Copom começa a decidir a Selic — a morte da renda fixa?
Não podemos mais contar com o paraíso do CDI, aquela Pasárgada em que, sem levantar do sofá e sem risco algum, ganhávamos 10%, 15%, 20% ao ano. Essa jaboticaba não existe mais
“Meus pais sempre foram muito preocupados. Havia uma percepção nos dois de que algo ruim estaria na iminência de acontecer. Eu não sei o quanto disso é uma carga genética e o quanto é derivado de uma reação à ansiedade deles, mas eu sempre fui o oposto disso. Com poucas exceções na minha vida, eu nunca fui muito preocupado com o futuro, e eu nunca tive muito medo em tentar algo e eventualmente acabar falhando.
Conforme eu cresci, percebi mais claramente a decepção do meu pai consigo mesmo. Ele teve uma vida que não foi satisfatória para si e foi um fracasso aos seus próprios olhos. Isso em parte explica porque ele nos cobrava tanto e exigia que fôssemos tão produtivos, de um jeito que ele mesmo nunca fora.”
Esse é um trecho do livro “The Ride of a Lifetime”, de Robert Iger, por 15 anos CEO da Disney. Foi porcamente traduzido por mim e eu peço desculpas por isso — peço também desculpas aos “porcos” por usar esse termo; espero que não se ofendam, pois, para mim, o ESG nada tem a ver com isso. A Gabi me encaminhou, falando que tinha a ver comigo — não sei se ela está certa; normalmente, ela está. De todo modo, achei inspirador e apropriado para o momento.
Nesta terça-feira, o Copom inicia sua reunião para atualizar a política monetária brasileira. A expectativa majoritária é de que o comitê reduza a taxa Selic em mais 25 pontos-base, para 2% ao ano. Com isso, somos levados de forma inexorável a conviver com mares nunca dantes navegados. O Brasil e seus investidores nunca tiveram taxas de juros tão baixas. Querendo ou não, somos obrigados a tentar algo novo para nossos investimentos se quisermos preservar os rendimentos históricos ou algo perto disso.
A mensagem é de que não precisamos ter medo, apenas encarar a realidade com a responsabilidade que ela exige. De um lado, não podemos mais contar com o paraíso do CDI, aquela Pasárgada em que, sem levantar do sofá e sem risco algum, ganhávamos 10%, 15%, 20% ao ano. Essa jaboticaba não existe mais — se é sua extinção definitiva ou apenas uma entressafra, só o tempo vai dizer (espero também que a jaboticaba não se ofenda).
Há uma interpretação rasa e, em alguns fóruns, permanente de que a Selic a 2% representaria a morte da renda fixa. Entendo ser exatamente o contrário: o juro tão baixo implica o nascimento de um mercado pujante, com profundidade, líquido e mais transparente de renda fixa, que envolva não somente uma grande concentração em títulos pós-fixados e de curto prazo. Assistiremos a um movimento gradual de ganho de liquidez e representatividade em papéis mais longos, desenvolvimento de títulos de dívida corporativa, possibilidade de menores spreads e mais transparência, além do florescer, num segundo momento, de um mercado de ilíquidos no Brasil (mas essa é outra história).
Leia Também
A polarização do mercado financeiro, criptomoedas fecham semana no vermelho e outros destaques
Além do yin-yang: Vale a pena deixar os fundos para investir em renda fixa?
Comecemos do básico: em dias circunscritos às reuniões do Copom, é comum ser perguntado com algo do tipo: “Dada a queda da Selic, onde aplico meu colchão de liquidez, minha reserva de caixa?”.
A resposta é bastante simples: no mesmo lugar. Essa sua reserva existe para emergências e para, eventualmente, aproveitar certas oportunidades hediondas que, de tempos em tempos, o mercado oferece a partir de correções exageradas. Todos devemos carregar um pouco de caixa nos portfólios. E o caixa não é para você ganhar dinheiro em cima dele. O Brasil era uma excrescência, em que o investidor era remunerado de forma abissal no CDI, com liquidez diária e com total liquidez — isso não existe. Feliz ou infelizmente, acabou. O que o investidor pode e, em alguma medida, deve fazer é destinar o excedente da sua reserva de emergência para outras aplicações mais arriscadas, atrás de mais retorno potencial.
