🔴 QUER INVESTIR NAS MELHORES CRIPTOMOEDAS DO MOMENTO? SAIBA COMO CLICANDO AQUI

Compulsão à repetição do investidor: além do princípio do prazer

15 de junho de 2021
11:24 - atualizado às 11:30
Trader
Imagem: Shutterstock

Ana Clara teve um pai machista e opressor. Ressentia-se daquilo. A perda da liberdade na adolescência até o início da fase adulta a forçou a sair de casa cedo. Sentia-se angustiada, cuja etimologia vem de constrição, falta de ar, sufoco. Sonhava com a possibilidade de formar uma família mais arejada, liberal e afetuosa.

Era bonita e inteligente. Não teve dificuldades para encontrar namorados legais, divertidos e igualmente bonitos e inteligentes. Terminou com todos. Acabou casando com um bronco, depois de sucessivas depressões catalisadas pelos rompimentos e por incursões em aventuras homossexuais malsucedidas. A verdade é que ela, sem perceber, não tolerava a liberdade. Seu inconsciente a empurrava para a mesma situação da infância. Reproduzia o fenômeno da infância, como se pretendesse preencher, de maneira não deliberada, alguma lacuna dos primeiros anos de vida.

José nasceu em berço de ouro. Seu pai era um grande empresário, muito bem relacionado e com uma intuição apurada. A firma da família acabara se envolvendo num grave escândalo de corrupção. Parte dos diretores da companhia acabou presa. Por lealdade de Severo, o patriarca foi preservado do cárcere, embora tenha terminado enjaulado no próprio labirinto mental. Jamais se perdoaria pela destruição financeira e, simultaneamente, afetiva do seio familiar. 

Como primogênito, José foi quem mais vivenciou as mazelas decorrentes da falta de dinheiro. Percebia a deterioração patrimonial a partir da qualidade do guardanapo que repousava sobre a mesa ao lado dos talheres — o novo tipo de papel se desfazia no encontro com a boca.

Prometeu a si mesmo que reconstruiria o patrimônio familiar. Se o pai viera do zero e ficara rico, ele também poderia fazê-lo, sem, no entanto, incorrer no mesmo erro. Se conseguisse subir na vida, jamais se envolveria com empresas estatais e teria educação financeira suficiente para desviar de possíveis surpresas inerentes aos ciclos econômicos. Conseguiu a primeira parte da promessa autoproclamada. Perdeu seus R$ 10 milhões quando a crise da Covid obrigou o fechamento de sua rede de restaurantes self-service. É difícil vacinar-se contra si mesmo.

“What you fear the most could meet you half way”, nos lembra Eddie Vedder. Aquilo que mais tememos pode nos encontrar bem no meio da estrada. Mais do que isso, sem querer, nós mesmos acabamos caminhando em direção aos fantasmas do passado. 

Leia Também

A compulsão à repetição é originalmente postulada por Freud em 1914, em “Recordar, repetir e elaborar”, para depois ser mais bem desenvolvida em “Além do princípio de prazer”, de 1920. 

Ela aparece muito frequentemente quando se fala da toxicomania. O vício em drogas é, de fato, um problema grave. Mas a compulsão está presente em outros elementos do dia a dia, como se estivéssemos condenados a perseguir e repetir um desejo não realizado indefinidamente, num outro tipo de Dia da Marmota.

Estudos com essas plataformas de trading, tipo Nelogica, Tryd e outras parecidas, mostram que uma parte de traders mais ativos passa, em média, quatro horas por dia, depois de o mercado já ter fechado, simulando operações em backtesting. É absolutamente doentio.

Outros checam seus home brokers várias e várias vezes ao dia, mesmo autodenominando-se investidores de longo prazo e seguidores da disciplina de Warren Buffett — eu me pergunto o quanto uma empresa pode ter mudado da manhã para a tarde.

Esses são os casos mais clichês e estereotipados. Há nuances na tendência à repetição, em que mesmo investidores muito sofisticados acabam incorrendo. 

