Porcentagem do CDI: uma âncora dos fundos de crédito e multimercados
A ancoragem é um viés cognitivo que temos ao nos basearmos ou nos apegarmos de forma intensa a uma informação quando tomamos uma decisão
“Muitos fenômenos da psicologia podem ser demonstrados experimentalmente, mas poucos podem de fato ser medidos. O efeito de âncoras é uma exceção.”
Esse trecho foi retirado do livro “Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar”, de Daniel Kahneman. Apesar de dispensar apresentações para os três leitores mais assíduos desta newsletter, Kahneman é professor de Psicologia, vencedor do prêmio Nobel de Economia de 2002 e referência em finanças comportamentais. Na obra, ele também apresenta seus estudos e medições de como o efeito de ancoragem afeta nossas decisões e pensamentos.
A ancoragem é um viés cognitivo que temos ao nos basearmos ou nos apegarmos de forma intensa a uma informação quando tomamos uma decisão. Para ilustrar melhor, um dos exemplos citados no livro de Kahneman é um caso em que visitantes do museu Exploratorium, em São Francisco (EUA), foram informados sobre os danos ambientais causados pelos petroleiros no Oceano Pacífico.
Depois, perguntava-se sobre sua predisposição de fazer uma contribuição anual para ajudar a salvar 50 mil aves marinhas prejudicadas até que esses vazamentos pudessem ser impedidos ou os culpados responsabilizados. A pesquisa separou os entrevistados em três grupos principais:
- Âncora baixa: perguntava-se se a pessoa estava disposta a doar US$ 5.
- Sem âncora: nenhum valor era mencionado.
- Âncora alta: sugeriam-se valores extravagantes, como US$ 400.
Como resultado, o primeiro grupo estava disposto a doar, em média, US$ 20. O segundo, US$ 64. E, no terceiro, a média subiu para US$ 143.
O simples fato de se mencionar um número na pergunta fez com que as pessoas estivessem dispostas a contribuir com valores completamente diferentes.
Leia Também
A polarização do mercado financeiro, criptomoedas fecham semana no vermelho e outros destaques
Além do yin-yang: Vale a pena deixar os fundos para investir em renda fixa?
E o mesmo pode acontecer com expectativas de retorno de investimentos.
Considere o caso A, em que um fundo de crédito rendeu, nos últimos seis anos, o equivalente a 110% do CDI. Quanto você esperaria ganhar a partir de 2020?
Agora, pense no caso B: um fundo de crédito rendeu, em média, CDI + 1% ao ano no mesmo período e pode continuar com o mesmo retorno. Você o consideraria bom ou ruim?
Os casos A e B parecem completamente diferentes, mas você já percebeu que, com um CDI de 10%, o CDI + 1% foi equivalente a 110% do benchmark?
Nos últimos seis anos, a Selic média foi de 9,5% ao ano, como você pode ver abaixo no gráfico da esquerda. Se interpretarmos que a ata do Copom deu a entender que o BC não subirá a taxa básica de juros até 2021, o fundo que conseguir manter a média passada de excesso sobre o benchmark (isto é, CDI + 1%) deve ter um retorno equivalente a 150% do CDI.
De onde vem essa média de CDI + 1% dos fundos de crédito? Do famoso spread que embute os riscos relacionados ao não pagamento (default), à qualidade das garantias e a fatores de liquidez.
De acordo com Idex-CDI, índice de debêntures criado pela JGP, o spread de crédito (linha verde) no primeiro semestre de 2019 estava bem baixo, menos de 1% ao ano. Com a crise de liquidez que começou no segundo semestre, os spreads começaram a se abrir, atingindo a marca de quase 1,5%, o que já era incomum.
Com a pandemia de Covid-19, os spreads abriram ainda mais, alcançando, no pico, quase CDI + 5% ao ano. Desde então, eles se fecharam, chegando aos níveis atuais, ainda altos, de 2,6% ao ano.
É importante lembrar que um fundo de crédito não investe apenas em debêntures, existem outros ativos da categoria que servem como diversificação e como fontes alternativas de retorno que podem ser utilizadas para aumentar o resultado da carteira.
Se o fundo de crédito que rendia 110% do CDI continuar tendo um desempenho médio próximo a CDI + 1% ao ano ao longo do tempo, para onde poderá ir um multimercado que apresentava retornos entre 120% e 130% do CDI?
Provavelmente uma pergunta melhor seria: qual é o objetivo de retorno do multimercado?
Ao contrário do senso comum, os gestores não costumam usar a porcentagem do CDI para definir suas metas pessoais de performance, e sim o CDI + X% ao ano, sendo que “X” não é um valor inventado. Embora o processo seja mais complicado do que vou descrever, essa meta pessoal é derivada de uma medida de risco-retorno chamada índice de Sharpe.
