🔴 QUER INVESTIR NAS MELHORES CRIPTOMOEDAS DO MOMENTO? SAIBA COMO CLICANDO AQUI

Panela velha é que faz comida boa?

Não há aqui uma sabedoria popular formidável para o momento? Deveríamos comprar a “nova economia” ou nos voltarmos às commodities e bancos?

13 de janeiro de 2021
15:06
Imagem: Shutterstock

“Que saudade imensa do campo e do mato
Do manso regato que corta as campinas
Aos domingos ia passear de canoa
Das lindas lagoas de águas cristalinas
Que doce lembrança daquela festança
Onde tinha danças e lindas meninas
Eu vivo hoje em dia sem ter alegria
O mundo judia, mas também ensina
Estou contrariado, mas não derrotado
Eu sou bem guiado pelas mãos divinas.”

Belmonte

Estou com saudades de Senhora do Porto, interior de Minas Gerais. A turma na Faria Lima acha que interior é Ribeirão Preto, Campinas, São José do Rio Preto. Na Vila Madalena, o pessoal pensa que é Jalapão, Chapada dos Veadeiros, Bonito, e por aí vai. Nada contra esses lugares. Ao contrário, acho ótimos, mas não são aquilo a que me refiro quando falo de “interior”.

Chão batido, curral em que você entra tentando desviar, muitas vezes sem sucesso, das bostas de boi, porteira, fogão a lenha, porta cuja tranca se dá por meio de um pedaço de madeira grosso atravessado na perpendicular. Campo de futebol no meio do pasto — e também com bosta de boi; você escolhe em que posição vai jogar baseado na distribuição das fezes dos animais. 

“Hoje eu vou na ponta esquerda.” 
“Mas você é destro, Felipe. Nunca jogou na ponta esquerda.”
“Você que não está me acompanhando… sou bom em cortar pra dentro e entrar no facão, estilo Messi, só que do outro lado.”
(rsrsrsrs)

Por conta da pandemia, fiquei sem essas coisas neste ano. Não sei se é muito bem verdade, mas as notícias que chegam — provavelmente com algum exagero, mas quem topa o risco? — apontam para uma situação meio ruim em Guanhães. “Lipe, mas nem podia ser diferente. Lá, ninguém usa máscara, não respeita isolamento social, fica se abraçando. Claro que ia dar nisso.”

Talvez até pudéssemos ir, com os devidos cuidados; de carro quem sabe… mas com a Maria tão pequena… Não sei se fizemos certo, mas preferimos ficar, sob os protestos típicos da família: “Você não liga mais pra gente…”.

Leia Também

Mal sabem eles o quanto me faz mal não ir visitá-los.

Sou formalmente paulistano, nascido e criado na Zona Oeste, entre Sumarezinho, Vila Madalena, Pinheiros e Cerqueira César, muito influenciado por isso. Ao mesmo tempo, ter passado boa parte das férias da infância e da adolescência em Senhora do Porto também fez parte da minha constituição. Essa ambivalência tão gritante entre um mundo cosmopolita, moderno, urbano, e outro rural, bucólico, pouco integrado à tecnologia de ponta, representa a coexistência interna de vários elementos simultâneos.

Até mesmo a formação musical oferecia mundos antagônicos, tipicamente percebidos como imiscíveis. Íamos de Cometa, saindo de São Paulo para Belo Horizonte, ouvindo Be Quick or Be Dead, para sermos recebidos na praça central, do lado do coreto e onde fica hoje o bar do meu tio Dacinho, perto da escola municipal, com “O Menino da Porteira”.

As minhas ambivalências também se verificam na formação intelectual. Sempre fui muito estudioso, debruçado sobre as teorias acadêmicas da fronteira do conhecimento. Ao mesmo tempo, sem nenhum demérito aos livros e aos journals, mantive comigo a crença de que muito conhecimento emanava da rua, da sabedoria popular, da vivência propriamente dita. Curiosamente, encontrei no Sidarta, de Hermann Hesse, um símbolo da educação clássica literária formal, uma lição importante. Nada pode substituir a experiência vivida.

Ontem à noite, assisti a um vídeo de família antigo. Um dos meus tios, completamente embriagado (nenhuma novidade), cantava: “Tô de namoro com uma moça solteirona; A bonitona quer ser a minha patroa; Os meus parentes já estão me criticando; Estão falando que ela é muito coroa; Ela é madura, já tem mais de trinta anos; Mas para mim o que importa é a pessoa; Não interessa se ela é coroa; Panela velha é que faz comida boa; Não interessa se ela é coroa; Panela velha é que faz comida boa”.

Não há aqui uma sabedoria popular formidável para o momento? Deveríamos nós comprar a “nova economia” ou nos voltarmos às commodities e aos bancos?

Nos primeiros dias de 2021, com a tal “onda azul” nos EUA, houve um movimento intenso em prol de migração em direção às “panelas velhas”, cuja comida seguiria muito boa, diante de valuations convidativos, de mais gastos fiscais que ensejassem matérias-primas mais caras, pressão para cima sobre as taxas de juro de mercado e dólar mais caro. O interesse na tecnologia e nos cases de crescimento teria diminuído, por conta do medo da regulação e de mais impostos do Partido Democrata e dos efeitos dos juros de mercado sobre as taxas de desconto, afetando dramaticamente casos de growth.

