Risco fiscal impede Brasil de aproveitar bom momento dos mercados globais
Rogério Xavier, da SPX Capital, e Carlos Woelz, da Kapitalo Investimentos, criticam duramente falta de interesse em controlar contas públicas
Dois dos gestores mais respeitados do País andam bastante preocupados com a trajetória fiscal do Brasil. O aumento do déficit e a trajetória ascendente da dívida soberana faz com que eles não compartilhem o excesso de otimismo visto no mercado acionário local.
Participando da live Investidor 3.0, promovida pela Empiricus e a Vitreo, Rogerio Xavier, sócio fundador da SPX Capital, e Carlos Woelz, sócio fundador e diretor da Kapitalo Investimentos, afirmaram que o cenário externo está altamente positivo, mas o Brasil não está em condições de surfar esta onda.
Eles compartilham a opinião de que a pandemia está próxima de ser controlada, graças ao avanço das vacinas e o conhecimento cada vez maior dos cientistas em relação à covid-19. Isto, junto com taxas de juros baixas, está criando as condições de crescimento da economia global e dos mercados. “O quadro global é positivo para risco, tanto em ativos de crédito como para bolsas ao redor do mundo”, disse Xavier.
Mas quando olham para o Brasil, o discurso muda. Embora a bolsa brasileira esteja acompanhando as principais praças internacionais, eles entendem que há uma desconexão muito grande entre o bom humor dos investidores e a situação interna, considerando a delicada situação fiscal.
Xavier exemplificou esta incoerência comparando os sinais positivos emitidos pelo mercado de renda variável com o que está ocorrendo no mercado de juros futuros, que aponta para uma inflação de 4,5% e juros de 9,0%.
“Essa divergência entre os mercados me deixa confuso. Qual o mercado que está correto? O otimista na bolsa ou o pessimista no mercado de juros?”, disse gestor da SPX Capital. “Vejo a performance da bolsa frágil.”
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Executivo incompreensível
Os dois gestores fizeram duras críticas ao governo do presidente Jair Bolsonaro, ao ministro da Economia, Paulo Guedes, e ao Congresso, por não terem um senso de urgência em relação à situação fiscal brasileira e à necessidade de realizar reformas estruturais.
Woelz, da Kapitalo, criticou o fato de o Executivo, principalmente o titular da Economia, não ter apresentado até o momento qualquer plano sobre como lidar com o crescimento do déficit fiscal e a trajetória de endividamento, focando mais em outras questões.
“Ao invés de falar de cabotagem, é preciso falar da trajetória da dívida”, disse. “O foco tem que ser trajetória de dívida, apresentando um cronograma e medidas que possam passar credibilidade [ao mercado].”
A falta de vontade política para realizar reformas também foi abordada. Para eles, isso é fruto do ciclo eleitoral iniciado neste ano, primeiro com o pleito nos municípios, seguido pela escolha dos novos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, que acontece em fevereiro de 2021, e, por fim, a eleição presidencial de 2022.
Sem um ajuste não será possível controlar a trajetória dos gastos, uma vez que mais de 90% são de despesas obrigatórias. “Não consigo ver consenso, uma conjunção de força para mudar a Constituição para diminuir as despesas obrigatórias, necessário para abrir espaço no Orçamento”, disse Xavier. “Não tem senso de urgência na beira do precipício.”
Estratégia
A falta de ação do lado fiscal fez com que o gestor da SPX optasse por ficar de fora do câmbio, não vendo o real em patamares baratos. “Com o fiscal ruim, não há vantagem em ficar comprado em real contra o dólar”, disse. “Se o mercado de renda fixa estiver correto, o real vai ter que reagir.”
A situação vivida pelo País faz com que Xavier fique um pouco mais reticente em relação à bolsa brasileira, preferindo apostar na alta da inflação via títulos. Ele aproveitou ainda para criticar duramente o Banco Central (BC), afirmando que ele está “leniente” com a aceleração dos preços. “Estamos com juros muito baixos e um fiscal desancorado”, afirmou.
Woelz também não compartilha do excesso de otimismo dos investidores. Apesar de acreditar que os ativos estão baratos, ele também pondera os efeitos da crise fiscal, optando por empresas com “evento específico”, uma situação positiva sem relação com o mercado, ou “dependentes do setor externo”, estando vendido em papéis com relação ao cenário doméstico.
Ele afirmou que a Kapitalo está praticamente zerada em câmbio e com posições apostando na aceleração da inflação no curtíssimo prazo.
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