🔴 QUER INVESTIR NAS MELHORES CRIPTOMOEDAS DO MOMENTO? SAIBA COMO CLICANDO AQUI

Take a walk on the wild side

O cérebro humano quer a garantia, a convicção extrema, a resposta pronta, enquanto talvez tenhamos que sempre conviver com um pouco de dúvida, uma espécie de fumaça que nos separa da certeza total

6 de julho de 2020
10:30 - atualizado às 17:31
Balanceamento de risco e retorno dos investimentos
Imagem: Shutterstock

“Mother, mother
There's too many of you crying
Brother, brother, brother
There's far too many of you dying
You know we've got to find a way
To bring some lovin' here today, ya”
What’s going on — Marvin Gaye
(a versão a capella do filme “Da 5 Bloods” é impagável)

“Mas tem cobertura do FGC?”

“A corretagem é de graça? Vão me cobrar alguma taxa?”

Confesso: ouço as perguntas acima com mais frequência do que gostaria. Eu posso entendê-las, sua essência e sua motivação. Realmente posso. Mas a verdade é que não gosto muito delas. Elas parecem algo do bem, em favor do investidor, enquanto escondem certas sutilezas. Sabe aquela pergunta aparentemente sofisticada que, ao contrário, é apenas bastante superficial. Como o personagem de Jesse Eisenberg em “Para Roma com Amor”, que decora frases de autores famosos para parecer erudito, sem conhecê-los minimamente. Soa profundo num primeiro momento, mas não resiste a uma análise cuidadosa.

A primeira pergunta revela a postura de um investidor descontente com sua remuneração atual, potencialmente na poupança ou num fundo DI de taxa alta, interessado em um pouco mais de retorno, mas indisposto a correr risco. Ele topa sair da poupança, contanto que haja em torno dele uma rede de proteção.

Leia Também

Nietzsche dizia que a razão era uma grande emoção, o desejo de controle. Leonardo da Vinci pintava com a técnica do “sfumato”, sem demarcar demais os contornos fronteiriços do retratado. 

O cérebro humano quer a garantia, a convicção extrema, a resposta pronta, enquanto talvez tenhamos que sempre conviver com um pouco de dúvida, uma espécie de fumaça que nos separa da certeza total. Como em “Mona Lisa”, sempre enxergaremos a realidade por meio de um véu, sem que possamos tocá-la direta e concretamente. 

A ideia de ter de conviver com dúvidas, incertezas e riscos é particularmente impopular no Brasil. Talvez seja a herança do estado paternalista, talvez seja a orientação católica em que há sempre um Pai nos esperando para acalentar-nos, talvez as mazelas não deliberadas do manifesto antropofágico e sua preguiça macunaímica, talvez o histórico ruim daqueles que assumiram muito risco em sua atividade empreendedora ou investidora. “There are no old bold investors” — não há investidores velhos ousados (eles morreram pelo caminho).

Sinceramente, não sei. Mas vejo uma dificuldade grande por aqui em se lidar com o conceito de riscos.

Na semana passada, cheguei a escrever, retomando Howard Marks, que o risco é a coisa mais importante. Nós não estamos aqui para não correr riscos — você pode passar a vida toda tentando não morrer, ficando dentro do seu quarto, esterilizando todo objeto que ali entrar, comendo a comida mais saudável do mundo; pode ficar por aí até os 150 anos, mas terá vivido algo de verdade?

Se o risco é a coisa mais importante, quais seriam os principais fatores que poderíamos mapear como fonte de incerteza para o segundo semestre?

O primeiro deles talvez seja o mais óbvio: ainda o coronavírus. Se esta é a extensão da primeira onda ou o início da segunda, sinceramente não importa tanto. O fato é que ela (a primeira ou a segunda, tanto faz) poderia abortar o processo de recuperação das economias.

