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Victor Aguiar
Victor Aguiar
Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero e com MBA em Informações Econômico-Financeiras e Mercado de Capitais pelo Instituto Educacional BM&FBovespa. Trabalhou nas principais redações de economia do país, como Bloomberg, Agência Estado/Broadcast e Valor Econômico. Em 2020, foi eleito pela Jornalistas & Cia como um dos 10 profissionais de imprensa mais admirados no segmento de economia, negócios e finanças.
Parada estratégica

A cautela pesou e o Ibovespa precisou fazer um pit stop — mas o índice segue acima dos 100 mil pontos

Após quatro altas consecutivas, o Ibovespa e o dólar cederam a um movimento de realização de lucros. Incertezas no front da reforma da Previdência e o exterior negativo pesaram sobre as negociações

Victor Aguiar
Victor Aguiar
25 de junho de 2019
10:34 - atualizado às 14:34
Carro da Ferrari faz um pit stop
O Ibovespa fez um pit stop e fechou em queda de quase 2% nesta terça-feira (25) - Imagem: Shutterstock

Eu sou um fã de Fórmula 1 — comecei a acompanhar a categoria na década de 90, influenciado pelo meu pai. E, em todos esses anos acordando cedo para assistir as corridas, eu já vi muitas provas serem decididas por problemas técnicos num carro que está na liderança.

Eu não falo só sobre os casos em que o piloto que está em primeiro lugar é traído por uma falha no equipamento e forçado a abandonar a corrida. Hoje, me refiro especificamente às ocasiões em que, por causa de uma problema qualquer no carro, a equipe pede ao líder que tire o pé do acelerador, com medo de uma pane mais grave no futuro.

Isso aconteceu recentemente, no último GP do Bahrein. Charles Leclerc, da Ferrari, caminhava para sua primeira vitória na categoria quando viu seu carro perder rendimento misteriosamente — e recebeu ordens para aliviar, terminando em terceiro lugar. Afinal, era melhor chegar ao fim da corrida, ainda que não no topo do pódio, a quebrar e ficar sem nada.

Os mercados brasileiros passaram por uma situação semelhante à de Leclerc: o Ibovespa vinha voando e renovou as máximas históricas. Mas, numa terça-feira (25) recheada de incertezas, tanto no front local quanto no externo, os agentes financeiros preferiram ir com calma e assumiram um tom de cautela.

Como resultado, o principal índice da bolsa brasileira fechou o pregão de hoje em forte queda de 1,93%, aos 100.092,95 pontos, após chegar a cair aos 99.890,22 pontos no pior momento do dia (-2,13%). O dólar à vista também foi afetado, terminando em alta de 0,65%, a R$ 3,8520 — na máxima, foi aos R$ 3,8589 (+0,83%).

Assim, apesar de toda essa precaução, o Ibovespa ainda conseguiu se sustentar acima dos 100 mil pontos — uma espécie de voto de confiança do mercado em relação ao futuro, apesar das incertezas que se desenharam hoje.

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Parada nos boxes

No âmbito doméstico, os agentes financeiros começaram o dia de olho nas discussões a respeito da reforma da Previdência pela comissão especial da Câmara. Os deputados iniciaram hoje a fase de discursos a respeito da proposta, e há a expectativa de que essa etapa seja concluída até quarta-feira (26).

No cenário dos sonhos para o mercado, o relator do texto, deputado Samuel Moreira, poderá apresentar a versão final de seu parecer nos próximos dias, abrindo espaço para que a reforma seja votada na comissão especial até o fim desta semana — depois, a proposta segue para apreciação no plenário da Câmara.

No entanto, sinais emitidos pelos líderes de diversos partidos na Casa dão a entender que esse quadro pode não ser concretizado. As lideranças defendem que a comissão vote a proposta apenas na próxima segunda-feira (1º) — os partidos ainda pressionam por mudanças na matéria, em pontos como a regra da fórmula de cálculo.

As declarações não tiram o otimismo dos mercados em relação à aprovação da reforma, mas fizeram os agentes financeiros optarem por promover um pit stop estratégico para o Ibovespa nesta terça-feira.  "Tudo depende da Previdência, ela ainda é a linha mestra para os mercados", diz Ari Santos, gerente da mesa de operações da H. Commcor.

E, em meio a esse pano de fundo, uma segunda notícia no front político trouxe mais cautela aos mercados locais: o julgamento, pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), de dois processos que podem colocar o ex-presidente Lula em liberdade — a sessão que decide o futuro do petista ainda está em andamento.

Um operador pondera que, a priori, a eventual soltura de Lula não traria maiores turbulências à tramitação da reforma da Previdência. No entanto, ele acredita que a concessão de liberdade ao ex-presidente enfraqueceria o ministro da Justiça, Sergio Moro — o que poderia trazer instabilidade ao cenário político.

"Essa notícia pegou o mercado com muita gordura", diz o operador, lembrando que o Ibovespa vem de uma sequência de quatro altas consecutivas, saltando dos 97 mil pontos na segunda-feira da semana passada (17) para o nível inédito dos 102 mil pontos no pregão de ontem (24). "Não tem jeito, o pessoal realiza os lucros".

Óleo na pista

Lá fora, os mercados seguiram mostrando uma postura cautelosa no front da guerra comercial, divididos entre o otimismo com a retomada dos diálogos entre Estados Unidos e China e a incerteza em relação ao possível desfecho de tais conversas. O presidente americano, Donald Trump, e chinês, Xi Jinping, irão se encontrar durante a cúpula do G-20, ao fim desta semana.

Autoridades da China e dos Estados Unidos concordaram em manter comunicações sobre questões econômicas e de comércio, antes de uma reunião planejada entre os dois líderes dos países — o Ministério de Comércio do gigante asiático diz esperar que o encontro ajude a gerar confiança e leve à resolução de "questões pendentes".

