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O que “O Feitiço de Áquila” pode nos ensinar sobre como caçar assimetrias na bolsa de valores?

Da mesma forma que pequenos movimentos acabam gerando consequências de grandes proporções, assimetrias nascem como se fossem pequenas rusgas na tela de uma pintura a óleo

14 de abril de 2020
8:25 - atualizado às 10:15
Feitiço de Áquila
Cena do filme Feitiço de Aquila - Imagem: Divulgação

"Great storms announce themselves with a single breeze, and a single random spark can ignite the fires of rebellion.” - Ladyhawke, 1985 (no Brasil, O Feitiço de Áquila).

Ao passo em que as luzes encerram a madrugada e inauguram a manhã, clareando o ambiente, a jovem moça de cabelos loiros, coberta em sua grossa manta vermelha, passa levemente sua mão sobre o pelo escuro do lobo ao seu lado. A atmosfera é fria e as figuras se deitam sobre o gelo, onde teriam passado a noite agitada e cansativa.

A expressão suave da mulher se enrijece ao, lentamente, encarar no horizonte o alvorecer, iluminando com seus raios tórrido alguns trechos de terra úmida ainda não cobertos pelas espessas camadas de neve. Mais ao lado, a luz reflete na espada do cavaleiro, próximo da carruagem, e a moça volta a encarar o animal negro deitado ao chão.

Quanto mais o astro rei os esquenta, menos denso e escuro se torna o pelo do lobo, ganhando coloração mais clara e, gradualmente, perdendo a volumosa pelagem. Com seus profundos olhos belos e azuis, Michelle Pfeiffer observa a transformação do quadrúpede em bípede, sobre o frio solo. Rutger Hauer tem pouco tempo para admirar a beleza interminável de Pfeiffer, a qual ainda não tinha chegado aos 30 anos à época, e que sob os raios solares se transforma em um águia.

A cena descrita acima faz parte do filme "Ladyhawke", ou “O Feitiço de Áquila" no Brasil, de 1985. Por mais que eu não seja um grande fã do título em si, devo admitir que fantasias medievais costumam chamar minha atenção. De história um tanto quanto menos sofisticada do que aquilo que poderia se esperar, o longa carrega consigo um simbolismo importante para a indústria cinematográfica por ter sido o segundo títulos produzido pela 20th Century Fox e coproduzido pela Warner Bros. Veja, foi a partir dos anos 80 que as grandes parcerias entre produtoras começaram a nascer em maior volume, possibilitando novos tipos de produções antes impensáveis. 

Contudo, trago a obra para nosso espaço hoje não por sua relativa importância na história do cinema, mas, sim, devido à frase com que iniciei o texto hoje. Tive a oportunidade de revisitar a experiência cinematográfica durante o último fim de semana de Páscoa, desfrutando da já usual quarentena paulistana, e não pude deixar de me fissurar às palavras exibidas.

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"Great storms announce themselves with a single breeze, and a single random spark can ignite the fires of rebellion.” - Ladyhawke, 1985 (no Brasil, O Feitiço de Áquila).

Grandes tempestades se anunciam com uma única brisa, e uma única faísca aleatória pode acender o fogo da rebelião… Semana passada, trabalhamos com a temática rebelião, transfigurada na queda da bastilha. Hoje, a ideia volta conjugada como sendo uma parte dentro de um todo informativo. Isto é, trago hoje minha tentativa de trazer até você, leitor, o que na minha cabeça se trata de uma assimetria e como podemos caça-las.

Da mesma forma que pequenos movimentos acabam gerando consequências de grandes proporções, assimetrias nascem como se fossem pequenas rusgas na tela de uma pintura a óleo. Resta-nos atentar no devido momento para o detalhe certo de modo a conseguir antecipar um pequeno defeito que pode vir a se tornar um grande problema na tela.

Aqui será importante entender antecipação não como uma questão de timing, até porque assimetrias acabam se confundindo com o conceito de entrar na hora certa (o que não necessariamente é verdade). A ideia subjacente, na verdade, guarda muita correlação com a noção de aleatoriedade expressa no segundo trecho da frase: “[…] uma única faísca aleatória pode acender o fogo da rebelião”.

Em investimentos, grosso modo, haverá momentos em que movimentos do mercado levarão o preço dos ativos pra cima e pra baixo. A origem do movimento pode ser com razão ou sem razão, mas isso é a média do mercado. 

Resgato, para delimitar nossa fronteira, a definição de investimento de Aswath Damodaran, um dos pais de análise de investimentos da contemporaneidade. Para o professor da NYU, um bom investimento é você comprar uma boa empresa por menos do que ela efetivamente vale. Evidentemente, partimos aqui de um entendimento purista com raízes na clássica escola do valor. Comprar algo bom por menos do que ele vale. 

