Rumo, CCR ou EcoRodovias? O que comprar após a forte queda das ações
As ações das empresas do setor foram penalizadas durante a crise e com as medidas de distanciamento. O Seu Dinheiro ouviu analistas e gestores sobre a ação que pode dar mais retorno com menor risco
Trens geralmente lotados totalmente vazios. Não "apenas" vazios: parados. Aos montes. E as plataformas, também, sem ninguém.
Esta foi uma cena que vimos se passar no Brasil nos últimos meses: mais especificamente no Rio de Janeiro, no mês de março. À época, a paralisação total de oito estações da Supervia ocorreu como uma medida de distanciamento social em meio à pandemia do novo coronavírus.
Em São Paulo, não chegamos a ter uma paralisação total de trens nem metrôs, mas os impactos da covid-19 continuaram a ser sentidos pela grande queda no tráfego de passageiros — o que afetou, e muito, empresas concessionárias.
Hoje, a descrição de uma imagem desolada como a descrita acima parece mais aceitável. Afinal, já vimos tantas situações desérticas nas ruas e no transporte público em meio à covid-19 que parece que atingimos um estado de espírito do chamado "novo normal" (sejá lá o que isso significar).
A pandemia deixou marcas significativas para o país, com um número de mortes que já supera as 150 mil. No âmbito econômico, trouxe uma recessão histórica. No mundo corporativo, fez de algumas empresas vencedoras e outras, perdedoras.
No grupo das primeiras, estão certamente nomes do e-commerce —Magazine Luiza, Via Varejo e B2W, cujas ações subiram 120%, 75% e 50% no ano, respectivamente.
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Dentre as últimas, podemos elencar as empresas concessionárias de rodovias, mobilidade urbana e aeroportos, penalizadas pelas restrições de circulação. Em outros momentos, o setor já foi considerado defensivo por contar com contratos relativamente protegidos de surpresas como um possível repique inflacionário.
Para dar uma ideia, exposta a todos esses segmentos, a ação ordinária da CCR (CCRO3) perdeu cerca de 28% de valor no acumulado de 2020.
Mas ela não foi a única do setor que amargou fortes quedas: os papéis de EcoRodovias (ECOR3) e Rumo (RAIL3) também tiveram perdas em linha com esse número.
E, se não bastasse isso, ainda existe outro risco na mesa: no próximo dia 21, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai julgar se a prefeitura do Rio de Janeiro poderá retomar a via expressa Linha Amarela, hoje controlada pela Invepar, após o ato ser autorizado por liminar de ministro, o que é no mínimo uma mau sinal ao mercado.
Agora, com a dissipação do forte choque da covid, qual é a melhor pedida no setor de concessões? Eu conversei nas últimas semanas com analistas e gestores de fundos e trago para você um panorama do mercado sobre as ações das empresas.
No rumo certo
A Rumo, empresa de concessão de ferrovias que realiza transporte de grãos e opera também terminais portuários, mais do que dobrou o seu lucro líquido no segundo trimestre na comparação anual.
O Ebitda (sigla em inglês para lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) da companhia subiu 31% em um ano e a receita se expandiu em 5,7%. A empresa também fortaleceu o seu caixa, que fechou o período em R$ 2,4 bilhões.
"A leitura que tenho é que a empresa saiu intacta da crise", diz Henrique Scher, analista da gestora Guepardo Investimentos.
Scher cita que o único efeito perceptível da pandemia nas operações da empresa veio na linha das tarifas cobradas, uma vez que a Rumo teve de reduzi-las para competir com o custo menor do transporte rodoviário, impactado pela queda da gasolina.
Além disso, como riscos à ação, ele vê a execução de projetos (como a extensão da Operação Norte) e o aumento da competição.