Mas, em meio a esse pano de fundo, há outros fatores que trouxeram tensão aos mercados globais, com destaque para os atritos entre os governos americano e iraniano. Mais cedo, Trump usou o Twitter para fazer novas ameaças ao Irã — na semana passada, o exército de Teerã derrubou um drone dos Estados Unidos.

Segundo Trump, novos ataques promovidos pelo Irã serão respondidos com "força esmagadora". "Em alguns casos, 'esmagador' significa eliminação", escreveu o presidente americano.

E um terceiro ponto de desconforto aos mercados foi deflagrado no meio da tarde. Jerome Powell, presidente do Fed — o banco central dos Estados Unidos — disse que a condução da política monetária não deve ficar sujeita a interesses políticos de curto prazo.

A declaração pode ser entendida como uma alfinetada a Trump, que tem exercido pressão sobre a instituição e defendido abertamente que o Fed promova cortes de juros para estimular a economia americana. E uma segunda fala, desta vez de James Bullard, presidente do Fed de St. Louis, trouxe ainda mais cautela às negociações.

Bullard — considerado um dos membros mais inclinados ao corte de juros dentro do BC americano — disse que seria um "exagero" a instituição promover um ajuste negativo de 50 pontos-base na taxa básica de juros já na reunião marcada para 30 e 31 de julho. As falas dos dois dirigentes atuaram em conjunto para esfriar os ânimos do mercado em relação à política monetária dos EUA.

Considerando essa combinação de fatores, as bolsas americanas também tiveram um dia de perdas: o Dow Jones caiu 0,67%, o S&P 500 recuou 0,95% e o Nasdaq teve perda de 1,51%, cedendo a um movimento de realização de lucros — e trazendo mais pressão ao Ibovespa.

Dólar acelera

O mercado de câmbio também refletiu esse cenário global de incertezas. O dólar ganhou terreno ante as moedas fortes e se fortaleceu na comparação com as divisas emergentes ao longo da tarde.

Dentro desse segundo grupo, o dólar subiu na comparação com o peso mexicano, o rublo russo, o peso colombiano e o peso chileno — no início do dia, a moeda americana recuava ante as emergentes.

No Brasil, o dólar à vista iniciou o dia perto da estabilidade, mas foi ganhando força ao longo da sessão. Paulo Nepomuceno, estrategista da Coinvalores, destaca que, após a forte onda de alívio recente — a moeda americana estava acima de R$ 4,00 ao final de maio — as incertezas locais e externas aumentaram a demanda por dólares.

"O mercado acredita que a Previdência vai passar, mas ainda não é possível quantificar o tamanho exato, e isso traz alguma incerteza", diz ele. E nem mesmo a atuação do Banco Central (BC) foi capaz de conter a alta da moeda americana nesta terça-feira.

A autoridade colocou US$ 1 bilhão em dinheiro novo no mercado via leilão de linha de dólar com compromisso de recompra. Segundo o BC, a operação buscou sanar “disfuncionalidade” do mercado que opera com menor liquidez.

Aerodinâmica da curva de juros

Os mercados também promoveram ajustes de alta nos DIs, reagindo ao tom da ata da última reunião do Copom, que reiterou a importância das reformas — e não da Selic — para a retomada da economia. O tom do documento dá a entender que a taxa básica de juros deve permanecer em 6,5% por um período prolongado.

"O BC colocou água na fervura", comenta Nepomuceno. "Para baixar os juros, é necessário ter muita convicção num melhora na situação fiscal, e isso só vai ser dado com a aprovação de uma boa reforma da Previdência".

Por outro lado, a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) avançou apenas 0,06% em junho, o menor nível para o mês desde 2006 — a inflação sob controle tende a abrir espaços para cortes na Selic, de modo a estimular a atividade no país.

Com esses dois fatores em mente, as curvas de juros para janeiro de 2020 fecharam em alta de 5,95% para 6,00%, e as para janeiro de 2021 avançaram de 5,86% para 5,96%. Na ponta longa, os DIs com vencimento em janeiro e 2023 foram de 6,69% para 6,78%, e os para janeiro de 2025 subiram de 7,23% para 7,29%.

Blue chips perdem velocidade

As chamadas blue chips — ações de grande liquidez e peso relevante na composição do Ibovespa — fecharam no campo negativo nesta terça-feira e trouxeram pressão ao índice como um todo.

Foi o caso dos papéis do setor de mineração e siderurgia, influenciados pela queda de 1,98% nos preços do minério de ferro no porto chinês de Qingdao — cotação que serve de referência para os mercados. Nesse cenário, Vale ON (VALE3) caiu 1,95%, CSN ON (CSNA3) recuou 2,19%, Gerdau PN (GGBR4) teve baixa de 2,51% e Usiminas PNA (USIM5) desvalorizou 3,09%.

Os ativos da Petrobras também apareceram no vermelho, apesar de o petróleo exibir comportamento relativamente estável hoje. Os papéis PN (PETR4) e ON (PETR3) da estatal tiveram perdas de 2,62% e 3,03%, respectivamente.

Ontem, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) aprovou uma resolução com diretrizes para dar início à abertura do mercado de gás no Brasil — apesar de o monopólio ter sido quebrado em 1997, a Petrobras ainda detém o controle da produção e distribuição do gás no país.

No setor bancário, Itaú Unibanco PN (ITUB4) (-1,25%), Bradesco ON (BBDC3) (-1,71%), Bradesco PN (BBDC4) (-0,84%), Banco do Brasil ON (BBAS3) (-0,92%) e as units do Santander Brasil (SANB11) (-1,59%) também caíram.

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