Temos também a eleição norte-americana, em que Biden aparece com grande vantagem sobre Trump — sim, eu também não acredito em pesquisa, está muito longe e me lembro também da posição de Hillary. Mas é o que é até aqui. Biden não é tão radical quanto Warren ou Bernie. Verdade. Porém, poderia reverter a reforma fiscal de Trump e impactar o lucro do S&P em cerca de US$ 20. Além disso, talvez impusesse uma regulação antitruste mais forte.

A relação entre EUA e China também não é das melhores. O protecionismo implica rearranjo das cadeias de suprimento globais, retrocesso da globalização e perdas de margem. Ray Dalio tem falado em uma década perdida para as ações por conta da piora na globalização.

Ainda lá fora, os valuations não são propriamente uma barganha. O lucro projetado para o S&P ronda os US$ 170 para 2021. Ou seja, estaríamos falando de 18,5 vezes Preço sobre Lucro para 2021. 

Para encerrar, ainda temos essa experiência monetária que ninguém sabe muito bem quais serão as consequências, enormes déficits públicos e empresas zumbis que foram salvas pelo Fed e agora devem contribuir negativamente para a produtividade norte-americana.

Por aqui, já entramos na crise meio combalidos, ainda nos recuperando da época de destruição da nova matriz econômica. Temos uma herança fiscal complicada e, a cada semana, desviamos de uma crise política potencial.

O que fazer diante de tantos fatores de risco? Vamos nos paralisar, esperando uma garantia do FGC?

Não dá, obviamente. Precisaremos conviver com os riscos, como, aliás, fazemos na nossa vida cotidiana. Enfrentamos um trânsito caótico (ou enfrentávamos pelo menos), pedimos um aumento para o chefe, começamos um negócio, enviamos um e-mail agressivo para o fornecedor, damos um castigo para o filho sem saber direito sua reação…

O mercado de capitais brasileiro, felizmente, tem se sofisticado muito. É importante que o investidor também se sofistique, sem permitir-se um discurso de vitimização, estando disposto a correr riscos (os certos e com comedimento, carteiras diversificadas e calibradas ao seu perfil) e a pagar por produtos que lhe geram bons retornos.

Ele terá de perceber que o ato de investir obedece a um triângulo, sendo a primeira ponta o retorno potencial, a segunda o risco e a terceira a liquidez. Ele vai precisar escolher em qual lugar do triângulo vai parar. Qualquer ponto pode ser adequado, mas ter as três coisas ao mesmo tempo compõe um dos trilemas impossíveis da economia.

Há três pontos fundamentais em termos de mentalidade que acho importante neste processo de sofisticação do investidor. 

O primeiro diz respeito a como ele vai encarar seus erros. A verdade é que o investidor erra todo dia. Se ele estiver bem com essa afirmação, suas chances de sucesso são bem maiores. Um grande gestor brasileiro costuma dizer algo assim: “O investidor é sempre um idiota. Se ele compra uma ação e ela cai, é um idiota porque comprou. Se ele compra e ela sobe, é um idiota porque comprou pouco”. George Soros afirma que sua taxa de acerto é tão boa (ou ruim) quanto aquela de um investidor comum. Ele só se diz melhor do que a média em identificar seu erro, mudar de ideia e seguir em frente. O que você perdeu no investimento A pode recuperar em B ou C. Não se apegue às opiniões e às posições de ontem. Permita-se mudar de ideia (e de ação) sempre que o cenário exigir isso. Investir não é um ato de coerência da narrativa, como num livro linear. Sempre será uma comparação entre preço e cenário. Se um dos dois muda muito, você precisa agir.