Tanto a disputa pela concessão da ferrovia Ferrogrão — que vai ligar o Mato Grosso ao Pará — como a presença da Hidrovias do Brasil (HBSA3) — que opera na região da Operação Norte da Rumo (que compreende MT e São Paulo) — são possíveis barreiras de competitividade com que a empresa terá de lidar.
"Mas não me preocupo tanto com isso, porque acho que não é a Rumo que sente medo das empresas, mas as outras empresas que sentem medo da Rumo", afirma o analista da Guepardo.
Para Carolina Ujikawa, responsável pela área de análise em ações da Mauá Capital, a Rumo está barata e oferece um potencial entre 25% e 30% de alta. "Com o agronegócio indo muito bem, a Rumo independe do ciclo econômico para andar bem."
A ação, no entanto, ainda não reflete o upside esperado pelos gestores. Até agora, caiu 31,42% no acumulado de 2020. A queda, claro, reflete a tensão que se espalhou nos mercados a partir de março, com o choque do coronavírus, e penalizou basicamente todos os papéis em um primeiro momento.
A visão de longo prazo da Mauá Capital para o papel se baseia na expectativa da alta da produção de grãos, setor em que o Brasil é líder mundial. A projeção da gestora é de um crescimento no longo prazo das operações da Rumo, com alta eficiência e crescimento contratado.
Até 2022 se espera que a Ferrovia Norte-Sul, que vai ligar São Paulo a Tocantins, comece a ser operada pela Rumo. A previsão é de R$ 2,7 bilhões em investimentos, segundo o edital do leilão, realizado em março do ano passado.
Segundo o UBS BB, o maior potencial de alta do papel hoje está na extensão da Operação Norte no MT, de Rondonópolis a Lucas do Rio Verde. A execução do projeto pode adicionar R$ 6 por ação, diz a análise do banco, que recomendou compra para a Rumo em agosto e tem o preço-alvo de R$ 28,50 para o papel.
Atualmente, a ação ordinária da Rumo é negociada por volta de R$ 18,90.
"Temos poucos ativos no setor, mas a Rumo é um que gostamos de maneira estrutural, olhando para exportações e a alta do dólar", me disse o gestor de um fundo com mais de R$ 5 bilhões sob gestão e com posição na empresa.
Outra observação desse gestor é para a situação da governança da companhia. "O time de executivos é muito bom, temos bastante confiança e não operamos seguindo o vírus ou a macroeconomia."
Mais exposição, mais perdas
De volta às rodovias e concessões, temos CCR e EcoRodovias como destaque na B3. Mas, como falou o gestor logo acima a respeito de governança, o que ambas as empresas têm em comum vai muito além da administração de pelas rodovias.
Tanto CCR quanto EcoRodovias tiveram problemas na Justiça recentemente e fecharam acordos de leniência, o que as apresenta, na leitura de gestores e analistas, como mais arriscadas. Essa questão ganha ainda mais relevância com as discussões sobre princípios ESG — sigla em inglês para práticas ambientais, sociais e de governança.
Para além desse aspecto, e contando com a recuperação da imagem das empresas, a CCR tem um guarda-chuva maior de negócios, envolvendo tanto concessões de aeroportos quanto de transportes urbanos e a operação de portos. Essa amplitude de segmentos deixou fortes marcas negativas nos resultados da companhia em meio à covid-19.
"Sem dúvida, a CCR foi punida pela sua diversificação", diz Daniel Herrera, analista de investimentos da Toro Investimentos.
A empresa apresentou no balanço do segundo trimestre uma sensível redução de 18% no volume do tráfego nas suas rodovias — mas, para falar a verdade, recentemente tem indicado melhora nos fluxos, estando agora próximo de zerar a queda em 2020, segundo o tráfego divulgado na semana de 02 a 08 de outubro.
O problema é outro.
A CCR mostrou no balanço do segundo trimestre uma vertiginosa queda, de no mínimo 94% na base anual, no total de embarques de passageiros em aeroportos sob sua concessão. Além disso, demonstrou a séria retração na demanda por transporte urbano.
