B3: Habitada por um deus
Mais do que o comportamento positivo pontual, é a confirmação de certas teses de investimento e de tendências estruturais que me traz grande motivação

Quando os gregos antigos viam uma pessoa com luz própria muito forte entrar num ambiente ou destacar-se numa conversa, usavam a expressão “en + theos” para defini-la. Era a ideia de que o sujeito estava habitado por um deus — opto pela letra minúscula não por desrespeito a Ele, mas pela referência politeísta.
Essa é a etimologia de “entusiasmo”, que chegou a ser considerada a palavra da moda durante o Renascimento na Europa, quando a saída das trevas do feudalismo e o desenvolvimento científico e artístico abriram espaço para um mundo novo, apoiado em pesquisa e empreendedorismo.
Não há palavra melhor para caracterizar meu estado de espírito no começo desta semana.
Poderia começar pelo flerte do MSCI World com novo recorde histórico. Sem dúvida, máximas históricas para as Bolsas globais me animam. Mas não é só isso. Mais até do que o comportamento positivo pontual, é a confirmação de certas teses de investimento e de tendências estruturais que me traz grande motivação.
O primeiro ponto é a volta do estrangeiro à Bolsa brasileira, depois de muito tempo ausente. Nos primeiros dez dias de novembro, o ingresso líquido de recurso gringo monta a R$ 12,7 bilhões. Somente no dia 10, a entrada líquida foi de R$ 4,9 bilhões, maior aporte diário desde agosto de 2011. No dia 9, o saldo líquido já havia sido recorde, em R$ 4,5 bilhões. No ano, o fluxo ainda é negativo em R$ 72 bilhões, mas a inversão de tendência chama atenção e sugere prováveis novas entradas à frente, porque a dinâmica dessa turma costuma ser aglomerada em clusters e dificilmente posições grandes são montadas em apenas poucos dias.
Gringo faz preço e pode ser o catalisador para um rali de fim de ano superior mesmo às estimativas mais otimistas. O comportamento está alinhado com a visão de que a eleição de Joe Biden poderia representar enfraquecimento do dólar e retomada do interesse por ativos emergentes. As notícias favoráveis de uma vacina contra a Covid-19 e, na margem, o menor barulho sobre a política fiscal brasileira frente ao observado em setembro e outubro corroboram o argumento.
Leia Também
Rodolfo Amstalden: Escute as feras
Felipe Miranda: Do excepcionalismo ao repúdio
A segunda questão relevante se refere ao maior dinamismo da economia doméstica. O IBC-Br de setembro subiu 1,29%, contra estimativas de alta de 1%. A referência, combinada a outras já divulgadas, claro, disparou uma série de revisões para o PIB brasileiro no terceiro trimestre. O Credit Suisse subiu sua estimativa de 7% para 9,1%; o UBS, de 8,5% para 9,5%; o Barclays, de 8% para 8,7%. Já o Itaú levou sua expectativa para o PIB em 2020 de -4,5% para -4,1%; para 2021, subiu de 3,5% para 4%.
Além de um movimento importante em si, essa melhora nas projeções de crescimento da economia traz desencadeamentos relevantes para os ativos de risco. Primeiro no sentido de traçar melhor prognóstico para a dinâmica da dívida pública brasileira. Se o PIB cresce mais rápido, a razão dívida/PIB fica menos pressionada. Em paralelo, mais PIB significa mais arrecadação pública e menor déficit orçamentário. Cai a percepção de risco sobre o país como um todo, com impactos significativos sobre os mercados. Não quero, com isso, passar a impressão de que dou por superados nossos problemas fiscais. Passa longe de ser o caso. Mas, na margem, estamos melhores agora frente às preocupações mais intensas dos últimos meses, dada a recuperação mais acentuada da economia. Ativos se movem justamente a partir das informações na margem, das novidades.