Na sexta-feira passada e ontem, porém, o movimento foi justamente o contrário. Sob o FOMO, o medo de ficar de fora, muitos abandonaram suas teses de investimento preferidas e foram comprar bancos e commodities. Muitos quebraram a cara, ao menos momentaneamente. Nada pior do que o overtrading, uma corrida atrás do rabo, em que você decide ir para um momentum trade e, então, descobre que o momento acabou, da forma mais dura, perdendo dinheiro.

O que fazer agora?

No já clássico How George Soros Knows What He Knows, a brasileira Flávia Cymbalista aponta que o megainvestidor somatiza o descontentamento com suas posições. Sente dor nas costas quando seu portfólio está desbalanceado e há nele algum erro. Não há nada de sobrenatural ali. É apenas a intuição, uma capacidade não estruturada de reconhecer padrões tacitamente, apontando algum desconforto.

Passo longe, bem longe mesmo, de ser George Soros. Não tenho dor nas costas, nem seus bilhões. Mas também somatizo bastante as coisas. Durmo especialmente mal quando estou preocupado e, em momentos mais agudos de estresse, tenho dor de garganta e febre.

Sempre que acordo, pego o celular e checo os mercados. Instintivamente, procuro o comportamento da variável que mais tem me preocupado naquele momento — fui perceber isso só recentemente. Nos últimos dias, minha primeira página tem sido o yield do Treasury de dez anos. É esse cara, para mim, que tem ditado o fluxo do capital em âmbito global.

Sob a expectativa de retomada da economia e pacotes fiscais gordos, com potenciais implicações para a inflação, ele tem subido neste ano, influenciando as taxas de juro de mercado pelo mundo e os valuations de nomes associados a crescimento, ao mesmo tempo em que desperta o interesse por bancos e commodities.

Há espaço para continuidade do movimento?

Em condições normais de temperatura e pressão, entendo que sim. Parece razoável supor a caminhada em direção a um yield de 1,25% para o Treasury de dez anos. Seria uma simples volta a uma mínima normalidade pós-pandemia, com um quadro fiscal mais deteriorado.

A partir daí, acho mais difíceis novas altas. Claro que pode haver algum overshooting de curto prazo, mas que tenderia a ser corrigido depois. A vitória democrata no Congresso americano é muito apertada, de modo que fica difícil a negociação de pacotes fiscais tão amplos. O problema mundial, há dez anos, é de baixo crescimento e baixa inflação — até há pouco tempo, discutíamos a “japonização do mundo”. Isso se deve a fatores seculares, como tecnologia e demografia, que não vão mudar; ao contrário, se intensificam a cada momento. Existe ainda um problema prático de que, sob o tamanho das dívidas soberanas e corporativas, uma subida rápida e intensa dos yields quebraria o mundo — uma coisa é dever 120% do PIB com juro zerado, outra coisa é ter a mesma dívida com juros de 4%. Seria razoável supor que os bancos centrais voltariam a atuar de forma mais pesada se os rendimentos dos títulos subissem de maneira vertiginosa.

Aponto ainda um fator de risco adicional. Talvez seja até mais uma elucubração. Possivelmente os três leitores tenham visto a China impondo lockdowns bastante restritivos a algumas províncias. E também os recordes dos preços da soja e do milho (o que pode ser bem ruim para frigoríficos); o minério de ferro e o aço sobem vertiginosamente. Então, me vem à cabeça que a China, de onde temos poucas informações confiáveis, pode estar estocando tudo que pode, de tudo, para se proteger de um eventual fechamento mais destacado de sua economia em meio à escalada de casos de coronavírus.

Em sendo o caso, poderíamos incorrer num susto súbito com preços de commodities, para uma posterior retomada.

Dito isso, parece razoável ter, sim, exposição a alguns nomes de commodities, mas eu focaria em nomes depreciados frente aos pares internacionais, menos alavancados e com menor custo marginal de produção — se você pensou em Vale, estamos na mesma página.

Ao mesmo tempo, manteria a confiança nas teses seculares de tecnologia, e-commerce, omnichannel, etc. 

Se a tendência agora fosse em favor dos nomes da velha economia, ela seria a nova, e a nova seria a velha. A linha do tempo só caminha em uma direção.

A sabedoria popular prescreve: “Bezerro bom não berra”. Não há razão para reclamar depois que aconteceu.

COMPARTILHAR

Whatsapp Linkedin Telegram
EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: As expectativas de conflação estão desancoradas

19 de março de 2025 - 20:00

A principal dificuldade epistemológica de se tentar adiantar os próximos passos do mercado financeiro não se limita à já (quase impossível) tarefa de adivinhar o que está por vir

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: Vale a pena investir em ações no Brasil?