O segundo se refere ao fato de que vivemos agora num mundo de baixos retornos. É uma notícia ruim, claro. Mas a realidade não vai se adaptar às nossas vontades. É mais fácil nós nos adaptarmos à realidade. Os ativos no mundo todo são precificados por arbitragem. O que isso quer dizer? Resumidamente, que o ativo X deve pagar o retorno da taxa livre de risco mais o prêmio de risco do ativo X. A Bolsa paga o retorno da renda fixa mais um prêmio de risco de Bolsa. Se o retorno esperado da Bolsa era 20% quando a Selic era 15%, não adianta esperar que a Bolsa continue lhe pagando, na média, 20% ao ano agora que a Selic é 2%. Se o retorno esperado da Bolsa continuar em 20% com a Selic a 2%, todos vão comprar Bolsa. Os preços das ações sobem, e o retorno esperado cai, com os mercados entrando em equilíbrio — caso contrário, haverá espaço para arbitragem. Os mercados são eficientes e se ajustam também entre as várias classes.

Por fim, o investidor precisa topar pagar. Na verdade, ele já está pagando. Apenas não está percebendo. Quando ele tem corretagem zerada para comprar minicontrato, toma uma “pequena" taxa de 5% na alavancagem, o que é muito pior. Quanto ele não paga nada pelas operações no home broker, o HB cai no momento em que ele mais precisava negociar as ações (não é uma coincidência; os dias de maior volatilidade elevam o volume transacionado e consomem mais banda, quanto todos querem comprar ou vender ao mesmo tempo). Quando ele usa uma “assessoria de graça”, paga via rebates e taxas de distribuição — em alguns fundos internacionais, o distribuidor está ganhando mais do que o gestor, o que é uma aberração.

Em meio a tantos riscos, a tantos custos sub-reptícios e uma assimetria de informação desfavorável ao investidor, a resposta talvez esteja no suingue de Marvin Gaye: “We've got to find a way” (precisamos encontrar um jeito). Ou talvez Lou Reed seja mais apropriado: “Take a walk on the wild side”. 

Depois da porrada com Cosan, estamos preparando novidades para adicionar um pouco mais de risco nas nossas carteiras. As Bs-50 e algumas empresas de tecnologia, além de incorporadoras, em Bolsa parecem particularmente atraentes.

COMPARTILHAR

Whatsapp Linkedin Telegram
EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: As expectativas de conflação estão desancoradas

19 de março de 2025 - 20:00

A principal dificuldade epistemológica de se tentar adiantar os próximos passos do mercado financeiro não se limita à já (quase impossível) tarefa de adivinhar o que está por vir

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: Vale a pena investir em ações no Brasil?

17 de março de 2025 - 20:00

Dado que a renda variável carrega, ao menos a princípio, mais risco do que a renda fixa, para se justificar o investimento em ações, elas precisariam pagar mais nessa comparação

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Para um período de transição, até que está durando bastante

12 de março de 2025 - 19:58

Ainda que a maior parte de Wall Street continue sendo pró Trump, há um problema de ordem semântica no “período de transição”: seu falsacionismo não é nada trivial

EXILE ON WALL STREET

Tony Volpon: As três surpresas de Donald Trump

10 de março de 2025 - 20:00

Quem estudou seu primeiro governo ou analisou seu discurso de campanha não foi muito eficiente em prever o que ele faria no cargo, em pelo menos três dimensões relevantes

VISÃO 360

Dinheiro é assunto de mulher? A independência feminina depende disso

9 de março de 2025 - 7:50

O primeiro passo para investir com inteligência é justamente buscar informação. Nesse sentido, é essencial quebrar paradigmas sociais e colocar na cabeça de mulheres de todas as idades, casadas, solteiras, viúvas ou divorciadas, que dinheiro é assunto delas.