Das três concessionárias aqui discutidas, a CCR foi a que trouxe mais dados negativos no seu balanço: diferentemente de Rumo e EcoRodovias, teve prejuízo líquido de R$ 142,1 milhões, revertendo o lucro do ano anterior. Viu também a receita líquida despencar mais de 20% em um ano e o nível de alavancagem se elevar.
O estado da arte dos negócios da companhia é duvidoso. Mas o histórico da CCR como uma agressiva competidora em leilões de rodovias traz para dentro do jogo um fator relevante, que são os leilões — no ano que vem, inclusive, a empresa é a favorita para a licitação da ViaDutra, uma vez que é a atual concessionária.
"A CCR costuma ser mais agressiva do que a EcoRodovias nesses pleitos, é importante", diz Herrera, da Toro. "Mas o driver crucial para a empresa é a resposta à pandemia, e aqui temos a preocupação sobre as linhas de metrô."
As linhas geridas pela CCR sofreram um grande baque em razão da pandemia. A ViaQuatro, operadora da linha 4 do metrô na capital paulista, tombou 72,8% em receita bruta, enquanto a ViaMobilidade, que opera as linhas 5 e 17, apresentou queda de 36%.
"Entre as concessionárias, a gente tem mais posição em CCR e vemos um atrativo na posição da empresa nos principais centros turísticos do Brasil", disse Igor Cavaca, analista da Warren, a respeito da presença da empresa no Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo.
Upside maior, risco maior
"CCR e EcoRodovias têm maior upside do que Rumo, mas também são muito mais arriscadas", diz Luis Sales, analista de investimentos da Guide. "Elas dependem muito mais do momento da atividade econômica, de uma retomada", afirma ele.
Um eventual estresse nos mercados também mexe com a performance dos papéis especialmente de CCR e EcoRodovias.
Como são empresas que precisam estar alavancadas para realizar os investimentos em diversos projetos, elas se beneficiam de juros baixos para fazer tais operações — de forma que um leve estresse fiscal, como temos visto nas últimas semanas nos mercados, que mexa com a curva de juros, pesa no desempenho dessas ações.
O endividamento líquido é um ponto a ser monitorado tanto em CCR quanto EcoRodovias: o da primeira superou R$ 14 bilhões, subindo 4%, e o da segunda chegou a R$ 6,7 bilhões, em alta de 6% no segundo trimestre.
A alavancagem da EcoRodovias atualmente é a mais elevada entre as três, de 3,3 vezes. A empresa, no entanto, apresentou um crescimento de 47% no lucro no segundo trimestre, apesar da queda na receita líquida refletindo o menor tráfego em suas concessões.
Segundo a analista da Mauá Capital, a oportunidade de um novo investimento da parte de CCR e EcoRodovias empresas faria a gestora "voltar a olhar os papéis tranquilamente. "Mas hoje, o que vem pela frente não nos atrai", afirma ela, citando os riscos de alta das taxas de juros e do surgimento de novos players no segmento.
Na linha da CCR, a companhia tem apresentado melhora nas movimentações em suas rodovias.
O volume de tráfego verificado no ano até 11 de outubro totaliza uma queda de 5,2% em relação ao mesmo período do ano passado. "O setor foi bastante impactado mas vem apresentando retomada rápida", diz a Guide.
Até aqui no ano, os papéis da EcoRodovias caíram 27,73%. O UBS apresenta visão neutra tanto para CCR quanto EcoRodovias neste momento.
Desde o sell-off de fevereiro e março, o banco observou em junho que a CCR subiu 47% e Ecorodovias 64%.
"Nós preferimos ECOR já que estimamos que o reequilíbrio financeiro pendente (não relacionado ao COVID-19) poderia adicionar R$ 4,9/ação ao papel (dos quais R$ 4,7 já estão precificados)", escreveram os analistas.
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