Embora os assinantes da série Os Melhores Fundos já saibam que preferimos o índice de Sortino para análises de risco-retorno — por usar uma medida de risco mais adequada do que a volatilidade tradicional —, o Sharpe é mais simples e muito mais utilizado no mercado por ser de mais fácil interpretação.
Criado por William Sharpe, vencedor do Nobel de Economia de 1990, o índice mede a relação entre o retorno do fundo acima do seu benchmark e sua volatilidade, facilitando a comparação com outras carteiras. Portanto, quanto maior o Sharpe, mais eficiente é a estratégia. O Santo Graal desse índice ocorre quando o fundo consegue se manter acima de 1, pois, para cada unidade de risco, ele estaria entregando mais de uma unidade de retorno sobre o referencial.
Dessa forma, um gestor com volatilidade de 6%, para ter um Sharpe igual a 1, precisaria entregar CDI + 6% ao ano. É aí que a brincadeira fica séria, pois superar essa meta não é tarefa fácil. Selecionando 138 fundos multimercados com pelo menos três anos de existência e, fazendo uma média de seu Sharpe para diferentes janelas, chegamos à tabela abaixo:
Apenas 20 fundos conseguiram Sharpe superior a 1 nos últimos 36 meses. Os 7 fundos que conseguiram a mesma façanha em 60 meses também fazem parte desse grupo de 20.
Se assumirmos que o Sharpe médio dos últimos 36 meses vai se manter constante, a tabela abaixo simula quais seriam os retornos para fundos de diferentes volatilidades:
Se assumirmos que o Sharpe médio dos últimos 36 meses vai se manter constante, a tabela abaixo simula quais seriam os retornos para fundos de diferentes volatilidades:
Um retorno de CDI + 3,25% ao ano, que é o esperado para esse Sharpe com uma volatilidade de 6%, já é bom. Nos últimos três anos, os multimercados sugeridos na série Os Melhores Fundos de Investimento tiveram volatilidade média de 5,9% com Sharpe de 0,69, chegando à média de CDI + 4,07% ao ano, o que é ainda melhor. No entanto, não há garantia de que isso continue acontecendo.
Minha intenção não é criar uma nova ancoragem, meu único objetivo é mostrar que os alfas gerados por essas classes não necessariamente foram impactados da forma como você pode estar imaginando.
Enquanto números representam o passado e o que já aconteceu — e não o que teria acontecido —, os gestores responsáveis por essas estratégias estão vivendo um momento único em 2020.
Novas oportunidades lucrativas no mercado de crédito podem surgir, alguns multimercados vão se aventurar em novas classes de ativo ou regiões, outros verão necessidade de aumentar sua volatilidade. Provavelmente, muitos deles vão explorar cada vez mais estratégias quantitativas, seja como auxílio no acompanhamento do mercado, seja na gestão em si, como é o caso dos fundos sistemáticos.
De todas as mudanças possíveis nessas classes, esperamos uma delas com muita ansiedade. Além do risco de criar um efeito de ancoragem, é muito estranho abrir um e-mail que mostra o retorno dos fundos em % do CDI e a carta da gestora só falar em excesso do benchmark.
Gestores, quem será o primeiro a divulgar as lâminas em CDI +?
