Previdência e guerra comercial mantêm tensão no mercado
Investidor tem de se acostumar com prolongada guerra comercial e capacidade do governo Bolsonaro de criar problemas para si
O mercado financeiro inicia a semana sem saber qual proposta para a reforma da Previdência será levada adiante pelo Congresso nem se haverá um acordo comercial entre Estados Unidos e China. Os dois assuntos continuam, então, ditando o rumo dos ativos de risco e a falta de clareza sobre esses temas tende a manter os investidores na defensiva.
O fim de semana foi de muito vaivém em Brasília sobre um texto alternativo ao do governo para a mudança de regras da aposentadoria, que seria pautado pelo Centrão. De início, falava-se que o presidente Jair Bolsonaro apoiaria a proposta elaborada pelos parlamentares, dando aval ao líder do governo na Câmara para encampar o novo projeto.
Depois, porém, o major Vitor Hugo, avisou ao relator da reforma da Previdência na comissão especial, Samuel Moreira, que não haverá uma nova proposta. O mais provável é que os pontos de mudanças sugeridos pelos deputados não tenham agradado à equipe econômica, desidratando demais o texto e reduzindo a potência da economia fiscal.
Sem um consenso entre Executivo e Legislativo, a tendência é de que a discussão sobre a nova Previdência seja ainda mais demorada, mantendo a pressão nos negócios locais, que apostou alto na aprovação de uma reforma potente ainda neste ano. Com isso, os investidores devem seguir abrigados no dólar e afastados do risco na Bovespa, ao mesmo tempo em que recompõem prêmios na estrutura a termo da curva de juros futuros.
Ao menos, agora, o Banco Central resolveu agir. Um dia após a moeda norte-americana confirmar o rompimento da barreira psicológica de R$ 4,00 e encostar-se à faixa de R$ 4,10, a autoridade monetária informou que realizará de hoje até quarta-feira três leilões de linha (venda de dólar com compromisso de recompra), no total de US$ 3,75 bilhões.
Ameaça de caos
Os investidores estão assustados com a falta de habilidade do governo Bolsonaro em enfrentar as recentes crises políticas e com o tom de campanha do presidente, que prefere partir para o confronto, ao invés de optar pela governabilidade e negociar consensos provisórios. A ausência de diálogo entre os dois poderes é cada vez mais evidente.
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Isso tem levado uma ala mais radical de apoio ao presidente a defender a dissolução do Congresso. Um texto compartilhado por Bolsonaro nas redes sociais teria exacerbado os ânimos entre os apoiadores e aumentado a tensão entre a classe política. Na mensagem, o presidente afirma que “o Brasil, fora de conchavos, é ingovernável”, atribuindo os riscos de desgoverno por causa da corrupção generalizada em Brasília, desqualificando o Legislativo.
Muitos, portanto, leram o texto distribuído por Bolsonaro como um aceno à radicalização, para que o presidente assuma o protagonismo na cena política, colocando todas as cartas na ameaça do caos. Essa intenção explica porque o governo não quer que a reforma da Previdência tenha o carimbo do Congresso, levando os louros pela aprovação da matéria.
Mais que isso, a mensagem do presidente foi entendida como uma convocatória para um ato pró-governo previsto para domingo, de modo a medir forças com a oposição nas ruas, após a paralisação nacional contra cortes na educação. “Somente com o apoio de todos vocês poderemos mudar de vez o futuro do nosso Brasil!”, disse Bolsonaro, na rede social.
Com isso, não se sabe as chances reais de votar a reforma da Previdência no plenário da Câmara antes do recesso parlamentar, em julho. Por mais que se diga que há uma boa vontade dos parlamentares em aprová-la, os efeitos da falta de diálogo com o Congresso ainda são desconhecidos. Na prática, nada anda, ainda mais sem o aval do Centrão.
O estilo “franco” de Bolsonaro aumenta a insegurança e o teste de fogo virá da MP da reforma ministerial, que precisa ser aprovada até o início de junho. O Centrão só concorda em diminuir o número de ministérios se o Coaf - o conselho que apontou movimentação atípica na conta do ex-assessor Fabrício Queiroz - ficar fora da alçada do ministro da Justiça, Sérgio Moro.
Guerra prolongada
Já no exterior, o mercado internacional está se acostumando, aos poucos, com a ideia de que a guerra comercial entre EUA e China será longa. Pequim parece cada vez menos interessado em retomar as negociações com Washington, sinalizando que um acordo ficará suspenso até o encontro dos líderes Donald Trump e Xi Jinping no Japão, durante o G-20.
Trump, porém, se diz “muito feliz” com a guerra comercial e afirmou que a economia chinesa não irá superar a norte-americana, tornando-se uma superpotência do mundo, enquanto ele estiver no comando. “A China obviamente não está indo tão bem como nós”, disse, em entrevista à Fox News, indicando que também não está com pressa de voltar a negociar com Pequim.
Em reação, as bolsas chinesas fecharam em queda nesta segunda-feira, na contramão do sinal positivo que prevaleceu na Ásia. Xangai caiu 0,4% e Hong Kong teve queda de 0,6%, refletindo à decisão do Google de revogar a licença da Huawei para uso do sistema operacional Android. A decisão ocorreu após o governo Trump incluir a fabricante na “lista negra”.
Tóquio, por sua vez, subiu 0,2%, após o inesperado crescimento de 2,1% da economia japonesa nos três primeiros meses deste ano, ofuscando as incertezas sobre a economia global. No Ocidente, os índices futuros das bolsas de Nova York estão em alta, mas as principais praças europeias iniciaram a sessão sem rumo definido.
Entre as moedas, destaque para o dólar australiano, que avança após a vitória surpreendente do conservador Scott Morrison, que foi reeleito como primeiro-ministro. Na Índia, os ativos também subiram, diante dos sinais de que o primeiro-ministro Narendra Modi deve seguir no poder. Nas commodities, o petróleo avança com a oferta limitada.
Agenda fraca traz poucos destaques
A agenda doméstica desta semana traz como destaque dados sobre a confiança de diferentes agentes econômicos, a partir de amanhã, e a prévia da inflação oficial ao consumidor brasileiro (IPCA-15), na sexta-feira. Ao longo da semana, são esperados os números de abril sobre o emprego formal (caged) e a arrecadação federal.
Hoje, saem a segundo prévia de maio do IGP-M (8h) e o relatório de mercado Focus do Banco Central (8h25). A pesquisa junto ao mercado financeiro pode trazer novas revisões de 2019 na estimativa de crescimento da economia (PIB) e sobre o rumo da taxa de juros (Selic), para baixo; e para cima, na previsão do dólar e para a inflação (IPCA).
À noite, merece atenção o discurso do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell. Aliás, o Fed concentra as atenções do exterior nesta semana, tendo como auge a divulgação da ata da reunião de maio, quando não corroborou as expectativas de que o próximo movimento na taxa de juros norte-americana seria de corte.
O documento será publicado na quarta-feira. Um dia antes, saem dados do setor imobiliário norte-americano. Um dia depois, destaque para dados preliminares sobre a atividade nos setores industrial e de serviços nos EUA e na zona do euro, que podem mostrar em maio a continuidade do enfraquecimento da economia observado em abril.
Na União Europeia como um todo, destaque para a eleição do Parlamento europeu, na quinta-feira, da qual o Reino Unido fará parte, apesar da tentativa de separação do bloco comum. Aliás, o prazo final do Brexit está se aproximando e parece que a primeira-ministra britânica, Theresa May, vai sair primeiro. Na China, o calendário da semana está esvaziado.
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