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Viviane Taguchi
O QUE ESPERAR DA PRÓXIMA SAFRA?

Agro deve ter ano positivo em 2019, mas com preços e margens menores

Se o clima não estragar, Brasil deve colher nova safra recorde de soja. Mas os preços estão mais baixos

Viviane Taguchi
2 de dezembro de 2018
8:04 - atualizado às 8:34
Agronegócio
Plantação de soja no Brasil - Imagem: Shutterstock

Se tem um setor capaz de driblar as tempestades na economia e superar a crise é o agronegócio – o que não significa dizer que não enfrente problemas. Pelo contrário, o custo para encarar gargalos, como infraestrutura precária para a logística da produção, é alto e aperta as margens em toda a cadeia produtiva. Ainda assim, o agro mantém a balança comercial positiva e é um importante peso no Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil – em 2017, a produção agropecuária representou 23,5% de toda a riqueza gerada pelo país.

Em 2019 não deve ser muito diferente. Seu Dinheiro conversou com especialistas na área para saber o que está em jogo para o agro no próximo ano, com um governo novo, eleito inclusive com forte apoio dos agropecuaristas.

Apesar de uma margem mais apertada para os produtores, é consenso que a participação do agro no PIB nacional continuará alta, porque o volume produzido de grãos tende a atingir novo recorde, se o clima não atrapalhar os planos do setor. De 2018 para 2019, o aumento esperado na colheita nacional de grãos é de 11 milhões de toneladas, totalizando 238,2 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Esse forte aumento deve compensar a tendência de queda nos preços médios.

No ano passado, enquanto a indústria caminhou de lado e o setor de serviços registrou crescimento de 0,3% em 12 meses, o PIB agropecuário fechou com alta de dois dígitos, 13%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE). O desempenho positivo do campo contribuiu com o aumento de 1% do PIB brasileiro.

O saldo da balança comercial do setor produtivo também ficou acima dos demais segmentos da economia. Enquanto o agro fechou o ano com superávit de US$ 81,8 bilhões, os outros setores fecharam com saldo de US$ 14,8 bilhões.
Carro-chefe
Para clarear o cenário, diante da dimensão e diversidade do setor – o Brasil é o maior exportador mundial de café, soja, suco de laranja, carne de frango entre outros produtos - decidimos olhar para a principal commodity agrícola produzida e exportada pelo país: a soja. O grão, que ultrapassou o minério na pauta de exportação nacional há alguns anos, deve ganhar mais terreno e produção nesta temporada.

“Estamos com uma área plantada maior no verão (principal safra do ano) e no clima, tudo indica a formação de um El Niño de intensidade fraca, ou seja, sem nenhuma anomalia significativa. E ainda boa tecnologia (semente, adubo etc). Aparentemente, os problemas são isolados”, destaca Flávio França Jr., analista de mercado e chefe do departamento de grãos da Datagro.

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A Conab prevê que a produção brasileira de soja na temporada que está começando – o plantio está na reta final nos principais Estados produtores -- alcance 119 milhões de toneladas. Se confirmado, o volume colhido do grão representará metade do total produzido pelo país.

EUA versus China

A grande interrogação do mercado agrícola brasileiro e mundial e está sobre o conflito de comércio entre Estados Unidos e China. Com as tarifas impostas pelo governo de Donald Trump aos produtos chineses desde o início de julho, as cotações da soja na Bolsa de Chicago (onde se formam os preços do grão e outros) despencaram para o menor patamar em 10 anos. Assim como no Brasil, o produto é a principal commodity agrícola exportada pelos norte-americanos, e a China sua principal compradora.

O setor tinha grande expectativa que um acordo ou ao menos um indicativo nesse sentido saísse da do encontro de Trump e com o líder chinês Xi Jinping na reunião do G-20, encerrada neste sábado na Argentina. Trump concordou em suspender a cobrança de tarifas maiores da China por 3 meses, mas o desfecho da disputa ainda é incerto.

“O próprio produtor americano de soja não está botando muita fé num desfecho positivo e hoje já se fala em uma queda de 2,5 milhões de hectares em área plantada de soja nos Estados Unidos, que devem ser migrados para outras culturas, como milho, trigo, algodão e até cevada”, diz Aedson Pereira, analista de mercado da Informa Economics FNP, consultoria americana especializada no segmento.