Talvez um dos três leitores possa perguntar: “De quanto é esse excedente?”. Tipicamente, sugere-se algo como de três a doze meses de seus gastos mensais para esse colchão de liquidez, variando conforme tolerância a risco, horizonte temporal e estabilidade financeira do sujeito. Acima disso, podemos adentrar o universo de ativos de risco.
Superada essa questão inicial, há outra um pouco (não muito) mais sutil. Os pseudogurus, hoje se multiplicando como gremlins na água, costumam dizer que a queda da Selic fere de morte a renda fixa e implica enorme migração para as ações, supostamente o único destino possível do investidor, ávido por algum retorno.
Embora seja, ceteris paribus, verdadeira a afirmação de que a renda variável ganha atratividade sobre a fixa num ambiente Selic menor, essa é apenas parte da histórica. Existem ao menos outras duas consequências do juro básico no seu menor nível.
A primeira é o chamado “alongamento do duration”. A renda fixa não é a Selic, nem o CDI. Essa é apenas uma das várias possibilidades dentro da renda fixa. Com o CDI menor, investidores vão atrás de alternativas para ter mais rentabilidade mesmo dentro da renda fixa, comprando títulos soberanos de prazos mais longos, caso esses venham a oferecer retorno mais atraente sob um risco controlado, e/ou papéis de dívida corporativa.
Neste ponto, há algo especialmente interessante no momento. Por muito tempo, o mercado ficou debruçado sobre os juros curtos (títulos de vencimento mais próximo, neste ou no próximo ano). Obviamente, há muito mais visibilidade sobre isso do que sobre o médio e o longo prazo. Então, os gestores costumam preferir operar o juro curto e se alavancar em cima dessa oportunidade quando ela existe. Agora, porém, com o Copom sacramentando o corte de 25 pontos-base, basicamente se encerra o jogo no juro curto (ou algo muito perto disso). Assim, precisaremos olhar para a parte intermediária e longa da curva de juros. Em fazendo isso, minha interpretação é de que veremos estimativas hoje contempladas na curva que implicam juros subindo muito e muito rápido. Resumo da história: vejo oportunidades em prefixados e indexados na parte intermediária e longa da curva. O meio da curva traz muito menos risco, claro, em especial diante da complicada situação fiscal brasileira, mas a porrada mesmo (com mais risco, cuidado!) estaria no longo.
Além do duration maior nos títulos soberanos, devemos observar um ganho de liquidez e maior profundidade nos papéis de dívida corporativa, como já vemos nos países desenvolvidos. Em particular, com a onda ESG e a representatividade brasileira no tema ambiental, encontramos muitas possibilidades nos chamados “green bonds” — veja, por exemplo, o que acaba de acontecer com a Rumo.
Mesmo pessoas que historicamente não gostavam do prêmio de risco de crédito no Brasil começam a olhar com mais carinho para esses papéis. Em podcast recente na InfoMoney, por exemplo, o competente gestor Luiz Parreiras, da Verde Asset, foi um dos que citou essa evolução de olhar sobre a renda fixa corporativa brasileira.
Outro desdobramento importante da queda da Selic, além da migração para as ações, do maior espaço para dívida privada e do alongamento dos durations (prazos médios dos títulos), é a maior internacionalização de nossas carteiras. Objetivamente, o “home bias” (a tendência a se investir em demasia em ativos do país de origem) existe em qualquer lugar do mundo. No Brasil, porém, isso acontece com ainda maior intensidade. Talvez a baixa educação financeira cumpra um papel nisso. Pode ser. Contudo, era muito difícil convencer qualquer cidadão a aplicar lá fora com o CDI aqui rodando a 15%-20% — quem quer ligar contra si um taxímetro de 1% ao mês? Agora, o jogo é outro.
