de reserva das ações, como já foi dito, vai até a próxima segunda, dia 2 de agosto. Isso significa que os interessados em participar do IPO precisam entrar em contato com as corretoras de valores das quais são clientes e reservar seus papéis pelo preço desejado até esta data.

Para as pessoas físicas, o investimento mínimo é de R$ 3 mil, e o máximo é de R$ 1 milhão. No dia 3 será divulgado o preço da ação, e a negociação dos papéis na B3, sob o código RAIZ4, começa no dia 5 de agosto.

Governança e composição acionária

Shell e Cosan são detentoras de fatias iguais da Raízen e assim permanecerão após o IPO. Hoje, cada uma é dona de 50% das ações ordinárias e preferenciais da joint venture.

Após a emissão das novas ações PN, suas participações no capital da empresa cairão para 45,92% para cada uma (44,64% se forem colocados os lotes adicional e suplementar). Ou seja, as ações em circulação representarão apenas 8,17% do capital social (10,72% se forem colocados os lotes adicional e suplementar).

A ação da Raízen será listada no Nível 2 de governança da B3, o mais elevado depois do Novo Mercado. A única diferença entre os dois, inclusive, é o fato de que o Nível 2 permite a existência de ações preferenciais, aquelas que em geral não têm direito a voto, enquanto o Novo Mercado só permite a existência de ações ordinárias, com direito a voto.

Mesmo assim, no Nível 2 as ações preferenciais têm garantido o seu direito de tag along de 100% do preço pago pelas ações ordinárias do controlador no caso de venda do controle da empresa, além de darem direito a voto em situações críticas, como a aprovação de fusões e aquisições e contratos entre o acionista controlador e a companhia, sempre que essas decisões estiverem sujeitas a aprovação em assembleia de acionistas.

No vídeo a seguir, eu falo mais sobre as características do Novo Mercado e os demais níveis de governança da B3. Assista:

E então, vale a pena entrar no IPO da Raízen?

Eu conversei com alguns gestores de ações e tive acesso a relatórios de analistas que se debruçaram sobre o IPO de Raízen, e todos veem a empresa e a operação com muito bons olhos.

É unânime a opinião de que Raízen, assim como Cosan no geral, é muito bem gerida e que, nos últimos anos, o grupo atingiu altos patamares de governança e boa relação com o mercado.

“A Cosan vem gerando muito valor, em todas as suas subsidiárias. É impressionante como os gestores são ótimos alocadores de capital e executores”, observa Edoardo Biancheri, gestor de renda variável na Garde Asset Management.

Aliás, apesar de ter havido críticas no mercado quanto ao fato de as ações não estarem sendo listadas no Novo Mercado, ninguém com quem eu conversei viu isso como um problema.

“Eu sempre prefiro as ações da mesma classe que aquelas que os controladores detêm. Mas o Nível 2 já garante um patamar bem alto de governança, com diversas garantias”, diz Luiz Cesta, analista da Monett, plataforma de streaming sobre investimentos.

Todos também destacam o grande potencial de a companhia se tornar um importante ativo ESG globalmente. Isto é, deve chamar atenção inclusive - e talvez principalmente - dos investidores estrangeiros. Assim, o IPO deve atrair os gringos, notadamente os europeus.

“A empresa está caminhando efetivamente no sentido da descarbonização. Está muito à frente de vários outros players, não apenas brasileiros, mas também do exterior”, diz Carolina Ujikawa, gestora da Mauá Capital.

Então, que a Raízen é uma boa empresa com excelentes perspectivas, disso ninguém tem dúvida. Vale a pena, para a pessoa física, entrar no IPO? A opinião geral é de que sim, vale. No máximo pode haver uma discordância quanto ao preço - há quem defenda que talvez só seja interessante entrar até o meio da faixa indicativa, enquanto outros não fazem essa restrição.

Surge o questionamento, porém, se não valeria mais a pena comprar Cosan (CSAN3) para surfar sua valorização em bolsa com a melhor precificação de Raízen.

De fato, esse é um fenômeno bastante comum em holdings: quando uma de suas subsidiárias abre capital, ela acaba sendo avaliada por um valor maior do que o que tinha enquanto empresa fechada dentro da holding.

Consequentemente, o IPO da subsidiária acaba obrigando o mercado a reprecificar a holding, num fenômeno que se convencionou chamar de “destravar valor”.

A visão geral é de que isso deve ocorrer com Cosan. Felipe Miranda, sócio-fundador e CIO da Empiricus, é um dos grandes defensores dessa tese já há algum tempo, e chega a ver um potencial de valorização de 40% para os papéis da Cosan. Ele inclusive explica a questão em detalhes no vídeo a seguir. Confira:

Mas também não precisa ser uma questão de “ou”, pode ser uma questão de “e”. Mesmo quem defende que Cosan pode estar mais atrativa que Raízen não descarta entrar no IPO desta última - ou entrar mais para frente - ao mesmo tempo em que se compra ou se aumenta posição em Cosan.

A própria Empiricus recomenda a entrada no IPO de Raízen. E o fundo agro da Vitreo, que segue as recomendações da casa, é um exemplo de veículo que já tinha Cosan e pretende também ter Raízen. “É uma questão de contexto. É um fundo de agro, voltado para o longo prazo. Então tem espaço para as duas”, diz o gestor Rodrigo Knudsen.

A analista da Empiricus, Larissa Quaresma, inclusive fala sobre a sua visão para Raízen no vídeo a seguir, que ela gravou especialmente para o Seu Dinheiro. Ela acredita que os papéis têm um potencial de alta de mais de 50% após o IPO. Assista abaixo e aproveite para se inscrever no nosso canal do YouTube:

O investidor só precisa ter em mente que os planos da Raízen a serem impulsionados com este IPO são projetos de longo prazo e alto risco de execução, sem garantias de que irão funcionar, mas uma boa probabilidade de sucesso, tendo em vista as pessoas no comando.

Mas o investimento na empresa é, de fato, um investimento no futuro - o retorno não é para já, mas para algo como os próximos dez anos.

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