Ainda dentro desse espectro, a revisão das projeções para o PIB enseja provável revisão também das estimativas para os lucros corporativos, que, por sua vez, resultam em preços-alvo maiores para as ações. Esse processo de revisão de expectativas pelos analistas é normalmente um driver importante para as ações.
Por fim, preciso falar do ambiente corporativo propriamente dito. Estávamos com a tese de que os resultados do terceiro trimestre seriam bons e mostrariam uma recuperação mais intensa do que o pressuposto pelo consenso. Com efeito, os números, em geral, têm superado as nossas projeções mais otimistas.
Na semana passada, tivemos a confirmação de algumas teses importantes nossas nessa direção.
Mitre superou as projeções de consenso da primeira à última linha, confirmando a tese de crescimento e muito valor lá na frente.
B3, a despeito de não ter encontrado reação favorável ao resultado, mostrou números muito fortes e também um pouco acima das projeções, com receita crescendo 35% ao ano, para um case de grande alavancagem operacional. A companhia cresce mais rápido do que pares internacionais e negocia cerca de 20% mais barata.
Yduqs mostrou dinâmica de resultados incomparável a Cogna ou Ser. Direção clara e empresa na mão, management de qualidade, com sinalização importante de que o pior ficou para trás. Drivers de crescimento notáveis com medicina e integração da Adtalem, com opcionalidade brutal vindo do digital e de eventual M&A. Tive a oportunidade de conversar com o management da companhia e me senti especialmente confortável com o case, absurdamente depreciado em Bolsa e um dos grandes beneficiados do processo de reabertura das economias.
Natura simplesmente voou, com uma performance muito forte da marca no Brasil e na América Latina, além de Aesop e The Body Shop. Isso com Avon ainda sem estar tão azeitada. Se conseguir levar para a Avon margem parecida com aquela da marca Natura, é para dobrar aqui.
Oi confirma seu turnaround executado sem falhas, com explosão da receita vinda de fibra e boa expansão de margem Ebitda. Consumo de caixa reduzindo bem e empresa na iminência de vender ativos. Confirmação da venda da operação móvel e ofertas firmes pela InfraCo podem vir ainda este ano, o que, se efetivamente rolar, poderia levar a ação para cima de R$ 2,30.
E para não esquecer do longo prazo, termino hoje com um lembrete sobre previdência e o quanto você vai pagar de imposto no ano que vem. Se você, assim como eu, recebeu juros do Tesouro Direto na conta nesta segunda-feira, talvez possa considerar fazer um plano PGBL, com vistas a pagar menos Imposto de Renda, caso você faça a declaração completa, dado o abatimento de até 12% da renda líquida tributável. Essa é a hora de pensar em otimização tributária. Há vários bons fundos de previdência disponíveis no mercado. Evidentemente, meus favoritos são os da Vitreo, onde estão meus próprios planos e os dos meus filhos. A plataforma de investimentos está com promoção de redução dos mínimos em previdência e com apenas R$ 100 mensais ou um aporte de R$ 1 mil você já consegue contratar. Minha sugestão é dividir entre o Carteira Universa Previdência e o FoF SuperPrevidência.
Rodolfo Amstalden: As expectativas de conflação estão desancoradas
A principal dificuldade epistemológica de se tentar adiantar os próximos passos do mercado financeiro não se limita à já (quase impossível) tarefa de adivinhar o que está por vir
Felipe Miranda: Vale a pena investir em ações no Brasil?
Dado que a renda variável carrega, ao menos a princípio, mais risco do que a renda fixa, para se justificar o investimento em ações, elas precisariam pagar mais nessa comparação
Rodolfo Amstalden: Para um período de transição, até que está durando bastante
Ainda que a maior parte de Wall Street continue sendo pró Trump, há um problema de ordem semântica no “período de transição”: seu falsacionismo não é nada trivial
Tony Volpon: As três surpresas de Donald Trump
Quem estudou seu primeiro governo ou analisou seu discurso de campanha não foi muito eficiente em prever o que ele faria no cargo, em pelo menos três dimensões relevantes
Dinheiro é assunto de mulher? A independência feminina depende disso
O primeiro passo para investir com inteligência é justamente buscar informação. Nesse sentido, é essencial quebrar paradigmas sociais e colocar na cabeça de mulheres de todas as idades, casadas, solteiras, viúvas ou divorciadas, que dinheiro é assunto delas.