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Na esperança de marcar o 2º gol antes do 1º

5 de março de 2025 - 20:01

Se você abre os jornais, encontra manchetes diárias sobre os ataques de Donald Trump contra a China e contra a Europa, seja por meio de tarifas ou de afrontas a acordos prévios de cooperação

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Um Brasil na mira de Trump

26 de fevereiro de 2025 - 20:00

Temos razões para crer que o Governo brasileiro está prestes a receber um recado mais contundente de Donald Trump

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Eu gostaria de arriscar um palpite irresponsável

19 de fevereiro de 2025 - 20:01

Vai demorar para termos certeza de que o último período de mazelas foi superado; quando soubermos, porém, não restará mais tanto dinheiro bom na mesa

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Tenha muito do óbvio, e um pouco do não óbvio

12 de fevereiro de 2025 - 20:00

Em um histórico dos últimos cinco anos, estamos simplesmente no patamar mais barato da relação entre preço e valor patrimonial para fundos imobiliários com mandatos de FoFs e Multiestratégias

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: Isso não é 2015, nem 1808

10 de fevereiro de 2025 - 20:00

A economia brasileira cresce acima de seu potencial. Se a procura por camisetas sobe e a oferta não acompanha, o preço das camisetas se eleva ou passamos a importar mais. Não há milagre da multiplicação das camisetas.

EXILE ON WALL STREET

Tony Volpon: O paradoxo DeepSeek

3 de fevereiro de 2025 - 20:01

Se uma relativamente pequena empresa chinesa pode desafiar as grandes empresas do setor, isso será muito bom para todos – mesmo se isso acabar impactando negativamente a precificação das atuais gigantes do setor

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: IPCA 2025 — tem gosto de catch up ou de ketchup mais caro?

29 de janeiro de 2025 - 20:31

Se Lula estivesse universalmente preocupado com os gastos fiscais e o descontrole do IPCA desde o início do seu mandato, provavelmente não teria que gastar tanta energia agora com essas crises particulares

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Um ano mais fácil (de analisar) à frente

18 de dezembro de 2024 - 20:00

Não restam esperanças domésticas para 2025 – e é justamente essa ausência que o torna um ano bem mais fácil de analisar

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Às vésperas da dominância fiscal

11 de dezembro de 2024 - 15:00

Até mesmo os principais especialistas em macro brasileira são incapazes de chegar a um consenso sobre se estamos ou não em dominância fiscal, embora praticamente todos concordem que a política monetária perdeu eficácia, na margem

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Precisamos sobre viver o “modo sobrevivência”

4 de dezembro de 2024 - 20:00

Não me parece que o modo sobrevivência seja a melhor postura a se adotar agora, já que ela pode assumir contornos excessivamente conservadores

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Banda fiscal no centro do palco é sinal de que o show começou

27 de novembro de 2024 - 16:01

Sequestrada pela política fiscal, nossa política monetária desenvolveu laços emocionais profundos com seus captores, e acabou por assimilar e reproduzir alguns de seus traços mais viciosos

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: O Brasil (ainda não) voltou — mas isso vai acontecer

18 de novembro de 2024 - 20:00

Depois de anos alijados do interesse da comunidade internacional, voltamos a ser destaque na imprensa especializada. Para o lado negativo, claro

EXILE ON WALL STREET

Felipe Miranda: Não estamos no México, nem no Dilma 2

7 de outubro de 2024 - 20:00

Embora algumas analogias de fato possam ser feitas, sobretudo porque a direção guarda alguma semelhança, a comparação parece bastante imprecisa

EXILE ON WALL STREET

Rodolfo Amstalden: Brasil com grau de investimento: falta apenas um passo, mas não qualquer passo

2 de outubro de 2024 - 14:40

A Moody’s deixa bem claro qual é o passo que precisamos satisfazer para o Brasil retomar o grau de investimento: responsabilidade fiscal

EXILE ON WALL STREET

Tony Volpon: O improvável milagre do pouso suave americano

30 de setembro de 2024 - 20:03

Powell vendeu ao mercado um belo sonho de um pouso suave perfeito. Temos que estar cientes que é isso que os mercados hoje precificam, sem muito espaço para errar.

Menu

Usamos cookies para guardar estatísticas de visitas, personalizar anúncios e melhorar sua experiência de navegação. Ao continuar, você concorda com nossas políticas de cookies

Fechar