Alguns erros frequentemente repetidos e tipificados podem ser evitados — já que estamos no escopo da psicanálise, tento apelar para imagens do cotidiano e mitos, como forma de elaborarmos melhor a coisa e tentarmos fixá-las em nosso subconsciente:

  1. A corrida atrás do rabo: com o mercado muito temático, um dia sobe tech, no outro só sobe banco e commodity. Se o investidor tentar adivinhar qual vai ser o tema de amanhã, pode acabar andando em círculo e chegando para o Carnaval na Quarta-feira de Cinzas. Foque em uma estratégia diversificada e admita que haverá dias ruins e algumas ações perdedoras na sua carteira. Importa sempre o consolidado a longo prazo. Aprender a perder e a ter paciência.
  2. O gato por lebre: com muitas ações de commodities negociando a múltiplos bem depreciados, vem à minha cabeça situação semelhante à que vivemos cerca de dez anos atrás. O que parecia muito barato era, na verdade, um final de ciclo. As commodities subjacentes caíram de preços de maneira substancial e aqueles múltiplos baixos viraram altos rapidinho. Aqueles que não representavam o menor custo de produção e estavam razoavelmente alavancados tiveram sérios problemas.
  3. O voo de Ícaro: cuidado para não sair voando se a janela ao seu lado se abrir. Não é porque você está ganhando dinheiro que isso permite abaixar a guarda, perder a disciplina, se achar um herói, concentrar muito e se alavancar. Pode ser apenas um bull market, e mesmo os melhores gestores do mundo cometem erros. Você é tão bom quanto seu último trade.
  4. O fígado de Prometeu: se você vai dormir todos os dias sentindo uma bicada de um pássaro na sua região abdominal por conta do comportamento dos mercados, provavelmente está com posições maiores do que deveria em ativos de risco. Durma bem.
  5. Sísifo moderno: se você percebe a construção patrimonial como uma tarefa repetitiva e enfadonha, em que você empurra uma pedra até o alto da montanha, para ela cair de novo e você ser obrigado a repetir o ciclo, ótimo, você está no caminho certo.
  6. Árvores não crescem até o céu: não tome o anúncio de recorde histórico do Ibovespa como um prognóstico de que isso continuará subindo. Provavelmente, aliás, muita coisa já ficou cara e você deveria ser mais seletivo.
  7. Para encerrar, não poderia ser diferente: O complexo de Édipo. Não há espaço para gente mimada, egocêntrica e complexada na B3. Deixe a paixão pela mamãe em casa e haja como um adulto ao investir.

COMPARTILHAR

Whatsapp Linkedin Telegram
EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: As expectativas de conflação estão desancoradas

19 de março de 2025 - 20:00

A principal dificuldade epistemológica de se tentar adiantar os próximos passos do mercado financeiro não se limita à já (quase impossível) tarefa de adivinhar o que está por vir

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: Vale a pena investir em ações no Brasil?

17 de março de 2025 - 20:00

Dado que a renda variável carrega, ao menos a princípio, mais risco do que a renda fixa, para se justificar o investimento em ações, elas precisariam pagar mais nessa comparação

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Para um período de transição, até que está durando bastante

12 de março de 2025 - 19:58

Ainda que a maior parte de Wall Street continue sendo pró Trump, há um problema de ordem semântica no “período de transição”: seu falsacionismo não é nada trivial

EXILE ON WALL STREET

Tony Volpon: As três surpresas de Donald Trump

10 de março de 2025 - 20:00

Quem estudou seu primeiro governo ou analisou seu discurso de campanha não foi muito eficiente em prever o que ele faria no cargo, em pelo menos três dimensões relevantes

VISÃO 360

Dinheiro é assunto de mulher? A independência feminina depende disso

9 de março de 2025 - 7:50

O primeiro passo para investir com inteligência é justamente buscar informação. Nesse sentido, é essencial quebrar paradigmas sociais e colocar na cabeça de mulheres de todas as idades, casadas, solteiras, viúvas ou divorciadas, que dinheiro é assunto delas.