Que tal um bond do Itaú pagando 5% ao ano em dólar? Ou Banco do Brasil a 6%? Ou mesmo o aproveitamento de outros papéis soberanos lá fora? Veja na tabela abaixo como existe hoje uma oportunidade de se aplicar na renda fixa mexicana, cujos juros seguem muito altos, mesmo diante de uma depressão do PIB, de uma inflação bem comportada e de um rating soberano bastante razoável:
Em linhas gerais, são mensagens positivas, de desenvolvimento e sofisticação do mercado e do investidor. Para fazer a ponderação típica de um cético, a antítese à tese otimista é que, para chegarmos lá de verdade, precisaremos avançar muito em taxas e transparência ao investidor. O que hoje se paga de spread na renda fixa e no câmbio no Brasil, por vezes, é um assalto.
Uma vez, conversei com um grande banqueiro brasileiro, que me disse assim: “Felipe, você não sabe o que se ganha de dinheiro no ‘cambiozinho’, essas remessas de 700 mil, 900 mil por dia”. A turma não aceita pagar R$ 5 de corretagem, mas paga spread de 7% no dólar sem ver.
Na renda fixa, muitas vezes a maior parte da remuneração fica com o distribuidor ou estruturador da operação. Algumas perguntas, que costumam valer mais do que as respostas, ficam no ar: i) por que não há “pedra” (livro de ofertas de compra e venda) dos papéis de renda fixa no Brasil? Por que o investidor não pode ver isso com a mesma transparência das ações? e ii) as corretoras que estão prometendo dar alternativas para mitigar o conflito de interesses do agente autônomo, que ficaram mais claros a partir da campanha publicitária do Itaú, vão também tabelar os spreads na renda fixa? Ou nunca saberemos se, naquele título específico, o distribuidor está levando uma querela mais gorda?
Da minha parte, tenho mais dúvidas do que certezas. Ainda bem.
Precisamos falar sobre indicadores antecedentes: Saiba como analisar os índices antes de investir
Com o avanço da tecnologia, cada vez mais fundos de investimentos estão utilizando esses indicadores em seus modelos — e talvez a correlação esteja caindo
Rodolfo Amstalden: Encaro quase como um hedge
Tenho pensado cada vez mais na importância de buscar atividades que proporcionem feedbacks rápidos e causais. Elas nos ajudam a preservar um bom grau de sanidade
Day trade na B3: Oportunidade de lucro de mais de 4% com ações da AES Brasil (AESB3); confira a recomendação
Identifiquei uma oportunidade de swing trade baseada na análise quant – compra dos papéis da AES Brasil (AESB3). Saiba os detalhes
Setembro em tons de vermelho: Confira todas as notícias que pesam nos mercados e impactam seus investimentos hoje
O mês de setembro começa com uma imensa mancha de tinta vermelha sobre a tela das bolsas mundiais, sentindo o peso do Fed, da inflação recorde na zona do euro e do lockdown em Chengdu
A febre dos NFTs passou, mas esta empresa está ganhando dinheiro com eles até hoje
Saiba quem foram os vendedores de pás da corrida do ouro dos NFTs e o que isso nos ensina para as próximas ondas especulativas
Balanço de agosto, o Orçamento de 2023 e outros destaques do dia
A alta de 6,16% do Ibovespa em agosto afastou o rótulo de “mês do desgosto”, mas ainda assim deixou um sabor amargo na boca. Isso porque depois de disparar mais de 10% ainda na primeira quinzena, impulsionado pela volta do forte fluxo de capital estrangeiro, as últimas duas semanas foram comandadas pela cautela. Uma dupla […]
Day trade na B3: Oportunidade de lucro acima de 4% com ações da Marcopolo (POMO4); confira a recomendação
Identifiquei uma oportunidade de swing trade baseada na análise quant – compra dos papéis da Marcopolo (POMO4). Saiba mais detalhes
Tente outra vez: basta desejar profundo para ver a bolsa subir? Confira tudo o que mexe com os seus investimentos hoje
Em queda desde a sexta-feira, as bolsas de valores estrangeiras começaram o dia em busca de recuperação singela. Por aqui, investidores procuram justificativas para descolar o Ibovespa de Wall Street
Commodities derrubam Ibovespa, Itaú BBA rebaixa a Petrobras (PETR4) e as mudanças na WEG (WEGE3); confira os destaques do dia
As últimas levas de notícias que chegam de todas as partes do mundo parecem ter jogado os investidores dentro de um labirinto de difícil resolução em que apenas a cautela pode ser utilizada como arma. O emaranhado de corredores a serem percorridos não só são longos, como também parecem estar sempre mudando de posição — […]
Gringos estão de olho no Ibovespa, mas investidor local parece sem apetite pela bolsa brasileira. Qual é a melhor estratégia?
