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Olivia Bulla
Olivia Bulla
Olívia Bulla é jornalista, formada pela PUC Minas, e especialista em mercado financeiro e Economia, com mais de 10 anos de experiência e longa passagem pela Agência Estado/Broadcast. É mestre em Comunicação pela ECA-USP e tem conhecimento avançado em mandarim (chinês simplificado).
A Bula do Mercado

Mercados em rota de colisão

Poderes Executivo e Legislativo trocam farpas pela imprensa durante o fim de semana e coloca em xeque as chances de votação da reforma da Previdência neste semestre

Olivia Bulla
Olivia Bulla
25 de março de 2019
5:38 - atualizado às 13:46
Bolsonaro está convicto de suas atitudes e sinaliza que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, representa a velha política
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A última semana de março começa com os investidores atentos à política, tanto no Brasil quanto no exterior. Após a instabilidade no mercado doméstico na última sexta-feira, que fez o dólar renovar a maior cotação do ano e derrubou o Ibovespa para o menor nível desde janeiro, a expectativa é de que a articulação pela reforma da Previdência seja retomada. Enquanto isso, nos Estados Unidos, Donald Trump mostra que está acima de Washington.

Mas os atritos entre a Câmara e o governo ainda tendem a deixar os ativos locais vulneráveis ao noticiário nacional nesta reta final do primeiro trimestre. Os investidores tendem a digerir declarações recentes do governo e de políticos, assimilando um risco maior de que a proposta de novas regras para aposentadoria tenha uma tramitação mais demorada que o esperado - e com discussões mais acaloradas.

Durante o fim de semana, o presidente da Casa, Rodrigo Maia, não poupou críticas ao governo, dizendo que é um “deserto de ideias”, e acrescentou que o presidente Jair Bolsonaro precisa sair das redes sociais, ser mais proativo e não “terceirizar” sua responsabilidade pela aprovação da nova Previdência. Para o deputado, ao dizer que é contra a pauta, o presidente criar um ambiente de insegurança no Congresso.

Em resposta, Bolsonaro afirmou que Maia está se comportando de forma “agressiva” e disse que “alguns não querem largar a velha política”, acrescentando que a responsabilidade pela reforma está no Parlamento. O presidente da Câmara disse, então, que o chefe do Executivo precisa dizer “o que é a nova política”, assumindo a articulação. E ao que tudo indica, caberá ao líder na Casa, o Major Vitor Hugo, essa árdua tarefa.

Após os poderes trocarem farpas pela imprensa, o presidente Bolsonaro recebeu por duas vezes - no sábado à noite e no domingo pela manhã - o líder do governo na Câmara, que afirmou que o clima em Brasília “vai arrefecer”. Porém, ele fez pouco para suavizar o ambiente. Ao contrário, o Major Vitor Hugo indicou que Bolsonaro não negociará e fez críticas à velha política, acirrando a tensão entre os poderes.

Segundo o líder do governo, as práticas do passado não nos levaram ao caminho em que se quer estar. E o PSL é “agente” para mudar essa situação. Portanto, o presidente está “convicto de suas atitudes” e tentará aprovar a reforma da Previdência se valendo do apoio popular - principalmente nas redes sociais, entrando em rota de colisão com o Congresso. Ou seja, nesse caso, Maia representa a velha política.

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Nesta manhã (8h30), o presidente irá se reunir com a equipe econômica e o núcleo político para tratar da reforma da Previdência. Talvez seja necessário mais que isso para convencer o mercado financeiro de que Bolsonaro irá, enfim, assumir não só a Previdência, mas também a Presidência. Há mais de 80 dias no cargo, o presidente parece ainda estar em clima de campanha e não mostra ter entendido que a grande maioria dos seus eleitores em outubro - quiçá, dois terços - escolheram o candidato por oposição ao PT.

Afinal, deixar a bola sozinha apenas no campo do Congresso, tentando aprovar a Previdência na marra, sem empenho para conquistar os 308 votos necessários para aprovar as novas regras para aposentadoria, em dois turnos, não vai sustentar o apoio popular ao seu governo, levando Bolsonaro (e seus filhos) a crises crescentes e sequenciais. Nesse caso, o presidente nem precisa se preocupar tanto com Maia, que segue a favor da reforma da Previdência e que irá “blindá-la”, deixando-a “acima do governo”.

Assim, será importante acompanhar os passos a serem dados pelo governo nesta semana no Congresso. Além de conversar com parlamentares e líderes de partidos, o secretário da Previdência, Rogério Marinho, deve manter o diálogo com as bancadas. Já o ministro da Economia, Paulo Guedes, será ouvido em audiência pública conjunta das comissões de Assuntos Econômicos (CAE) e de Direitos Humanos (CDH), na quarta-feira.

Um dia antes, na terça-feira, Guedes deve ser recebido pela CCJ para explicar sobre as propostas da reforma da Previdência geral e dos militares. O próprio líder do partido do presidente na Câmara, o deputado Delegado Waldir, do PSL, avalia que Guedes precisa explicar a proposta de reestruturação da carreira dos não civis, que impacta na economia gerada pela reforma dos militares, gerando um saldo de R$ 10 bilhões em dez anos.

Não é, portanto, apenas a oposição que vem apresentado uma série de requerimentos para a convocação do ministro. A presença de Guedes na CCJ é considerada atípica, uma vez que a comissão não analisa o mérito da proposta, apenas sua admissibilidade. Para o Delegado Waldir, o chefe da equipe econômica ter que ir até a Câmara e dizer o que foi feito com o texto dos militares, que, segundo ele, pode dificultar a escolha do relator da proposta.