Rodolfo Amstalden: Na esperança de marcar o 2º gol antes do 1º
Se você abre os jornais, encontra manchetes diárias sobre os ataques de Donald Trump contra a China e contra a Europa, seja por meio de tarifas ou de afrontas a acordos prévios de cooperação
Rodolfo Amstalden: Um Brasil na mira de Trump
Temos razões para crer que o Governo brasileiro está prestes a receber um recado mais contundente de Donald Trump
Rodolfo Amstalden: Eu gostaria de arriscar um palpite irresponsável
Vai demorar para termos certeza de que o último período de mazelas foi superado; quando soubermos, porém, não restará mais tanto dinheiro bom na mesa
Rodolfo Amstalden: Tenha muito do óbvio, e um pouco do não óbvio
Em um histórico dos últimos cinco anos, estamos simplesmente no patamar mais barato da relação entre preço e valor patrimonial para fundos imobiliários com mandatos de FoFs e Multiestratégias
Felipe Miranda: Isso não é 2015, nem 1808
A economia brasileira cresce acima de seu potencial. Se a procura por camisetas sobe e a oferta não acompanha, o preço das camisetas se eleva ou passamos a importar mais. Não há milagre da multiplicação das camisetas.
Tony Volpon: O paradoxo DeepSeek
Se uma relativamente pequena empresa chinesa pode desafiar as grandes empresas do setor, isso será muito bom para todos – mesmo se isso acabar impactando negativamente a precificação das atuais gigantes do setor
Rodolfo Amstalden: IPCA 2025 — tem gosto de catch up ou de ketchup mais caro?
Se Lula estivesse universalmente preocupado com os gastos fiscais e o descontrole do IPCA desde o início do seu mandato, provavelmente não teria que gastar tanta energia agora com essas crises particulares
Rodolfo Amstalden: Um ano mais fácil (de analisar) à frente
Não restam esperanças domésticas para 2025 – e é justamente essa ausência que o torna um ano bem mais fácil de analisar
Rodolfo Amstalden: Às vésperas da dominância fiscal
Até mesmo os principais especialistas em macro brasileira são incapazes de chegar a um consenso sobre se estamos ou não em dominância fiscal, embora praticamente todos concordem que a política monetária perdeu eficácia, na margem
Rodolfo Amstalden: Precisamos sobre viver o “modo sobrevivência”
Não me parece que o modo sobrevivência seja a melhor postura a se adotar agora, já que ela pode assumir contornos excessivamente conservadores
Rodolfo Amstalden: Banda fiscal no centro do palco é sinal de que o show começou
Sequestrada pela política fiscal, nossa política monetária desenvolveu laços emocionais profundos com seus captores, e acabou por assimilar e reproduzir alguns de seus traços mais viciosos
Felipe Miranda: O Brasil (ainda não) voltou — mas isso vai acontecer
Depois de anos alijados do interesse da comunidade internacional, voltamos a ser destaque na imprensa especializada. Para o lado negativo, claro
Felipe Miranda: Não estamos no México, nem no Dilma 2
Embora algumas analogias de fato possam ser feitas, sobretudo porque a direção guarda alguma semelhança, a comparação parece bastante imprecisa
Rodolfo Amstalden: Brasil com grau de investimento: falta apenas um passo, mas não qualquer passo
A Moody’s deixa bem claro qual é o passo que precisamos satisfazer para o Brasil retomar o grau de investimento: responsabilidade fiscal
Tony Volpon: O improvável milagre do pouso suave americano
Powell vendeu ao mercado um belo sonho de um pouso suave perfeito. Temos que estar cientes que é isso que os mercados hoje precificam, sem muito espaço para errar.