É preciso ir contra o consenso para gerar retornos acima da média, mesmo que isso signifique correr o risco de estar errado
Entenda por que você não deve acompanhar só quem possui teses de investimento iguais às suas
Parte fundamental do estudo de uma ação é entender não só a cabeça de quem tem uma tese que vá em linha com a sua, mas também a de quem pensa o contrário
Day trade na B3: Oportunidade de lucro acima de 11% com ações da Santos Brasil (STBP3); confira a recomendação
Identifiquei uma oportunidade de swing trade baseada na análise quant – compra dos papéis da Santos Brasil (STBP3). Saiba os detalhes
Uma pausa para respirar: Confira todas as notícias que movimentam os mercados e impactam seus investimentos hoje
A saída da atual crise inflacionária norte-americana passa necessariamente por algum sacrifício. Hoje, porém, as bolsas fazem uma pausa para respirar
Aperte os cintos: o Fed praticamente acabou com as teses de crescimento, e o fim do bear market rally está aí
Saída da atual crise inflacionária passa por algum sacrifício. Afinal, estamos diante de um ciclo econômico clássico e será preciso esfriar o mercado de trabalho
Ibovespa se descola da gringa, Itaú entra na disputa das vendas virtuais e a estratégia de Bolsonaro para os debates; confira os destaques do dia
Em Wall Street, o alerta do Federal Reserve de que o aperto monetário pode ser mais intenso do que o esperado penalizou as bolsas lá fora
Complacência: Entenda por que é melhor investir em ativos de risco brasileiros do que em bolsa norte-americana
Uma das facetas da complacência é a tendência a evitar conflitos e valorizar uma postura pacifista, num momento de remilitarização do mundo, o que pode ser enaltecido agora
Day trade na B3: Oportunidade de lucro acima de 5% com ações do Grupo Pão de Açúcar (PCAR3); confira a recomendação
Identifiquei uma oportunidade de swing trade baseada na análise quant – compra dos papéis do Grupo Pão de Açúcar (PCAR3). Veja os detalhes
Mercados, debate presidencial e um resultado inesperado: Confira todas as notícias que mexem com os seus investimentos hoje
Com a percepção de que o Fed optará pelo combate à inflação a todos os custos, os últimos dias de agosto não devem trazer alívio para os mercados financeiros. O Ibovespa ainda repercute o primeiro debate entre presidenciáveis
Por que saber demais pode tornar você um péssimo chefe
Apesar de desenvolvermos uma compreensão mais sofisticada da realidade como adultos, tendemos a cair em armadilhas com muito mais frequência do que gostaríamos de admitir
Wall Street tomba com Powell, os melhores momentos de Lula e Bolsonaro no Jornal Nacional e outros destaques do dia
Desde que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) anunciou o início da retirada dos estímulos monetários adotados na pandemia, durante o simpósio de Jackson Hole de 2021, o mercado financeiro global já se viu obrigado inúmeras vezes a recalcular a rota, e todas elas parecem levar a um destino ainda incerto, mas muito […]