Agenda carregada no Brasil

Esses eventos políticos são alguns dos destaques previstos para esta semana no Brasil, que também reserva uma série de indicadores e eventos econômicos de relevo. Amanhã, as atenções se dividem entre a prévia deste mês da inflação oficial ao consumidor brasileiro (IPCA-15) e a ata da primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) sob o comando do novo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

Mas os holofotes estarão sobre ele na quinta-feira, quando o BC divulga o Relatório de Inflação referente ao primeiro trimestre deste ano, juntamente com uma entrevista coletiva do comandante da autoridade monetária. De posse desses dois documentos, que já podem trazer as digitais do novo BC, os investidores irão se atentar, então, à fala de Campos Neto, em busca de sinalizações sobre o rumo da taxa básica de juros neste ano.

Já nesta segunda-feira, a pesquisa Focus (8h25) pode trazer revisões do mercado financeiro para o comportamento da Selic, do crescimento econômico, da inflação e do dólar. Ainda na quinta-feira, destaque para o IGP-M de março. No dia seguinte, sai a taxa de desemprego no Brasil, nos dados atualizados até fevereiro. Na safra de balanços, destaque para o resultado trimestral da Vale, na quarta-feira à noite.

Exterior pesado

No exterior, novas evidências sobre a desaceleração da economia global acenderam o sinal de alerta no mercado financeiro, que já vinha preocupado com a ausência de acordo comercial entre Estados Unidos e China e sobre a saída do Reino Unido da União Europeia (UE). Mas lá fora, além da pauta econômica, a questão política envolvendo o líder da Casa Branca também traz preocupações.

O relatório do procurador-geral William Barr, resumindo as principais conclusões do ex-diretor do FBI Robert Mueller, foi entregue ontem ao Congresso dos EUA e mostra que não houve conluio com a Rússia durante a campanha presidencial de Trump em 2016. Segundo Barr, não há provas suficientes para acusar o presidente de obstrução da Justiça e a investigação só revela que Trump contrato funcionários corruptos.

O documento de Mueller encerra a investigação sobre a suposta interferência russa na campanha presidencial há dois anos. Trata-se de uma nuvem que paira sobre o republicano desde o início do mandato e que poderia complicar os planos dele de reeleição. Ciente disso, Trump comemorou a notícia no domingo à noite no Twitter, dizendo que o inquérito sobre a interferência da Rússia foi “ilegal e falhou”.

Apesar das comemorações, os mercados internacionais seguem no vermelho nesta manhã. As praças asiáticas ainda refletiram o tombo em Wall Street na sexta-feira passada e encerraram a sessão com fortes perdas. Tóquio liderou a queda, com -3,%, ao passo que Xangai e Hong Kong perderam 2%, cada. Na Europa, as principais bolsas também amanheceram em queda, penalizadas pelo recuo dos índices futuros em Nova York.

O temor com a economia global segue como pano de fundo, com os investidores começando a questionar o poder de reação dos bancos centrais e a capacidade das ferramentas monetárias disponíveis para estimular o crescimento econômico, normalizando as condições. Com isso, o rendimento (yield) do título norte-americano de 10 anos (T-note) está em 2,45%, abaixo do juro projeto pelos bônus mais curtos, de até três meses.

O yield do papel australiano de 10 anos caiu ao menor nível da história, enquanto o japonês JGB está no rendimento mais baixo desde setembro de 2016. Esse movimento no mercado de bônus impacta as moedas, respingando também no comportamento das commodities. O dólar mede forças em relação às moedas de países desenvolvidos e emergentes, encurtando o fôlego do petróleo, com o barril do tipo WTI abaixo de US$ 59.

Pode-se dizer que, de alguma maneira, o mercado financeiro foi complacente com os sinais de perda de tração da atividade entre as principais nações, relegando os impactos na disputa entre as duas maiores economias do mundo. Com isso, cabe agora um ajuste, uma vez que o crescimento menor - quiçá uma recessão - impacta nos preços dos ativos.

Agenda pesada lá fora

A agenda econômica do exterior também está carregada nesta semana. O destaque fica para o desembarque de uma delegação norte-americana, capitaneada pelo secretário do Tesouro, Steven Mnuchin, e do representante do comércio, Robert Lighthizer, em Pequim, onde têm encontros na quinta e sexta-feira.

Os dois lados estão em um estágio crítico na discussão sobre as questões mais difíceis, como a propriedade intelectual. Por um lado, a demora na elaboração de um acordo final mostra que Trump e o presidente chinês, Xi Jinping, estão dispostos a reunir-se apenas quando houver uma proposta definitiva. Mas o desgaste já minou a confiança mútua.

Outro foco de tensão no exterior vem do Reino Unido. Após a primeira-ministra britânica, Theresa May, conseguir uma prorrogação do prazo para o Brexit, ela precisa, agora, ganhar apoio do Parlamento para que a saída da ilha do bloco comum europeia não aconteça nesta semana. A tarefa pode ser difícil, já que ela sofreu derrotas recentes, mas a chance de extensão é grande.

Entre os indicadores econômicos, os destaques nos EUA ficam com os dados da balança comercial norte-americana em janeiro. Os números, a serem conhecidos na quarta-feira, podem esquentar as discussões do país com a China. No dia seguinte, sai a última leitura do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA ao final do ano passado.

Na sexta-feira, é a vez dos dados sobre a renda pessoal e dos gastos com consumo nos EUA. Hoje, a agenda econômica está mais fraca. Amanhã, é a vez da confiança do consumidor norte-americano. No eixo Ásia-Europa, merecem atenção dados de atividade e inflação no Japão, além do sentimento para os negócios na zona do euro.

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