17 de março de 2025 - 20:00

Dado que a renda variável carrega, ao menos a princípio, mais risco do que a renda fixa, para se justificar o investimento em ações, elas precisariam pagar mais nessa comparação

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Para um período de transição, até que está durando bastante

12 de março de 2025 - 19:58

Ainda que a maior parte de Wall Street continue sendo pró Trump, há um problema de ordem semântica no “período de transição”: seu falsacionismo não é nada trivial

EXILE ON WALL STREET

Tony Volpon: As três surpresas de Donald Trump

10 de março de 2025 - 20:00

Quem estudou seu primeiro governo ou analisou seu discurso de campanha não foi muito eficiente em prever o que ele faria no cargo, em pelo menos três dimensões relevantes

VISÃO 360

Dinheiro é assunto de mulher? A independência feminina depende disso

9 de março de 2025 - 7:50

O primeiro passo para investir com inteligência é justamente buscar informação. Nesse sentido, é essencial quebrar paradigmas sociais e colocar na cabeça de mulheres de todas as idades, casadas, solteiras, viúvas ou divorciadas, que dinheiro é assunto delas.

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Na esperança de marcar o 2º gol antes do 1º

5 de março de 2025 - 20:01

Se você abre os jornais, encontra manchetes diárias sobre os ataques de Donald Trump contra a China e contra a Europa, seja por meio de tarifas ou de afrontas a acordos prévios de cooperação

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Um Brasil na mira de Trump

26 de fevereiro de 2025 - 20:00

Temos razões para crer que o Governo brasileiro está prestes a receber um recado mais contundente de Donald Trump

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Eu gostaria de arriscar um palpite irresponsável

19 de fevereiro de 2025 - 20:01

Vai demorar para termos certeza de que o último período de mazelas foi superado; quando soubermos, porém, não restará mais tanto dinheiro bom na mesa

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Tenha muito do óbvio, e um pouco do não óbvio

12 de fevereiro de 2025 - 20:00

Em um histórico dos últimos cinco anos, estamos simplesmente no patamar mais barato da relação entre preço e valor patrimonial para fundos imobiliários com mandatos de FoFs e Multiestratégias

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: Isso não é 2015, nem 1808

10 de fevereiro de 2025 - 20:00

A economia brasileira cresce acima de seu potencial. Se a procura por camisetas sobe e a oferta não acompanha, o preço das camisetas se eleva ou passamos a importar mais. Não há milagre da multiplicação das camisetas.

EXILE ON WALL STREET

Tony Volpon: O paradoxo DeepSeek

3 de fevereiro de 2025 - 20:01

Se uma relativamente pequena empresa chinesa pode desafiar as grandes empresas do setor, isso será muito bom para todos – mesmo se isso acabar impactando negativamente a precificação das atuais gigantes do setor

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: IPCA 2025 — tem gosto de catch up ou de ketchup mais caro?

29 de janeiro de 2025 - 20:31

Se Lula estivesse universalmente preocupado com os gastos fiscais e o descontrole do IPCA desde o início do seu mandato, provavelmente não teria que gastar tanta energia agora com essas crises particulares

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Um ano mais fácil (de analisar) à frente

18 de dezembro de 2024 - 20:00

Não restam esperanças domésticas para 2025 – e é justamente essa ausência que o torna um ano bem mais fácil de analisar

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Às vésperas da dominância fiscal

11 de dezembro de 2024 - 15:00

Até mesmo os principais especialistas em macro brasileira são incapazes de chegar a um consenso sobre se estamos ou não em dominância fiscal, embora praticamente todos concordem que a política monetária perdeu eficácia, na margem

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Precisamos sobre viver o “modo sobrevivência”

4 de dezembro de 2024 - 20:00

Não me parece que o modo sobrevivência seja a melhor postura a se adotar agora, já que ela pode assumir contornos excessivamente conservadores

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Banda fiscal no centro do palco é sinal de que o show começou

27 de novembro de 2024 - 16:01

Sequestrada pela política fiscal, nossa política monetária desenvolveu laços emocionais profundos com seus captores, e acabou por assimilar e reproduzir alguns de seus traços mais viciosos

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: O Brasil (ainda não) voltou — mas isso vai acontecer

18 de novembro de 2024 - 20:00

Depois de anos alijados do interesse da comunidade internacional, voltamos a ser destaque na imprensa especializada. Para o lado negativo, claro

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: Não estamos no México, nem no Dilma 2

7 de outubro de 2024 - 20:00

Embora algumas analogias de fato possam ser feitas, sobretudo porque a direção guarda alguma semelhança, a comparação parece bastante imprecisa

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Brasil com grau de investimento: falta apenas um passo, mas não qualquer passo

2 de outubro de 2024 - 14:40

A Moody’s deixa bem claro qual é o passo que precisamos satisfazer para o Brasil retomar o grau de investimento: responsabilidade fiscal

EXILE ON WALL STREET

Tony Volpon: O improvável milagre do pouso suave americano

30 de setembro de 2024 - 20:03

Powell vendeu ao mercado um belo sonho de um pouso suave perfeito. Temos que estar cientes que é isso que os mercados hoje precificam, sem muito espaço para errar.

Menu

Usamos cookies para guardar estatísticas de visitas, personalizar anúncios e melhorar sua experiência de navegação. Ao continuar, você concorda com nossas políticas de cookies

Fechar