Projeto de Lei que cria socorro aos Estados propõe mudanças estruturais na Lei de Responsabilidade Fiscal
Governos estaduais terão cinco anos para reenquadrar gastos com a folha ao limite de 60% da Receita Corrente Líquida
O projeto de lei que cria o novo programa de socorro aos Estados propõe mudanças estruturais na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para tentar dar uma solução de ajuste a Estados que no passado maquiaram sua contabilidade de despesas com pessoal.
Os governos estaduais que hoje teriam oito meses para reenquadrar gastos com a folha ao limite de 60% da Receita Corrente Líquida (RCL) passarão a ter cinco anos para esse ajuste, caso a proposta seja aprovada pelo Congresso Nacional.
Nas contas do Tesouro Nacional, 14 Estados descumpriam em 2017 os limites de gastos com pessoal, embora nem todos reconheçam essa situação em suas contas.
"Muitos Estados estão gastando 70% e até mesmo 80% da Receita Corrente Líquida (RCL) com pagamento de pessoal, o que torna impossível um ajuste em dois quadrimestres", diz o Tesouro Nacional.
O excesso verificado hoje precisará ser reduzido a um ritmo de 20% ao ano. "Essa medida será de caráter temporário, um benefício para ajudar nessa fase de transição e de agudo desequilíbrio fiscal", diz o órgão.
O projeto também tem objetivo de deixar claro que cada poder terá que computar na sua despesa com pessoal os gastos com inativos e valores retidos para pagamentos de tributos e quaisquer retenções. "Hoje essa regra não é observada por vários poderes em diferentes Estados", alerta o Tesouro.
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Em alguns casos, os próprios Tribunais de Contas avalizaram interpretações que permitiram a retirada dessas despesas do cômputo do limite. Como antecipou o Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, o Tesouro já vem dialogando com os Tribunais para uniformizar esses entendimentos.
O projeto ainda insere uma proibição à concessão de aumentos salariais parcelados cujo impacto se dê fora do mandato do atual governante. "Essa medida é importante porque, no Brasil, aumento salarial dado por lei é considerado, desde 2015, direito adquirido e, assim, não pode ser revisto por um prefeito, governador ou presidente que herdou do seu antecessor reajustes salariais aprovados", justificou o Tesouro Nacional.
O texto também adequa a LRF à jurisprudência já consolidada de que o descumprimento de limites e obrigações da LRF por um poder ou órgão não deve gerar penalidades para os demais - um princípio constitucional conhecido como "intranscendência das penas", observou o Tesouro.
O projeto ainda muda a LRF para proibir anualmente que titulares de poderes ou órgãos autorizem despesas sem que haja caixa disponível para bancá-las. Hoje, essa exigência só é cobrada nos últimos oito meses de mandato. Agora, a ideia é que todo ano o mandatário precise quitar suas obrigações ou deixar dinheiro suficiente em caixa para pagar em caso de parcelas ficarem para o ano seguinte.
Mesmo com a regra atual, nove governadores da gestão passada deixaram seus Estados sem caixa, como mostrou o Broadcast em fevereiro. Pela proposta, essa mudança só teria validade a partir de 2026 para Estados e Distrito Federal, e a partir de 2024 para municípios.
O governo ainda propôs a revogação de um dispositivo que mantém a vinculação de recursos que estão atrelados a determinada área, mas acabam não sendo gastos. "Com a revogação desse parágrafo, a sobra de recursos vinculados na virada do exercício fiscal passaria a ser fonte livre para outras despesas, acabando com a prática recorrente de desvincular recursos não aplicados via Medida Provisória", afirmou o Tesouro.
2 anos para o teto
O projeto do governo concede também mais dois anos para que os governos estaduais que renegociaram suas dívidas com a União em 2016 cumpram o teto de gastos.
A lei de 2016 concedeu um prazo adicional por 20 anos para os Estados pagarem sua dívida e concedeu descontos até junho de 2018. A única exigência foi que os Estados que assinassem essa renegociação se comprometessem a limitar a despesa primária corrente (despesas com pessoal e custeio) ao IPCA em 2018 e 2019.
Caso os Estados não cumprissem com essa obrigação por dois anos consecutivos, perderiam o benefício do alongamento da dívida e ainda teriam que pagar, em 12 meses, todo o benefício de redução do serviço da divida que tiveram desde 2016.
"O problema é que mais da metade dos 19 que assinaram a renegociação da dívida com a União no âmbito da LC 156, inclusive alguns Estados com nota "B" que estão em uma boa situação fiscal, já alertaram ao Tesouro Nacional que não conseguiram cumprir com a exigência de limite de crescimento da despesa porque a queda da inflação foi maior do que a esperada quando da assinatura da lei. Adicionalmente, o próprio esforço de arrecadação maior por parte de alguns Estados impactou no aumento de despesas constitucionais (saúde e educação) vinculadas à RCL", explicou o Tesouro Nacional.
Para evitar o agravamento da crise dos Estados que seria provocado por eventual exclusão deles da renegociação da dívida de 2016, o governo decidiu propor o aumento do prazo para o cumprimento do teto em mais dois anos. O respeito ao limite de gastos é inclusive um dos pré-requisitos para a adesão ao novo socorro.
Mesmo com esse prazo adicional que será dado aos Estados, a penalidade vai mudar caso algum não consiga cumprir a exigência. Em vez de eles perderem o benefício - o que levaria a uma nova pressão sobre a União por prorrogação -, o governo decidiu propor que sejam cobrados encargos de inadimplência, imputados ao saldo devedor.
"Não há perdão e nem mesmo se está 'premiando' Estados que não cumpriram seus compromissos à custa daqueles que cumpriram com a exigência da Lei Complementar 156/2016 de limitar a despesa primária corrente ao IPCA. O que se faz neste PLC é mudar a penalidade, que deixa de ser a perda do alongamento da divida e passa a ser uma penalidade financeira: encargos contratuais da divida renegociada", diz o Tesouro.
*Com Estadão Conteúdo.
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