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A Google vai continuar sabendo tudo sobre você. E por que isso pode ser bom?

A plataforma de buscas e criadora do Chrome anunciou que adiará para o final de 2023 uma mudança importante em sua tecnologia de navegação na web.

27 de junho de 2021
7:16 - atualizado às 17:25
Ícone do navegador Chrome, da Google
Imagem: Shutterstock

Estamos de volta para nosso papo de domingo sobre tecnologia e, quem sabe, investimentos. 

Tenho acompanhado diariamente o mercado junto com o Richard e, entre as notícias sobre as big techs, uma recente sobre a Google me chamou a atenção. 

Em minha coluna de estreia aqui na Estrada do Futuro, em 30 de maio, comentei sobre o quanto as big techs sabem sobre cada um de nós enquanto usuários da internet. E não é pouco. 

Diferentes métodos são utilizados para identificar um usuário entre diferentes plataformas e sites, construindo assim seu perfil de comportamento. 

O objetivo final? Mostrar anúncios de forma ultra-segmentada e direcionada às maiores probabilidades de conversão. Em palavras mais simples, oferecer uma experiência personalizada.

O porém é que uma questão que tangencia essa prática começou a ficar cada vez mais latente: privacidade

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Até onde poderia ir a coleta de dados de navegação - e não é pouca coisa que é registrada - e a partir de onde isso já vira um certo abuso da privacidade do usuário? 

Sinceramente, essa é uma resposta que ninguém sabe. É um debate aberto, com múltiplas interpretações. É impossível cravar uma definição única. 

Entretanto, na busca por melhores práticas, a Google havia anunciado em março deste ano que pararia de usar tecnologias de rastreamento como os cookies para mapear o comportamento do usuário e direcionar anúncios baseado nisso. 

Um rápido parênteses: se você não sabe o que são cookies, explico. Eles são uma das formas mais comuns de rastreamento de informação na web. São pequenos pacotes de dados enviados pelos sites para seu navegador, contendo informações que identificam seu perfil como usuário. 

Essas informações podem ser repassadas entre páginas do site ou mesmo entre sites para que sua experiência seja mais fluida.

O que, por um lado, parece algo bem interessante para o usuário — e de fato, é! —, por outro, levantou toda essa discussão sobre privacidade.

E uma vez que a Google decidiu parar de usar esse tipo de tecnologia em seu browser, o Chrome, as ad-techs, plataformas que vendem anúncios personalizados na web, imediatamente sofreram um enorme impacto. 

Em outras palavras, o principal insumo para as ad-techs otimizarem suas estratégias e extrair melhores resultados para seus clientes, consequentemente capturando maiores receitas, deixaria de existir. 

O que aconteceu a partir daí? 

Ao mesmo tempo em que a decisão da Google, que impactaria diretamente milhares de anunciantes a nível mundial, poderia soar como um passo na direção de maior privacidade para nós usuários, a questão entrou em discussão em duas frentes. 

A primeira, em relação a quão "obscuras" passariam a ser as estratégias de direcionamento de anúncios. 

Ora, você deve concordar comigo que as big techs não são exatamente boazinhas, apenas preocupadas em proteger o planeta e seus habitantes. Elas, como qualquer outra empresa, estão em busca de crescimento e lucro. 

Sendo assim, se a Google anunciou que deixaria de usar tais tecnologias e, ao mesmo tempo, tem mais de 80% de sua receita vinda de anúncios, ALGUMA outra forma tão boa quanto ela deve ter encontrado. 

Agora, se a solução encontrada pode ser tão rentável quanto, supostamente usando menos informações sobre os usuários, alguma coisa nessa história ainda não foi bem explicada. 

E quando as coisas não estão claras, mercado e reguladores pedem explicações. 

Isso nos leva à segunda frente. Não é de hoje que os reguladores estão de olho nos potenciais monopólios que estão se formando ao redor das big techs. 

O movimento da Google iria na veia de criar ainda mais uma barreira competitiva para outras empresas que dependem de anúncios, pois elas teriam uma limitação ainda maior de informações, ficando na mão da gigante. 

Para tudo!

Juntando esses elementos, a Google foi aparentemente pressionada a não seguir por esse caminho imediatamente. 

O plano inicial, que era de deixar de usar cookies a partir do início de 2022, mudou para o final de 2023. 

Isso trouxe grande alívio para as ações de ad-techs, como a Trade Desk (Nasdaq: TDD), cujas ações subiram quase 20% após o anúncio. 

Para mim, a parte mais interessante de tudo isso é o quão difícil é, em uma escala de big tech, implementar uma mudança, mesmo que, supostamente, ela seja melhor para seus usuários. 

Afinal, pelo menos em teoria, o fim dos cookies significaria maior respeito à privacidade de quem navega pelo Chrome. 

Na prática, porém, representou uma ameaça não só ao ecossistema de empresas subjacentes a esse modelo quanto levantou questões sobre o que exatamente, então, a Google usará para ter campanhas com performance tão boa quanto as atuais. 

De uma forma ou de outra, algo que me anima como investidor é o fato de empresas como a Google serem não apenas grandes e relevantes mundialmente mas, essencialmente, criadoras de infraestrutura

Trocando em miúdos, ela cria uma infraestrutura (nesse caso de anúncios na internet) sobre o qual outras empresas criarão seus modelos de negócio. Logo, ela captura não somente seus próprios ganhos, mas ganhos de segunda ordem vindos do sucesso dessas outras empresas.

Com isso em mente, fico bastante confiante de que, para a Google, qualquer caminho definido tende a ser positivo. Ainda que haja ruído de curto prazo, com as dificuldades para as demais empresas se adaptarem, deve haver convergência ao novo modelo. Afinal, ou você está dentro, ou pode esquecer uma fatia relevante do seu negócio.

Ainda sobre ads… vem aí BuzzFeed na Bolsa

Falando em empresas cujas receitas são diretamente ligadas a anúncios, o BuzzFeed, site de notícias conhecido mundialmente, anunciou que deve ir à Bolsa de Valores por meio de um SPAC (special-purpose acquisition company). 

SPACs são instrumentos de investimento que ficaram mais comuns recentemente. Basicamente, um SPAC é uma "casca de empresa" listada em bolsa. Como investidor, você compra sem saber o que terá dentro.

O SPAC, então, aporta capital em uma empresa privada e a torna pública, sem passar pelo processo tradicional de IPO. 

Com uma receita anual de US$ 300 milhões, o BuzzFeed deve ir a mercado para se capitalizar e seguir uma estratégia de aquisições de outros sites similares. 

Em um meio dominado quase exclusivamente por Google e Facebook, o plano de expansão de canais via sites e blogs de conteúdo específico pode ser uma estratégia vencedora, para criar um novo e grande ecossistema de publicidade. 

Antes de partir

Como sempre, muito obrigado pela sua audiência. Não deixe de seguir o podcast semanal que faço com o Richard Camargo, e também com o André Franco da Empiricus, sobre tecnologia e investimentos, o Tela Azul

E você pode me mandar também outras sugestões de tema, seja para esta coluna, ou para o podcast, no nosso email: telaazul@empiricus.com.br.

Nos falamos em duas semanas por aqui. 

Se cuida!

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