Precisamos falar sobre indicadores antecedentes: Saiba como analisar os índices antes de investir
Com o avanço da tecnologia, cada vez mais fundos de investimentos estão utilizando esses indicadores em seus modelos — e talvez a correlação esteja caindo
Rodolfo Amstalden: Encaro quase como um hedge
Tenho pensado cada vez mais na importância de buscar atividades que proporcionem feedbacks rápidos e causais. Elas nos ajudam a preservar um bom grau de sanidade
Day trade na B3: Oportunidade de lucro de mais de 4% com ações da AES Brasil (AESB3); confira a recomendação
Identifiquei uma oportunidade de swing trade baseada na análise quant – compra dos papéis da AES Brasil (AESB3). Saiba os detalhes
Setembro em tons de vermelho: Confira todas as notícias que pesam nos mercados e impactam seus investimentos hoje
O mês de setembro começa com uma imensa mancha de tinta vermelha sobre a tela das bolsas mundiais, sentindo o peso do Fed, da inflação recorde na zona do euro e do lockdown em Chengdu
A febre dos NFTs passou, mas esta empresa está ganhando dinheiro com eles até hoje
Saiba quem foram os vendedores de pás da corrida do ouro dos NFTs e o que isso nos ensina para as próximas ondas especulativas
Balanço de agosto, o Orçamento de 2023 e outros destaques do dia
A alta de 6,16% do Ibovespa em agosto afastou o rótulo de “mês do desgosto”, mas ainda assim deixou um sabor amargo na boca. Isso porque depois de disparar mais de 10% ainda na primeira quinzena, impulsionado pela volta do forte fluxo de capital estrangeiro, as últimas duas semanas foram comandadas pela cautela. Uma dupla […]
Day trade na B3: Oportunidade de lucro acima de 4% com ações da Marcopolo (POMO4); confira a recomendação
Identifiquei uma oportunidade de swing trade baseada na análise quant – compra dos papéis da Marcopolo (POMO4). Saiba mais detalhes
Tente outra vez: basta desejar profundo para ver a bolsa subir? Confira tudo o que mexe com os seus investimentos hoje
Em queda desde a sexta-feira, as bolsas de valores estrangeiras começaram o dia em busca de recuperação singela. Por aqui, investidores procuram justificativas para descolar o Ibovespa de Wall Street
Commodities derrubam Ibovespa, Itaú BBA rebaixa a Petrobras (PETR4) e as mudanças na WEG (WEGE3); confira os destaques do dia
As últimas levas de notícias que chegam de todas as partes do mundo parecem ter jogado os investidores dentro de um labirinto de difícil resolução em que apenas a cautela pode ser utilizada como arma. O emaranhado de corredores a serem percorridos não só são longos, como também parecem estar sempre mudando de posição — […]
Gringos estão de olho no Ibovespa, mas investidor local parece sem apetite pela bolsa brasileira. Qual é a melhor estratégia?
É preciso ir contra o consenso para gerar retornos acima da média, mesmo que isso signifique correr o risco de estar errado
Entenda por que você não deve acompanhar só quem possui teses de investimento iguais às suas
Parte fundamental do estudo de uma ação é entender não só a cabeça de quem tem uma tese que vá em linha com a sua, mas também a de quem pensa o contrário
Day trade na B3: Oportunidade de lucro acima de 11% com ações da Santos Brasil (STBP3); confira a recomendação
Identifiquei uma oportunidade de swing trade baseada na análise quant – compra dos papéis da Santos Brasil (STBP3). Saiba os detalhes
Uma pausa para respirar: Confira todas as notícias que movimentam os mercados e impactam seus investimentos hoje
A saída da atual crise inflacionária norte-americana passa necessariamente por algum sacrifício. Hoje, porém, as bolsas fazem uma pausa para respirar
Aperte os cintos: o Fed praticamente acabou com as teses de crescimento, e o fim do bear market rally está aí
Saída da atual crise inflacionária passa por algum sacrifício. Afinal, estamos diante de um ciclo econômico clássico e será preciso esfriar o mercado de trabalho
Ibovespa se descola da gringa, Itaú entra na disputa das vendas virtuais e a estratégia de Bolsonaro para os debates; confira os destaques do dia
Em Wall Street, o alerta do Federal Reserve de que o aperto monetário pode ser mais intenso do que o esperado penalizou as bolsas lá fora
Complacência: Entenda por que é melhor investir em ativos de risco brasileiros do que em bolsa norte-americana
Uma das facetas da complacência é a tendência a evitar conflitos e valorizar uma postura pacifista, num momento de remilitarização do mundo, o que pode ser enaltecido agora
Day trade na B3: Oportunidade de lucro acima de 5% com ações do Grupo Pão de Açúcar (PCAR3); confira a recomendação
Identifiquei uma oportunidade de swing trade baseada na análise quant – compra dos papéis do Grupo Pão de Açúcar (PCAR3). Veja os detalhes
Mercados, debate presidencial e um resultado inesperado: Confira todas as notícias que mexem com os seus investimentos hoje
Com a percepção de que o Fed optará pelo combate à inflação a todos os custos, os últimos dias de agosto não devem trazer alívio para os mercados financeiros. O Ibovespa ainda repercute o primeiro debate entre presidenciáveis
Por que saber demais pode tornar você um péssimo chefe
Apesar de desenvolvermos uma compreensão mais sofisticada da realidade como adultos, tendemos a cair em armadilhas com muito mais frequência do que gostaríamos de admitir
Wall Street tomba com Powell, os melhores momentos de Lula e Bolsonaro no Jornal Nacional e outros destaques do dia
Desde que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) anunciou o início da retirada dos estímulos monetários adotados na pandemia, durante o simpósio de Jackson Hole de 2021, o mercado financeiro global já se viu obrigado inúmeras vezes a recalcular a rota, e todas elas parecem levar a um destino ainda incerto, mas muito […]