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Felipe Saturnino
Felipe Saturnino
Graduado em Jornalismo pela USP, passou pelas redações de Bloomberg e Estadão.
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Risco-país sobe e volta a seguir dólar com choque do coronavírus

O indicador que mede o risco do país estava nas mínimas em mais de uma década apesar do dólar alto, mas disparou com o pânico disparado pelo coronavírus no mercado. O que esperar agora?

Felipe Saturnino
Felipe Saturnino
11 de março de 2020
5:25 - atualizado às 9:33
mercado monitora riscos

O choque nos mercados provocado pelo agravamento do surto do coronavírus me fez mudar o objetivo original desta reportagem. Eu apurava inicialmente o descolamento de dois ativos no mercado que costumavam andar juntos: o dólar e o risco-país.

No dia 19 de fevereiro, a moeda norte-americana fechava na cotação recorde de R$ 4,36. Ao mesmo tempo, o principal indicador de risco de calote do Brasil registrava as mínimas em mais de uma década.

Mas as coisas acabaram voltando ao “normal” nas últimas duas semanas, quando o risco-país disparou e passou a variar em sintonia com o dólar. Agora que ambos os ativos voltaram a andar juntos, a questão passou a ser: o que esperar daqui para frente?

Como se mede o risco-país?

Antes de responder, vale dizer como se mede o tal do risco-país. O principal indicador usado pelo mercado hoje é o chamado CDS (credit default swap). Trata-se de uma espécie de seguro negociado no mercado financeiro que protege o comprador de um calote na dívida de um país ou empresa que emitiu títulos de crédito.

Até recentemente, o indicador de risco-país era praticamente um espelho do dólar. Ou seja, os movimentos de alta da moeda norte-americana geralmente eram relacionados com o aumento dos temores sobre a capacidade de o Brasil honrar suas dívidas.

A situação começou a mudar a partir de 2016, mas se acentuou no ano passado. Antes do agravamento do surto do coronavírus, o CDS chegou a ser negociado abaixo dos 100 pontos-base, menor patamar desde a crise financeira de 2008.

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No mercado, o descolamento entre o dólar e o CDS é razão de debate. Recentemente, o BTG Pactual surgiu com uma tese. O banco enumerou dois eventos-chave que ocorreram após o período para explicar a assimetria: o impeachment da então presidente Dilma Rousseff e a queda no diferencial de juros entre Brasil e Estados Unidos.

O primeiro tornou o mercado otimista com a solução do problema das contas públicas, reduzindo o nível do risco-país. O segundo gerou uma saída de capital que deixou de ser atraído pelas altas taxas brasileiras, o que elevou o preço do dólar.

“Era um fluxo de curto prazo, de carry trade, mas que faz essa diferença”, diz Vladimir Vale, estrategista-chefe do Credit Agricole Brasil Indosuez.

O carry trade é uma estratégia de investimento, para moedas ou outros ativos, que envolve contrair um empréstimo a um juro baixo e realizar com ele uma aplicação que renda um juro maior. É um fluxo chamado especulativo, pois não corresponde a uma operação de médio ou longo prazo.

A mudança no perfil do endividamento brasileiro também contribuiu para o descolamento entre dólar e CDS.

"A correlação entre o risco-país e a moeda é naturalmente enfraquecida pelo fato de o Brasil, diferentemente da Argentina, não possuir um grande nível de endividamento em dólar", me disse Tony Volpon, economista-chefe do UBS e ex-diretor do Banco Central. "Isso, naturalmente, diminui o risco de default [calote]."

Originavam-se, assim, dois mundos. No primeiro, o do risco-país, era vislumbrado um cenário de solução das contas públicas e perspectivas de mais reformas no futuro.

“Ele reflete mais os fundamentos da nossa economia e menos o estresse, como é o caso dos fluxos cambiais que afetam o dólar”, diz Camila Abdelmalack, economista da Veedha.

No segundo, o mundo do dólar, via-se uma cautela em relação ao quadro externo. Naquela época, como hoje, as condições financeiras apertaram.

Mas e agora?

Todo esse quadro que eu narrei nos parágrafos anteriores ficou em suspenso nas últimas semanas, com a onda de aversão a risco que tomou conta dos mercados globais diante da incerteza sobre os impactos do coronavírus.

Ou seja, o surto da doença voltou a unir o que política monetária e impeachment separaram.

Para a maioria dos economistas e analistas de mercado com quem eu conversei, a relação entre a moeda norte-americana e o indicador de risco do Brasil ficou concentrada em um período da história e as razões para a sintonia desapareceram.

É claro que, enquanto durar a incerteza nos mercados provocada pelo coronavírus, o risco-país e o dólar andarão juntos. No longo prazo, o que vai determinar o risco de se investir no Brasil é o avanço da agenda de reformas no Congresso.

Nesse caso, outro “casamento” entre risco-país e dólar poderá ocorrer – mas no sentido oposto, com queda em ambos os indicadores, desde que haja progresso do governo nessa frente, segundo a economista da Veedha.

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