A assimetria está associada a essa ideia, mas vai além, pois pondera risco. Em um investimento em ações, por exemplo, por conta da responsabilidade limitada, a perda máxima é de 100%. Por outro lado, em caso de ganhos excepcionais, não podemos estimar o limite de alta com precisão. 100%? 1.000%? 2.000%? 10.000%? Qualquer uma é válida. Por isso diz-se que investimento em ações, em geral, costuma oferecer assimetrias convidativas.

Um outro exemplo repousa nas criptomoedas. Perda máxima de 100%, mas ganho possível ilimitado. Faz sentido colocar uma parcela pequena de seu patrimônio consolidado, como 1% do total (máximo investido), de modo a se aproveitar dessa propriedade assimétrica.

Portanto, quando a matriz de probabilidade associadas nos permite auferir um ganho que mais que compensa a perda, de modo que, se reproduzido inúmeras vezes, teríamos uma estratégia vencedora no longo prazo, dizemos que encontramos uma assimetria convidativa.

Como já dei a entender, grandes correções de mercado, muitas vezes por um choque exógeno imprevisível e de alto impacto, da mesma forma que o coronavírus, por exemplo, propiciam a eclosão de inúmeras assimetrias antes ocultados por preços esticados em demasia no mercado.

Os preços das ações caíram e, de fato, muitas empresas estão valendo menos porque o mundo pós-corona será outro potencialmente bem diferente. Empresas poderão ter prejuízos irrecuperáveis em vários setores. Se considerarmos que o valor intrínseco de uma empresa (o quanto ela vale) é o fluxo de caixa da mesma de hoje até o infinito descontado por uma taxa apropriada, a incerteza é tamanha que qualquer inferência de preço futuro seria mera irresponsabilidade.

Diante do contexto, portanto, de tamanha exacerbação de impermeabilidade quanto ao futuro, difícil estabelecer assimetrias em um primeiro momento. Com certeza tivemos gente que descontou demais e aí propicia as assimetrias que ocasionam oportunidades pontuais. Mas ainda é muito difícil estabelecer o que é barganha e o que não é em ativos de risco.

O bom investidor precisa saber "caçar" tais assimetrias, o que inclui compreender que não é porque caiu que necessariamente está barato. Entre “barato” e “caído” existe um oceano de distância. Agora, por exemplo, tem muita coisa caída. Muita coisa que parece ser as rusgas no quadro, as faíscas de uma revolução ou uma brisa inicial de uma tempestade. 

Contudo, ainda é muito cedo para dizermos com clareza. Lembre-se: assimetrias envolvem ponderação de risco de perda total. Diante da brutal recessão de que aproxima, possivelmente haverá algumas baleias mortas na praia. O investidor tem que evitar somente um erro brutal: o de morrer antes da hora. Não podemos nunca nos expor a risco de perda total com todo nosso portfólio.

Por isso, para o presente momento, dentro de um portfólio balanceado para ativos de risco ainda, acredito que seja o momento para se carregar papéis de qualidade. Coisas líquidas, com balanço forte, liderança de mercado, pricing power, vantagens competitivas claras, altas barreiras à entrada, longo e sólido histórico de resultados, com crescimento dos lucros por ação em amplos horizontes. Devemos evitar, em um primeiro momento, as empresas alavancadas, com qualquer risco de quebrar agora.

Temos defendido a estruturação de posições de proteção clássica e de caixa para enfrentar a crise, diluindo a parcela exposta a risco em Bolsa na vertical (igualmente entre as partes). Tudo isso, claro, feito sob o devido dimensionamento das posições, conforme seu perfil de risco, e a devida diversificação de carteira, com as respectivas proteções associadas.

A Carteira Empiricus tem acertado no movimento de proteção do patrimônio de seus assinantes, preparando-os para a potencial virada de mão em um futuro próximo, quando teremos mais clareza em relação ao futuro e poderemos encher a mão com vontade a potenciais assimetrias. Agora, no entanto, ainda é momento para se proteger diante da crise. 

Em um outro instante, iremos às compras com mais vontade, mas não ainda. Vale lembrar também que não ir às compras não significa não ter nada de Bolsa. Pelo contrário. X não é f(X) e muito menos g[f(X)]. Sua opinião sobre a realidade pouco importa e sim como você está exposto a ela.Para mais ideias como essa que ilustrei acima, convido-os a dar uma olhada nos nossos escritos na Empiricus, notadamente na Carteira Empiricus. Quem assina, não se arrepende. Além da Carteira Empiricus, Felipe Miranda, nosso Estrategista-Chefe, tenta passar quinzenalmente ideias como esta acima descrita em sua série Palavra do Estrategista, best-seller da Empiricus.

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