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Na esperança de marcar o 2º gol antes do 1º

5 de março de 2025 - 20:01

Se você abre os jornais, encontra manchetes diárias sobre os ataques de Donald Trump contra a China e contra a Europa, seja por meio de tarifas ou de afrontas a acordos prévios de cooperação

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Um Brasil na mira de Trump

26 de fevereiro de 2025 - 20:00

Temos razões para crer que o Governo brasileiro está prestes a receber um recado mais contundente de Donald Trump

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Eu gostaria de arriscar um palpite irresponsável

19 de fevereiro de 2025 - 20:01

Vai demorar para termos certeza de que o último período de mazelas foi superado; quando soubermos, porém, não restará mais tanto dinheiro bom na mesa

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Tenha muito do óbvio, e um pouco do não óbvio

12 de fevereiro de 2025 - 20:00

Em um histórico dos últimos cinco anos, estamos simplesmente no patamar mais barato da relação entre preço e valor patrimonial para fundos imobiliários com mandatos de FoFs e Multiestratégias

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: Isso não é 2015, nem 1808

10 de fevereiro de 2025 - 20:00

A economia brasileira cresce acima de seu potencial. Se a procura por camisetas sobe e a oferta não acompanha, o preço das camisetas se eleva ou passamos a importar mais. Não há milagre da multiplicação das camisetas.

EXILE ON WALL STREET

Tony Volpon: O paradoxo DeepSeek

3 de fevereiro de 2025 - 20:01

Se uma relativamente pequena empresa chinesa pode desafiar as grandes empresas do setor, isso será muito bom para todos – mesmo se isso acabar impactando negativamente a precificação das atuais gigantes do setor

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: IPCA 2025 — tem gosto de catch up ou de ketchup mais caro?

29 de janeiro de 2025 - 20:31

Se Lula estivesse universalmente preocupado com os gastos fiscais e o descontrole do IPCA desde o início do seu mandato, provavelmente não teria que gastar tanta energia agora com essas crises particulares

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Um ano mais fácil (de analisar) à frente

18 de dezembro de 2024 - 20:00

Não restam esperanças domésticas para 2025 – e é justamente essa ausência que o torna um ano bem mais fácil de analisar

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Às vésperas da dominância fiscal

11 de dezembro de 2024 - 15:00

Até mesmo os principais especialistas em macro brasileira são incapazes de chegar a um consenso sobre se estamos ou não em dominância fiscal, embora praticamente todos concordem que a política monetária perdeu eficácia, na margem

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Precisamos sobre viver o “modo sobrevivência”

4 de dezembro de 2024 - 20:00

Não me parece que o modo sobrevivência seja a melhor postura a se adotar agora, já que ela pode assumir contornos excessivamente conservadores

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Banda fiscal no centro do palco é sinal de que o show começou

27 de novembro de 2024 - 16:01

Sequestrada pela política fiscal, nossa política monetária desenvolveu laços emocionais profundos com seus captores, e acabou por assimilar e reproduzir alguns de seus traços mais viciosos

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: O Brasil (ainda não) voltou — mas isso vai acontecer

18 de novembro de 2024 - 20:00

Depois de anos alijados do interesse da comunidade internacional, voltamos a ser destaque na imprensa especializada. Para o lado negativo, claro

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: Não estamos no México, nem no Dilma 2

7 de outubro de 2024 - 20:00

Embora algumas analogias de fato possam ser feitas, sobretudo porque a direção guarda alguma semelhança, a comparação parece bastante imprecisa

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Brasil com grau de investimento: falta apenas um passo, mas não qualquer passo

2 de outubro de 2024 - 14:40

A Moody’s deixa bem claro qual é o passo que precisamos satisfazer para o Brasil retomar o grau de investimento: responsabilidade fiscal

EXILE ON WALL STREET

Tony Volpon: O improvável milagre do pouso suave americano

30 de setembro de 2024 - 20:03

Powell vendeu ao mercado um belo sonho de um pouso suave perfeito. Temos que estar cientes que é isso que os mercados hoje precificam, sem muito espaço para errar.

Menu

Usamos cookies para guardar estatísticas de visitas, personalizar anúncios e melhorar sua experiência de navegação. Ao continuar, você concorda com nossas políticas de cookies

Fechar