Se essa briga não for resolvida e o Brasil produzir mais uma grande safra, o resultado será uma situação de aperto para indústria nacional de soja, que precisará disputar o grão com o mercado internacional, diz Pereira. “Se não resolver, a China concentra as aquisições dela no Brasil e sobrariam cerca de 40 milhões de toneladas para esmagar, contra uma necessidade de quase 44 milhões de toneladas”, diz.

O maior problema, contudo, são os preços do grão. Como o mercado de referência da soja são os Estados Unidos e o país está com estoques elevadíssimos, a tendência é de maior queda nas cotações da soja. “No Brasil, o dólar é que deve amenizar os impactos negativos, mas não sabemos até que ponto as medidas do novo governo vão manter o dólar nessa banda mais confortável (alto) para o produtor rural”, afirma o analista. “Do ponto de vista macro, essa guerra comercial não é boa para ninguém. Não é boa para o comércio internacional de forma geral”, ressalta Jr., da Datagro.

Com esse cenário indefinido e um aumento nos custos do setor, as margens do setor devem ficar mais apertadas no próximo ano, embora ainda positivas. As projeções da Informa apontam para uma rentabilidade de 20% a 25% na próxima safra de soja, contra uma média nacional de 40% na safra passada. Para Mato Grosso, Estado que tem as margens mais apertadas devido à logística, a Datagro prevê um lucro bruto de R$ 6 por saca (60 kg) de soja, o que significa média de R$ 350 por hectare, considerando uma produtividade média de quase 58 sacas por hectare.

Doze anos de crescimento

Neste ano, a soja completa sua 12ª safra de crescimento consecutivo em área no Brasil. Dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) mostram que o terreno ocupado pelo grão saltou mais de 70% em 12 safras, passando de 20,6 milhões de hectares plantados em 2006 para 35,7 milhões de hectares em 2018 – para se ter uma ideia, cada hectare corresponde ao tamanho de um campo de futebol: 10 mil metros quadrados.

Com um aumento da produtividade média das lavouras superior ao da área, a produção brasileira de soja, por sua vez, mais que dobrou no mesmo intervalo de tempo – saiu de 58,3 milhões de toneladas para cerca de 120 milhões de toneladas previstas para o próximo ano – a colheita da principal safra nacional ocorre sempre no primeiro quadrimestre. “São 12 anos de crescimento regular da produção, produtividade e de renda positiva”, afirma Jr.

A capitalização do setor, lembra, ocorre por uma combinação de fatores, que inclui clima favorável à produção, investimentos em tecnologias por parte dos produtores rurais e preço – a formação do preço de grãos como soja, milho, algodão e trigo se dá na Bolsa de Chicago (CBOT), nos Estados Unidos. Os custos do setor, porém, crescem e apertam cada vez mais as margens. Boa parte deles é dolarizada, porque o Brasil depende do mercado externo para se abastecer, principalmente de fertilizantes e químicos.

Com oferta de sobra e consumo (interno e externo) em alta, impulsionado por consumo de carnes e a China, o Brasil se tornou uma potência na soja. É o segundo maior produtor, atrás dos Estados Unidos (130 milhões de toneladas), e o maior fornecedor mundial do grão. Em 2018, o país deve embarcar para o exterior 76 milhões de toneladas, conforme as projeções oficiais.

Nas mãos de Bolsonaro

Jair Bolsonaro - Imagem: Shutterstock

Ao mesmo tempo em que busca recordes de produção o agronegócio brasileiro espera algumas contrapartidas do novo governo. A principal delas diz respeito ao tabelamento do frete rodoviário, adotado pelo governo de Michel Temer para acabar com a greve de caminhoneiros, que parou o país em maio deste ano. A medida atendeu a categoria de transportes, mas onerou significativamente o setor produtivo. A comercialização da safra está totalmente travada no Brasil desde então e a expectativa do setor é de que o governo de Bolsonaro resolva isso nos primeiros dias de mandato.

De acordo com a Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o frete para transportar grãos entre Sorriso (MT) e o Porto de Santos (SP) subiu 51%, com base nos valores da tabela divulgada pelo governo em maio. A entidade protocolou no Supremo Tribunal Federal (STF) uma medida cautelar para suspender a tabela de preços e a resolução da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que fixa multas de até R$ 10 mil por descumprimento da tabela. “Transportar soja no Brasil ficou mais caro que transportar dinamite. No caso do milho, o preço atual do produto é mais baixo que o do frete, isso é inadmissível”, afirma Luiz Antônio Fayet, consultor de logística da CNA.

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